Combatendo o crime sem policiais: o papel fundamental do espaço urbano
Pequenas intervenções preventivas no desenho urbano podem ser mais valiosas do que vários policiais.
Muitos motoristas tem a percepção de que as novas ciclovias agravam os congestionamentos urbanos. Isso é verdade?
7 de março de 2022Em 2021, o motorista médio de Londres passou 148 horas nos engarrafamentos — o dobro da média nacional, de acordo com um novo relatório da Inrix, uma empresa que analisa o tráfego rodoviário. Essas descobertas levaram a uma reportagem da BBC que atribuiu o novo suposto status de cidade mais congestionada do mundo a um aumento nas ciclovias, implementadas em toda Londres para garantir o distanciamento social nas viagens durante a pandemia. Essa análise parece ignorar o fato de que o congestionamento em 2021 foi praticamente o mesmo que em 2019.
Para entender o que está acontecendo, precisamos lembrar que a quantidade de tempo disponível para cada um de nós restringe o quanto podemos viajar. Há muitas coisas que precisamos encaixar em 24 horas e, em média, passamos apenas uma hora nos deslocando. Isso limita o acúmulo de congestionamento nas cidades.
O congestionamento do tráfego rodoviário ocorre quando há uma alta densidade de pessoas, grande frota de carros e falta de espaço suficiente para todas as viagens de carro possíveis. Se os volumes de tráfego aumentarem por qualquer motivo, os atrasos aumentarão e algumas pessoas que poderiam dirigir farão outras escolhas. Elas podem viajar em um horário diferente ou fazer outra rota, usar um modo alternativo como o ônibus, mudar de destino e ir para um shopping diferente, por exemplo, ou ainda decidir não viajar, comprando online.
Se o espaço viário for retirado dos carros para criar ciclovias, o engarrafamento aumentará inicialmente. Mas os atrasos adicionais levarão alguns motoristas a tomar outras providências, e o congestionamento voltará ao que era.
O efeito geral é reduzir a proporção de viagens de carro. É o que vem acontecendo em Londres há muitos anos, à medida que a população cresceu e houve um grande investimento em transporte público. O uso do transporte privado caiu de 48% em 2000 para 37% em 2019, enquanto o uso do transporte público cresceu de 27% para 36% no mesmo período. O ciclismo aumentou de 1,2% para 2,4%, enquanto a caminhada se manteve estável em 25%.
A estratégia do prefeito de Londres visa reduzir o uso do transporte privado para 20% de todas as viagens até 2041. Isso provavelmente diminuiria a quantidade total de congestionamento de tráfego, embora não necessariamente sua intensidade nos horários de pico nas áreas mais movimentadas.
A criação de ciclovias reduz o espaço disponível para carros, mas não tira as pessoas de dentro deles. Copenhague é uma cidade famosa pelo ciclismo, com 28% das viagens feitas de bicicleta. No entanto, o tráfego de carros é apenas um pouco menor do que em Londres. Além do ciclismo, a outra grande diferença é que o transporte público representa apenas metade da proporção de viagens em comparação com Londres.
A experiência de Copenhague mostra que as pessoas podem ser persuadidas a deixar os ônibus e adotarem as bicicletas, que são mais baratas, mais saudáveis, melhores para o meio ambiente e não mais lentas no trânsito congestionado.
No entanto, os ônibus são uma maneira eficiente de usar o espaço viário para transportar pessoas em áreas urbanas. Substituir os motores a diesel por propulsão elétrica ou a hidrogênio também pode reduzir as emissões de carbono. Tirar os motoristas dos carros e colocá-los nas bicicletas se mostrou mais difícil, mesmo em Copenhague, uma cidade pequena e plana com excelente infraestrutura cicloviária e uma forte cultura de ciclismo.
Em várias cidades europeias, existem diversos padrões de viagens por diferentes modais, refletindo a história, geografia, tamanho e densidade populacional de cada lugar. Mas não há grandes cidades com altos níveis de ciclismo e transporte público.
As perspectivas de um aumento substancial do ciclismo em Londres estão longe de serem certas, dado o nível relativamente alto de uso de transporte público. Ainda assim, o próprio ato de criar ciclovias reduz o espaço viário para carros, independentemente do grau de utilização dessas faixas.
A Covid-19 teve um grande impacto no uso do transporte público em Londres, e as viagens de ônibus e metrô ainda estão em 70–75% dos níveis pré-pandemia. O deficit financeiro pode significar que a Transport for London precisa reduzir os serviços, a menos que o governo ofereça mais apoio.
Nessas circunstâncias, não seria possível um maior investimento em novas rotas ferroviárias, tanto subterrâneas como de superfície. O investimento em infraestrutura ciclável faria mais sentido para reduzir o uso do carro em Londres, tanto incentivando o ciclismo como alternativa quanto diminuindo o espaço para as pessoas dirigirem.
Artigo publicado originalmente em The Conversation em 9 de dezembro de 2021.
Somos um projeto sem fins lucrativos com o objetivo de trazer o debate qualificado sobre urbanismo e cidades para um público abrangente. Assim, acreditamos que todo conteúdo que produzimos deve ser gratuito e acessível para todos.
Em um momento de crise para publicações que priorizam a qualidade da informação, contamos com a sua ajuda para continuar produzindo conteúdos independentes, livres de vieses políticos ou interesses comerciais.
Gosta do nosso trabalho? Seja um apoiador do Caos Planejado e nos ajude a levar este debate a um número ainda maior de pessoas e a promover cidades mais acessíveis, humanas, diversas e dinâmicas.
Quero apoiarPequenas intervenções preventivas no desenho urbano podem ser mais valiosas do que vários policiais.
Confira nossa conversa com Janice Perlman sobre sua pesquisa nas favelas do Rio de Janeiro.
Cabo Verde, na África, tinha uma política habitacional muito voltada para a construção de novas moradias, mas reconheceu que era necessária uma nova abordagem com outras linhas de atuação. O que o Brasil pode aprender com esse modelo?
Os espaços públicos são essenciais para a vida urbana, promovendo inclusão, bem-estar e identidade coletiva, mas frequentemente são negligenciados. Investir em seu projeto, gestão e acessibilidade é fundamental para criar cidades mais justas, saudáveis e vibrantes.
O conceito da "Cidade de 15 Minutos" propõe uma mobilidade facilitada sem depender do automóvel. Como a cidade de São Paulo se encaixaria nesse contexto? Confira a análise do tempo de deslocamento dos moradores para diferentes atividades.
Conheça os projetos implementados no Rio de Janeiro para melhorar a mobilidade urbana e o acesso das crianças às suas escolas.
A taxa de vacância indica a ociosidade de imóveis em uma cidade ou região. Para construir estratégias para equilibrá-la, é preciso entender o que esse número realmente significa.
O efeito cascata na habitação, também conhecido como filtragem, sugere uma forma de lidar com o problema da acessibilidade habitacional. Porém, sua abordagem pode ser simplista e é preciso entender as complexidades da dinâmica do mercado e das cidades.
A proposta de pulverização de empregos como solução para a mobilidade pode soar promissora, mas gera diversos impactos econômicos, sociais e espaciais na dinâmica urbana e no mercado imobiliário.
COMENTÁRIOS