Brasília: A invenção da Superquadra
Foto: Paulo Carvalho/Agência Brasília

Brasília: A invenção da Superquadra

"A invenção da Superquadra" é um livro sobre Brasília que explica e discute o conceito das superquadras, parte essencial do plano urbanístico de Lucio Costa. A obra discorre sobre a complexidade, as intenções e as controvérsias do projeto original.

11 de março de 2024

“A invenção da Superquadra” é um dos livros mais abrangentes sobre a cidade de Brasília. Ele oferece uma compreensão profunda dos principais conceitos de design espacial que resultaram no plano da cidade, com foco na chamada Superquadra. A primeira edição do livro foi publicada em 2009, e uma segunda edição foi lançada em 2020, ambas pelo IPHAN, o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional no Brasil.

O conteúdo do livro é resultado de um projeto de pesquisa iniciado em 1999 por Marcílio Mendes Ferreira e Matheus Gorovitz, renomados professores da Universidade de Brasília.

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Brasília e o Conceito da Superquadra

Brasília é a capital planejada do Brasil, inaugurada em 1960. Lucio Costa foi responsável pelo seu projeto urbanístico, enquanto Oscar Niemeyer projetou os edifícios mais importantes. A cidade representa firmemente os conceitos da arquitetura e do urbanismo modernistas, o que levou à sua inscrição como Patrimônio Mundial pela Unesco.

Prédio residencial em Brasília. Foto: Gabriel Fernandes/Flickr

Embora a ocupação tenha se expandido ao longo dos anos, o Plano Piloto, centro da cidade, ainda é onde a maioria dos empregos e atividades estão localizados. É também onde os esforços de planejamento e a ideia utópica foram concentrados inicialmente, como mencionado no livro. O Plano Piloto é um esquema de duas asas chamadas Asa Sul e Asa Norte. Um eixo central foi colocado entre elas, onde foram construídos os monumentos e os prédios empresariais. As asas, no entanto, deveriam ter uma escala diferente com uma atmosfera mais intimista. Essa intenção foi a base para o desenvolvimento da ideia da Superquadra, conforme explicam Marcílio Mendes Ferreira e Matheus Gorovitz.

Lucio Costa tentou recriar a ideia das unidades de vizinhança (UVs), inserindo-as no plano como módulos da grelha urbana na área residencial. Cada UV tinha como objetivo fornecer serviços básicos para a vida cotidiana, que os moradores deveriam poder acessar andando curtas distâncias. A fim de garantir a qualidade dessa mobilidade, foram distribuídas calçadas arborizadas para conectar as casas e os apartamentos às lojas, escolas, supermercados, igrejas, áreas verdes, etc.

Superquadra 107 Sul. Foto: Renato Araújo/Agência Brasília

A infraestrutura automobilística foi projetada hierarquicamente para que a distribuição das pessoas em trânsito culminasse nas áreas mais privadas. Quatro quadras residenciais foram distribuídas perto da área comercial principal de cada UV. Essas quadras foram denominadas superquadras. Cada superquadra possui cerca de dez edifícios, a maioria com pilotis e um limite de seis andares.

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Embora a implantação e a estética dos edifícios sejam diferentes, todas as superquadras têm densidades semelhantes e grandes espaços verdes. Ao liberar o nível do solo de grandes obstáculos, a adoção dos pilotis proporcionou inúmeras possibilidades de caminhos para o pedestre, transformando cada superquadra num amplo espaço público. Essa tipologia arquitetônica também está alinhada com o objetivo de incentivar a interação social nas superquadras.

Ao explicar como a ideia da superquadra surgiu, Marcílio Mendes Ferreira e Matheus Gorovitz reforçam o fato de que ela era essencialmente utópica. Eles não hesitaram em apontar aspectos problemáticos do plano de Brasília, afirmando que a cidade não considerava o mundo como ele é, mas como os planejadores desejavam que ele fosse. Naturalmente, muitas ideias originais foram subvertidas à medida que pessoas e empresas se estabeleceram nas superquadras.

Um exemplo de controvérsia mencionado no livro é a ocupação predominante de famílias ricas no Plano Piloto, em contraste com o objetivo original de promover a interação entre diferentes classes sociais nas unidades de vizinhança.

Estrutura do Livro

O livro apresenta seu conteúdo de maneira dinâmica. Ele explica o conceito das Superquadras em diferentes formatos, como textos históricos, entrevistas, fotos e desenhos. “A invenção da Superquadra” começa explicando alguns dos conceitos que influenciaram o projeto de Brasília e as expectativas de Lucio Costa para a área residencial. Em seguida, são apresentados artigos originais de Lucio Costa, reforçando as intenções que ele tinha para o projeto de Brasília.

Textos de outros autores também são mostrados, fornecendo diferentes perspectivas com considerações críticas sobre a cidade. Subsequentemente, começa a seção de entrevistas, que contém conversas de ex-colegas de trabalho de Lucio Costa e Oscar Niemeyer, além de outros arquitetos importantes.

Foto: Taís Arruda/gov.br

Finalmente, o livro apresenta sua parte mais documental, com várias imagens de plantas, cortes e fotos de Joana França, uma das fotógrafas de arquitetura mais famosas de Brasília. Todo o conteúdo visual se concentra nos edifícios que fazem parte das superquadras das asas Norte e Sul.

Destaques

Marcílio Mendes Ferreira e Matheus Gorovitz reúnem informações não apenas interessantes, mas muito importantes para a identidade de Brasília. “A invenção da Superquadra” acabou sendo uma ferramenta essencial para arquitetos, urbanistas e pesquisadores na cidade terem um conhecimento mais profundo sobre Brasília e promoverem a manutenção efetiva de seu plano e edifícios.

Os desenhos e as imagens mostram como os edifícios e as superquadras diferem entre si e, ao mesmo tempo, mantêm a mesma tipologia e linguagem. Embora “A invenção da Superquadra” apresente muitas qualidades do projeto de Brasília, o destaque do livro é seu propósito de incentivar as pessoas a olharem para a cidade com um olhar crítico.

Artigo publicado originalmente em Rethinking the Future.

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