O NextCity, que já havia defendido a desregulamentação do transporte coletivo no ano passado, acaba de postar uma história bastante completa sobre o sistema de Lima, que desregulamentou o transporte em 1991, removendo barreiras de entrada para competidores privados assim como controle de preços das passagens.
O texto cita várias situações interessantes que não devem surpreender os leitores frequentes deste blog. Na minha tradução:
“O sistema, com todo seu caos, também fornece transporte barato e de sobra para a classe trabalhadora da cidade, indo para lugares (e mantendo tarifas mais baixas) que os sistemas formais de muitas outras cidades.”
E continua:
“Como se contrói um desenvolvimento voltado para o transporte coletivo em uma cidade onde o desenvolvimento parece naturalmente predisposto à informalidade, crescendo nas periferias e mudando a cada dia? Assim é como Lima tem crescido nas últimas décadas — e como o sistema privado de ônibus, com todos os problemas que ele causa para a cidade como um todo, tem tido sucesso por sua adaptabilidade e agilidade.
“Tem um motivo pelo qual o transporte funciona da maneira que é em Lima”, diz McConville. “A flexibilidade do sistema, sua cobertura — muita gente que precisa do serviço são as comunidades pobres na periferia da cidade. Estas comunidades estão mudando o tempo todo. É muito difícil de atendê-las com um sistema formalizado.”
“Um grande motivo pelo qual o número de usuários de transporte coletivo aumentou drasticamente foi precisamente pelo modo como o sistema funciona. Ônibus privados vão diretamente onde estão as pessoas, e cobram o que elas conseguem pagar. Formalizar o sistema pode ser um risco que vale a pena tomar, mas não deixa de ser um risco.“
“O desafio que Lima tem é de [reformar o sistema e ainda] manter os 80% de moradores que usam transporte coletivo,” diz Tapia. Parte de o que fez a rede de ônibus privado tão atraente foi sua capacidade de se adaptar para a população expansiva de Lima. Antes da entrada dos ônibus privados, os moradores da cidade — especialmente aqueles nas periferias — tinham acesso inadequado ao transporte.”
E para concluir (e vamos comparar isso com a situação brasileira):
“Este sistema serviu a cidade nos últimos 20 anos, e manteve preços estáveis por mais de uma década. Por outro lado, no ano passado o Metropolitano [nova linha pública de Lima] aumentou suas tarifas no BRT para tornar a linha lucrativa. O aumento de 1,50 para 2,00 soles (R$ 1,50) na tarifa única da linha principal torna o Metropolitano quase o dobro do preço dos ônibus privados.”
O artigo, por outro lado, cita alguns problemas que surgem com este sistema, e cito-os abaixo com maneiras muito simples de mitigá-los:
Acidentes causados por “corridas a passageiros”
Uma solução já citada neste blog é a de “direitos de calçada,” pois o problema surge pelo fato de a rua ser pública. Se determinadas linhas, principalmente as que trabalharem com veículos grandes, tiverem suas próprias paradas, mesmo que uma ao lado da outra, elimina-se os problemas gerados por esse tipo de concorrência. Além disso, empresas deveriam ser severamente penalizadas se forem identificadas como responsáveis por terem causado um acidente de trânsito, criando um sistema de incentivos para a boa condução.
Ameaças de “máfias” do transporte em Lima
Não vejo este problema como uma falha de um mercado competitivo per se, mas uma falha de segurança pública ao permitir ameaças sociais por grupos terroristas. É uma assunto que surge quando falamos sobre perueiros no Brasil, mas que aqui está relacionado ao fato de que o transporte coletivo privado é crime, atraindo para este mercado grupos que já se envolvem com outras atividades ilícitas.
Poluição
Quando desregulamentaram o transporte em Lima o número de ônibus multiplicou por quatro. De início vejo este aumento como positivo: mais pessoas tendo acesso à transporte coletivo e, principalmente, menos pessoas optando pelo transporte individual, o que resulta em menos poluentes.
Mas poluição que surge, principalmente com as vans antigas, certamente é uma externalidade que poderia ser mitigada. Uma forma simples de resolver isso seria apenas exigir revisões periódicas nos veículos, assim como são feitos com todos os carros que circulam na cidade, garantindo segurança e níveis toleráveis de poluentes.
O histórico da desregulamentação na capital peruana mostrou alguns problemas, mas tem correções fáceis e cria uma dinâmica impossível de ser replicada por qualquer sistema formalizado. Lima é uma grande metrópole, com políticas e problemas urbanos que se assemelham às brasileiras, e em um momento de revisão de conceitos de transporte coletivo por todo nosso país, sem dúvida é um modelo a ser considerado.
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Olá meus amigos. Sou peruano vivo na Lima. Moro na parte este da cidade. Eu quero lhes contar acerca de minha caótica e bela cidade. Lima é ingovernável desde que tenho memória. Temos un dos passages de coletivo máis baratos , comparado ao nosso salário mínimo ou aos preços internacionáis de coletivo. Só México tem un passage máis barato do que o nosso. Ainda assim México subsidia o seu combustível. Y a China, mas eles fabrican carros. México e China, dois potencias manufatureiras y subsidiadoras. Perú só tem peruanos, huehuehue. Ainda máis. O governo peruano impoe un imposto sob o combustível contaminante. Pronto veremos no Perú uma queda do uso do diésel, para transporte. Nao é problema para os taxistas porque ninguém que faz serviço de taxi utiliza gazolina. Todos utilizam GNV ou GLP. E os micros, onibuses, todos eles vao a mudar diésel por combustível menos contaminante. O SIT “metropolitano” o BTR é uma estafa. E un roubo porque é caro demáis além de ser un monopólio de prefeitos , municipios y contratistas. Eles monopolizan as rutas, as vías. Isso faz tao caro seu serviço. Um abraço.