Bairros nunca tiveram o propósito de serem imutáveis
As mudanças nos bairros e nas cidades ao longo dos anos é natural e tentar impor restrições para elas é um equívoco.
“Supor a existência de algo ainda desconhecido como forma de dar conta do visível, e partir em busca desse ‘algo’ com os recursos da ciência” — Renato Mezan
22 de abril de 2017Estamos presenciando, mudos, uma transformação silenciosa do espaço urbano e de suas manifestações nos cotidianos. O tecido da arquitetura comum, aquele que constitui nossas ruas, bairros e cidades, segue sendo transformado a partir de imposições de introversão dos espaços, padronizações estereotipadas e irracionalidades ligadas ao medo e à rejeição do outro.
A arquitetura, na maioria das abordagens, é considerada a consequência de práticas e decisões: a arquitetura é o efeito. Este livro reverte esta ideia para mostrar que a arquitetura não só produz efeitos, mas que esses efeitos vão muito além do estético e funcional. Ela diz respeito ao que acontece também fora da arquitetura — na “vida entre edifícios”.
Os trabalhos reunidos neste livro trazem relatos de pesquisas de ponta e ensaios teóricos que cobrem o vasto leque dos efeitos da arquitetura e da urbanização: efeitos sobre as dinâmicas sociais, sobre a política do cotidiano, a segurança pública, o meio ambiente, a esfera político-normativa, a segregação e as soluções habitacionais. Reunindo pesquisadores e profissionais da produção urbana, o livro explora, como poucos, os efeitos multidimensionais da arquitetura.
Pela primeira vez na história da humanidade cidades não são construídas como conglomerações de espaços urbanos, mas como edificações individuais. Enquanto as cidades do passado foram construídas pelo acréscimo de novas edificações justapostas ao longo de espaços públicos, as novas áreas urbanas são com frequência agrupamentos de edifícios isolados entre estacionamentos. Esses edifícios isolados não constroem tecido — e falham em dar suporte ao pedestre e à apropriação do espaço público. Mas essas implicações graves não se limitam aos locais onde vivemos: elas se estendem ao nosso contexto ambiental mais amplo.
Analisando estudos de caso em diversas cidades e regiões brasileiras, o livro traz capítulos nos seguintes eixos temáticos sobre os efeitos da urbanização:
Arquitetura, forma urbana e dinâmicas sociais. A primeira parte do livro trata o espaço urbano como condição de apropriação e vida social, fazendo uso de análises capazes de diferenciar as influências de fatores da configuração espacial sobre dinâmicas sociais.
Polis e esfera pública: as condições urbanas da política do cotidiano. A segunda parte do livro reúne análises interpretativas da relação entre espaços construídos e livres, privados e públicos onde a esfera pública constantemente se constitui.
Forma urbana e segurança pública investiga as implicações da forma urbana e as condições da segurança. A dimensão da reprodução da violência tem importância por tratar da condição espacial da materialização das oportunidades do crime, um problema no qual a arquitetura e a constituição do espaço urbano se tornam ativas.
Pobreza urbana: os efeitos da segregação e das novas soluções habitacionais explora as relações entre segregação espacial, diferenças de renda e composição das redes sociais como parte das causalidades na reprodução da pobreza urbana; e os efeitos da localização e configuração de complexos do Programa Minha Casa Minha Vida sobre a sociabilidade e o comportamento de seus moradores.
Cidade e ambiente traz as implicações ecossistêmicas da forma urbana, das externalidades negativas da expansão urbana sobre tecidos biótico ao desempenho da edificação quanto ao consumo de materiais e seus impactos ambientais, no consumo de energia e emissões.
As responsabilidades da esfera normativa. A seção final do livro discute a fixação de padrões urbanísticos e arquitetônicos marcados por uma a ausência de atenção a sua consequências sobre as dinâmicas cotidianas da cidade, apontando relações entre políticas, forma e vida social, e as alterações de legislação necessárias para a atenção aos efeitos da arquitetura e da urbanização.
Os capítulos e os autores:
A cidade como resultado: Consequências de escolhas arquitetônicas — Vinicius M. Netto
Fatores morfológicos da vitalidade urbana — Renato T. de Saboya
Forma urbana e transporte a pé — Júlio Celso Vargas
Utopia no cotidiano: espaço público, desejo e fruição na formação da cidade — Thereza Carvalho
Lugares públicos — Eugenio Queiroga
Perfis Espaciais Urbanos para avaliação de lugares vulneráveis ao crime — Circe Monteiro e Rafaella Cavalcanti
Arquitetura, espaço urbano e criminalidade — Mariana Vivan e Renato T. de Saboya
Em busca dos mecanismos relacionais nas redes sociais de indivíduos pobres — Eduardo Marques
Impactos de complexos Habitacionais do PMCMV — Vinicius M. Netto e colegas
Nova política e velhos desafios — Adauto Cardoso e Samuel Jaenisch
Habitação de interesse social: relações entre o tipo arquitetônico dos empreendimentos e impactos ambientais — Andrea Kern e colegas
Impactos da produção da forma urbana sobre o meio ambiente — Rita Montezuma
O mundo das miudezas — Frederico de Holanda
Por um Projeto de Cidade — Tiago Holzmann da Silva
Finalmente… Livros importam? Um livro pode contribuir para mudar uma realidade? No caso dos impactos que a arquitetura exerce sobre o mundo social, ambiental, político e econômico, a resposta precisa ser “sim”. Um livro que aponte com clareza o que está acontecendo com as cidades brasileiras, pode, amparado por pesquisa empírica e reflexão teórica, fazer a diferença ao divulgar ideias e evidências, e assim, tocar corações e mentes. Pode alimentar aqueles imersos no ensino e na pesquisa e provocar os envolvidos na decisão e na construção da cidade. Uma compreensão levada, portanto, aos corações e convertida na responsabilidade com os atos de construir. Um livro assim poderia influenciar positivamente as práticas e as regras do jogo normativo. Um livro assim teria o papel de despertar atenções e atuações. Movidos por esses desejos, escrevemos o presente livro.
Somos um projeto sem fins lucrativos com o objetivo de trazer o debate qualificado sobre urbanismo e cidades para um público abrangente. Assim, acreditamos que todo conteúdo que produzimos deve ser gratuito e acessível para todos.
Em um momento de crise para publicações que priorizam a qualidade da informação, contamos com a sua ajuda para continuar produzindo conteúdos independentes, livres de vieses políticos ou interesses comerciais.
Gosta do nosso trabalho? Seja um apoiador do Caos Planejado e nos ajude a levar este debate a um número ainda maior de pessoas e a promover cidades mais acessíveis, humanas, diversas e dinâmicas.
Quero apoiarAs mudanças nos bairros e nas cidades ao longo dos anos é natural e tentar impor restrições para elas é um equívoco.
Com o objetivo de impulsionar a revitalização do centro, o governo de São Paulo anunciou a transferência da sua sede do Morumbi para Campos Elíseos. Apesar de ter pontos positivos, a ideia apresenta equívocos.
Confira nossa conversa com Diogo Lemos sobre segurança viária e motocicletas.
Ricky Ribeiro, fundador do Mobilize Brasil, descreve sua aventura para percorrer 1 km e chegar até a seção eleitoral: postes, falta de rampas, calçadas estreitas, entulhos...
Conhecida por seu inovador sistema de transportes, Curitiba apresenta hoje dados que não refletem essa reputação. Neste artigo, procuramos entender o porquê.
No programa Street for Kids, várias cidades ao redor do mundo implementaram projetos de intervenção para tornar ruas mais seguras e convidativas para as crianças.
Algumas medidas que têm como objetivo a “proteção” do pedestre na verdade desincentivam esse modal e o torna mais hostil na cidade.
A Roma Antiga já possuía maneiras de combater o efeito de ilha de calor urbana. Com a mudança climática elevando as temperaturas globais, será que urbanistas podem aplicar alguma dessas lições às cidades hoje?
Joinville tem se destacado, há décadas, por um alto uso das bicicletas nos deslocamentos da população.
COMENTÁRIOS