Como banheiros públicos ajudam a promover dignidade, inclusão e caminhabilidade
Foto: Bayside City Council

Como banheiros públicos ajudam a promover dignidade, inclusão e caminhabilidade

Banheiros públicos são investimentos essenciais para garantir a qualidade dos espaços públicos nas cidades.

31 de outubro de 2024

Há algo pior do que avistar um banheiro público no momento em que você mais precisa, apenas para descobrir que ele está trancado? Claro, há coisas piores do que isso, mas é uma grande frustração, não é?

Desde que tive filhos, fiquei particularmente atenta à disponibilidade — ou falta dela — de banheiros públicos na maioria dos lugares. É um serviço considerado opcional, quando na verdade deveria ser tratado como absolutamente essencial.

É curioso. Ao longo dos anos, tive a sorte de visitar familiares em diferentes regiões do Canadá, e algumas das memórias que mais se destacam são de banheiros públicos bem feitos que estavam lá quando eu precisava. Em Niagara-on-the-Lake, em Ontário, havia um banheiro público escondido no porão de um prédio na rua principal. Era fácil passar despercebido, mas depois que eu soube onde ele ficava, não me esqueci mais. Ou o bonito, espaçoso e impecável banheiro público no centro histórico de Ladner, na Colúmbia Britânica… esse também era bom. Também me lembro do banheiro químico mais limpo que já vi, em um playground em Caronport, Saskatchewan (população: 994). Depois de um longo dia dirigindo pelo país com três crianças pequenas, foi um verdadeiro oásis. Não podia acreditar na minha sorte.

Banheiro público no subsolo de uma praça em Vancouver, Canadá. Foto: Google Earth

O fato dos ótimos banheiros se destacarem nas minhas memórias de viagens tanto quanto museus, refeições e músicas diz algo, não é? Quer pensemos neles ou não, eles são essenciais.

Penso muito sobre a qualidade do espaço público, e a oportunidade de observar isso surge frequentemente para mim como usuária do transporte público em um lugar com um sistema precário. Como odeio me atrasar, geralmente incluo uma margem de tempo nos meus planos de locomoção, caso enfrente atrasos imprevistos. Por causa disso, às vezes fico com tempo de sobra no meu destino ou enquanto espero meu ônibus para voltar para casa. Nesse tempo e espaço entre a minha casa e o meu destino, notei que muitas vezes espero em espaços que não têm sombra ou abrigo para se proteger do sol ou da chuva. Não há onde sentar e descansar, exceto talvez em uma borda suja. E não há banheiros ou até mesmo um lugar para lavar as mãos. Até fontes de água ao ar livre eram de certa forma comuns quando eu era criança. Hoje, mal me lembro da última vez que vi uma.

Leia mais: Dias Perfeitos e a ode aos banheiros públicos de Tóquio

Parece-me que, ao longo do tempo, houve uma verdadeira degradação da experiência humana nos espaços públicos. As (aparentemente) pequenas coisas que tornam o estar fora de casa um pouco mais fácil e agradável… ou mesmo viável.

Essa é a questão da escassez de banheiros públicos: não é apenas um incômodo. Afeta realmente a vida das pessoas. Um relatório de 2019 do Reino Unido revelou alguns dados preocupantes. O estudo mostrou que 20% das pessoas não sentem que podem sair de casa tanto quanto gostariam, especificamente por causa da falta de acesso a banheiros. Quando meus filhos eram pequenos, eu certamente estaria entre esses 20%. Para aqueles com condições médicas que requerem uso frequente do banheiro — como diabetes ou problemas de bexiga, intestino ou próstata — esse número sobe para 43%.

De forma preocupante, o estudo descobriu que mais da metade da população pratica a desidratação deliberada (reduzindo a ingestão de líquidos) devido à falta de banheiros públicos, algo que “pode afetar seriamente a saúde e agravar problemas médicos existentes, como cistite.”

Embora todos precisem de um banheiro de vez em quando, a falta de banheiros públicos afeta desproporcionalmente certos grupos. Para as mulheres, há muitas razões: duas em particular são que mulheres usam o banheiro com mais frequência do que os homens e são mais propensas a serem cuidadoras de crianças ou de adultos dependentes. Esse resumo da organização Women in Urbanism Canada (Mulheres no Urbanismo – Canadá) aborda mais fatores que influenciam.

E para pessoas com deficiência, a falta de banheiros acessíveis pode ser um enorme obstáculo. Penso nisso frequentemente quando tento colocar um carrinho de bebê (ou mesmo uma mala) em uma cabine de banheiro comum junto comigo. É difícil imaginar como lidar com uma situação como essa com problemas de mobilidade ou equipamentos. Ninguém deveria enfrentar a indignidade de encontrar um banheiro aberto apenas para perceber que não consegue acessá-lo fisicamente.

É interessante que, quando festas de rua e festivais acontecem, banheiros químicos quase sempre são providenciados. Desde o retorno dos grandes eventos pós-pandemia, percebi que muitos desses banheiros temporários estão melhores do que nunca. Os melhores incluem uma estação com água corrente e sabão (e até toalhas de papel!). Cidades turísticas também costumam fazer um bom trabalho com banheiros públicos, ao longo de ruas principais ou calçadões de praia.

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Por que decidimos que banheiros são indispensáveis para eventos especiais e essenciais para turistas, mas nossos cidadãos comuns não merecem o mesmo?

Por que as cidades são tão relutantes em oferecer banheiros públicos em abundância? Há o fato de que todo o assunto de funções corporais é meio tabu, claro. Preferimos não pensar nem falar sobre isso. Mas suspeito que muito disso se resume ao custo de manutenção. São despesas relativamente pequenas que parecem fáceis de reduzir ou cortar quando não há dinheiro suficiente para pagar por tudo que precisamos e desejamos. Embora os benefícios públicos dos banheiros sejam enormes em comparação ao custo relativamente baixo, entendemos facilmente que esse tipo de infraestrutura exigirá manutenção contínua e inegociável, então nem sequer os construímos. É um contraste gritante com as expansões de rodovias de milhões ou bilhões de dólares que oferecem um retorno mínimo sobre o investimento, e cujos custos de manutenção e eventual substituição nós nem consideramos.

Banheiro público em Brasília, reformado por meio do programa Adote uma Praça e pelo Instituto Cultural e Social No Setor, mantido por meio de doações. Foto: Agência Brasília/Flickr

Mesmo agora que meus filhos são mais velhos, certamente tenho um mapa mental de onde estão as opções de banheiro quando estou em locais públicos, cada um marcado com atributos variados: “não exige compra”, “tem lugar para encher garrafas de água”, “fechado no inverno, à noite etc” ou “problemas de limpeza — último recurso!”. Quando descubro um novo, arquivo esses detalhes como informações valiosas que certamente precisarei novamente algum dia.

Onde encontrar um banheiro público quando você precisa não deveria ser uma informação valiosa. Deveria ser algo que pudéssemos dar como garantido.

Artigo originalmente publicado em Strong Towns, em maio de 2024.

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