Podcast #112 | Vida urbana e saúde
Confira nossa conversa com o médico Paulo Saldiva sobre como a vida urbana, a mobilidade e a poluição afetam a saúde das pessoas.
Muitos se perguntam como podem contribuir com a cidade ou iniciar um projeto para ela. Esta é a lista atualizada com algumas das principais possibilidades.
1 de maio de 2025Em 2018, publicamos o artigo Urbanismo: 10 maneiras de trabalhar com planejamento urbano como resposta a um questionamento recorrente dos leitores estudantes, recém-formados ou apenas entusiastas de temas urbanos. Passados 7 anos, resolvemos atualizar a lista com novas referências de empresas, projetos e organizações que surgiram mais recentemente e que vale a pena conhecer.
Antes de começar, é importante saber o que exatamente significa “ajudar” a cidade, ou até mesmo refletir sobre qual o objetivo que você gostaria para a sua cidade, então algum tipo de embasamento educacional é importante. Existem muitas pessoas engajadas que, na prática, podem prejudicar a acessibilidade da cidade com suas demandas, apesar de levantarem uma bandeira a favor dela.
Exemplo são algumas associações de moradores que lutam para impedir novas construções em regiões bem localizadas da cidade, restringindo a oferta de moradia em detrimento daqueles que gostariam de morar mais próximos à região central da cidade. Essas instituições têm todo direito de se manifestar, mas os argumentos usados nem sempre têm resultados positivos claros para a cidade como um todo.
Outros, por exemplo, divulgam e defendem ferozmente o investimento público em grandes projetos de infraestrutura como viadutos e VLTs, por acreditarem que são boas soluções de mobilidade, enquanto raramente são. Estudos técnicos são necessários para verificar a viabilidade econômica de grandes projetos e se eles seriam, de fato, a melhor solução de transporte para a cidade.
Tais exemplos mostram que é importante estar informado antes de iniciar um engajamento pela cidade. Ultrapassada a fase de preparo, listo dez maneiras de trabalhar com urbanismo:
Talvez a forma mais convencional de se atuar em urbanismo seja através do setor público: é possível trabalhar em órgãos municipais como secretarias de planejamento urbano ou departamentos relacionados a transporte para entender, na prática, como as decisões são feitas na gestão pública das cidades.
Esta é a primeira alternativa que vem em mente aos que desejam trabalhar no setor, mas que às vezes é descartada por ser limitada em termos de número de oportunidades e nem sempre se adequar às aspirações profissionais daqueles que desejam transformar as suas cidades.
O ativismo urbano é uma forma tradicional e poderosa de trabalhar pelo urbanismo da cidade, mesmo que sem fins lucrativos, e que não requer uma formação tradicional. A partir do ativismo, a lendária Jane Jacobs iniciou com o jornalismo e através de seus livros e trabalho de ativismo se tornou uma das urbanistas mais influentes do nosso tempo.
Ela conseguiu, por exemplo, mobilizar a população e impedir a construção da Lower Manhattan Expressway, uma super avenida de dez faixas que atravessaria as regiões de Manhattan do Greenwich Village, SoHo, Little Italy, Chinatown e Lower East Side, além de uma série de outras vitórias pelo meio do ativismo. Exemplos semelhantes de protesto ocorrem no Brasil, como os movimentos que denunciaram irregularidades nas licitações do Cais Mauá e do Cais Estelita, em Porto Alegre e Recife, respectivamente.
Para quem é da área, uma forma convencional é trabalhar para consultorias que complementam os corpos técnicos públicos oferecendo serviços e projetos de urbanismo.
É muito comum prefeituras contratarem serviços de consultoria para a elaboração de planos de mobilidade, planos diretores ou para a implementação de grandes obras como redes de metrô ou BRTs. A WRI, que possui escritórios brasileiros em Porto Alegre e em São Paulo, é uma consultoria sem fins lucrativos que trabalha na área com especialistas nas frentes: Cidades, Clima e Florestas.
Já a Engemind, onde trabalhou Marcos Paulo Schlickmann, colaborador do Caos Planejado, é especializada em transportes. Na área do direito, temos exemplos como o escritório Apparecido e Carvalho Pinto Advogados, que presta assessoria jurídica a iniciativas públicas e privadas que impactam o desenvolvimento urbano e a gestão do território.
Até mesmo empresas de consultoria mais tradicionais e genéricas, como a McKinsey ou a KPMG, possuem grupos internos específicos que tratam de temas específicos, desde o auxílio a prefeituras na regulação de aplicativos de transporte a projetos de infraestrutura.
Outra área tradicional no urbanismo é a área de pesquisa, seja ela na academia ou no setor público. É possível encontrar departamentos de urbanismo em universidades do Brasil inteiro onde é possível realizar pesquisas e ministrar aulas na área de urbanismo profissionalmente.
Grupos de pesquisa como o FGV Cidades e o Centro de Estudos das Cidades – Laboratório Arq.Futuro do Insper são exemplos que contam com equipes multidisciplinares atuando em temas como mobilidade, habitação e inovação. O Instituto Cidades Responsivas, do grupo OSPA, une educação, pesquisa e consultoria com diferentes frentes de atuação focadas em arquitetura, tecnologia e economia urbana. Na Universidade de Brasília, também temos o exemplo do Centro de Estudos de Espaços Públicos, comandado pela professora Gabriela Tenorio, que é colunista do Caos Planejado, assim como o Arq.Futuro e o Cidades Responsivas.
Ainda, em entidades como o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, o IPEA, podemos encontrar pesquisadores como a Vanessa Nadalin, que já escreveu para o Caos Planejado sobre imóveis vazios, e Rafael Pereira, pesquisador na área de transportes e autor do excelente blog Urban Demographics.
Também no setor público, um papel pouco valorizado de contribuição para a cidade é o do vereador. A Câmara dos Vereadores é responsável por aprovar todas as leis municipais, inclusive o Plano Diretor, que é o documento de maior impacto para o futuro de uma cidade. Infelizmente a eleição de vereadores ainda é pouco valorizada perante o impacto que a Câmara pode ter no rumo de uma cidade, mas seria interessante ver isso mudando no futuro. Vereadores deveriam ser os grandes interessados no futuro da cidade, estando bem versados em questões relacionadas ao desenvolvimento urbano.
Outra forma de contribuir para a cidade é o que atualmente chamam de “urbanismo tático”, ou “tactical urbanism”, em inglês, onde moradores fazem pequenas intervenções em espaços públicos e privados, gerando grandes resultados para a sua melhoria.
Nesses casos normalmente não há muita dúvida sobre a repercussão positiva da ação, que pode ser desde ajudar a tapar buracos nas calçadas até espalhar cadeiras em espaços para as pessoas sentarem. A organização Global Designing Cities Initiative (GDCI) tem atuado no Brasil nos últimos anos com projetos desse tipo, como o programa Caminhos da Escola, em Fortaleza, que mobilizou moradores e órgãos governamentais e criou ruas mais seguras e convidativas para crianças. Em São Paulo, também existem entidades como o Sampapé, que estimulam o transporte a pé pela cidade.
Um dos poucos exemplos que pode gerar algum risco é o movimento para plantar árvores em espaços públicos de forma espontânea. Embora árvores, de forma geral, possam contribuir para o bem estar no ambiente urbano, a escolha errada de espécies ou locais para plantio pode gerar problemas como o conflito entre o crescimento das raízes e a infraestrutura urbana, como calçadas e tubulações, frutos que podem ser tóxicos ou cair nas calçadas, e dificuldades de poda e manutenção. De forma geral, o urbanismo tático envolve coisas simples, mas que fazem a diferença na mobilização da comunidade.
Leia mais: Podcast #108 | Ruas para Crianças e a Global Designing Cities Initiative
Nesse mesmo sentido, existem várias startups que estão cada vez mais relacionadas com as cidades, com possibilidade de grande impacto. Os exemplos mais evidentes seriam as startups de transporte como Uber, 99 e Cabify, que participaram ativamente da criação de uma solução mais tecnológica para o transporte individual.
Agora uma nova onda de startups está trabalhando na área de bicicletas e patinetes compartilhados, como a Jet, a Whoosh e a Tembici. A Lev, marca que nasceu no Rio de Janeiro e vende bicicletas elétricas, também tem expandido a sua produção nos últimos anos e contribuído para uma mobilidade urbana menos dependente do carro nas cidades brasileiras.
Não só startups, mas empresas de tecnologia em diferentes escalas estão cada vez mais investindo em cidades. Um exemplo é a plataforma Place, também do grupo OSPA, que, a partir do mapa da cidade e da legislação urbanística, organiza dados visualmente e cria soluções para analisar, gerenciar e simular situações urbanas de forma rápida, clara e de fácil compreensão.
A área de incorporação imobiliária também possui um papel transformador na cidade que não deve ser descartada para aqueles que têm o urbanismo como objetivo. O entendimento de cidades pode ser um grande diferencial na hora de escolher um terreno e de avaliar um projeto de arquitetura, e atualmente carecem bons exemplos de edificações que possuem uma relação positiva com a cidade.
Empresas como a Weefor, incorporadora de Curitiba, e a Idea!Zarvos, de São Paulo, buscam desenvolver seus edifícios de maneira consciente na sua relação com a calçada e a cidade, contribuindo para bairros melhores e mais caminháveis..
Pensando em uma escala maior para trabalhar com urbanismo, empresas de loteamento podem ter ideias diferenciadas e o impacto social como prioridade, trabalhando na criação de verdadeiros bairros planejados. Em Brasília, a UP, por exemplo, que também é responsável pela Urbitá, faz um trabalho profundo de pesquisa sobre a criação de espaços públicos para a área que está desenvolvendo e lidera um enorme processo de regularização fundiária da comunidade no seu entorno.
Do outro lado do balcão, sempre temos que lembrar que, como consumidores, também estamos direcionando o crescimento da cidade, e você pode exercer seu poder de consumidor de forma consciente. Na compra de um imóvel, você pode procurar um edifício que esteja contribuindo para o espaço urbano da sua cidade, e não um que se isola na quadra.
Você pode escolher reformar um apartamento no centro, ao invés de comprar uma casa na periferia, diminuindo a demanda para o espraiamento da cidade. No lado da mobilidade, se a sua rua for segura, você pode experimentar andar a pé ou de bicicleta, pois a sua ação incentiva outras pessoas a fazerem o mesmo.
A criação de associações de bairros, às vezes até mesmo por grupos de WhatsApp, também podem ajudar em um processo colaborativo de melhorias do bairro e de desenvolvimento de uma rede de apoio entre moradores que às vezes falta em grandes cidades.
Aqui no Caos Planejado, nos consideramos parte do ecossistema de urbanismo através da área de comunicação. Existem outras plataformas no Brasil com formatos semelhantes, como o próprio Arq.Futuro, que publicou o nosso Guia de Gestão Urbana e que também promove cursos e eventos sobre urbanismo, o Somos Cidade e o Mobilize Brasil, focado em mobilidade urbana.
É importante destacar que o Caos Planejado iniciou como um blog pessoal que buscava entender melhor os assuntos relacionados a cidades. Com a internet, as ferramentas estão disponíveis para todos criarem suas plataformas para compartilharem suas ideias e trabalhar com urbanismo à sua maneira, algo que deve ser estimulado para criarmos um ecossistema mais rico e acessível sobre urbanismo.
Nos Estados Unidos, por exemplo, a “blogosfera” de urbanismo é muito mais avançada que no Brasil, com centenas de blogs e milhares contas no X que discutem sobre temas desde políticas de moradia a projetos de transporte. Aqui no Brasil também vemos perfis no Instagram e no TikTok que estão crescendo falando sobre cidades, como é o caso do Ruan Juliet, que explica de forma despretensiosa e descontraída como é a vida na favela.
A participação cívica em uma discussão mais aprofundada sobre os temas urbanos acaba gerando maior conscientização sobre as políticas urbanas e uma melhor cobrança pela responsabilidade dos gestores públicos.
E você, como vai transformar a sua cidade?
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Os diferentes métodos para calcular a densidade de pessoas morando em uma determinada área podem tornar difícil o entendimento desse conceito.
Se hoje o Brasil começasse a urbanizar uma favela por semana, demoraríamos 230 anos para integrar todas as favelas e comunidades às nossas cidades. 230 anos. Ou seja, teríamos de aguardar nove gerações. Por isso, precisamos falar com urgência de soluções transitórias.
O processo de licenciamento ambiental, necessário para a aprovação de projetos nas cidades brasileiras, apresenta diversos entraves na prática.
A mudança recente na forma como o IBGE chama as favelas reflete as transformações ao longo do tempo nesses lugares e vai ao encontro de investigações acadêmicas que apontam o fortalecimento do empreendedorismo.
Iniciado em 1970, o processo de favelização na cidade de Guarulhos foi marcado por processos de migração, ações de retirada de barracos e lutas de resistência.
O domínio de facções no Brasil revela a falência do Estado e a precariedade do urbanismo formal. Transporte, serviços e espaços públicos são moldados por regras paralelas, expondo a exclusão e a desigualdade, enquanto soluções urgentes para a dignidade urbana são necessárias.
Confira nossa conversa com o jornalista Raul Juste Lores sobre o debate urbanístico no Brasil nos últimos anos.
O Coeficiente de Aproveitamento determina a área construída permitida em cada lote da cidade. Apesar de ser um instrumento importante na gestão urbana, a forma como ele é definido e aplicado no Brasil carrega diversas contradições.
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