Podcast #106 | Centro de Operações do Rio de Janeiro
Confira nossa conversa com Alexandre Cardeman, responsável pela implantação do Centro de Operações do Rio de Janeiro.
Será que ainda faz sentido destinar uma parte do solo e dos escassos recursos da universidade para o estacionamento de automóveis?
21 de agosto de 2018Desde que em meados de 2015 os shoppings de Salvador passaram a cobrar pelo uso do estacionamento em suas dependências, a Universidade Federal da Bahia (UFBA) passou a ser provavelmente o único polo gerador de tráfego entre o Farol da Barra e a avenida Paralela que oferece esse serviço com gratuidade integral. Um polo gerador de tráfego é um equipamento urbano que, sendo destino de trânsito de um número considerável de pessoas, através de veículos coletivos ou individuais, gera impactos ambientais, econômicos e sociais, medidos a partir da capacidade efetiva da malha viária que o atende e as características dos modais de transporte que são utilizados.
O momento da cobrança pelo uso do estacionamento dos shoppings coincide com uma mudança nos modos de locomoção na cidade: são abertas as linhas de metrô, os aplicativos de transporte revolucionaram o serviço tradicionalmente oferecido pelos táxis ao ampliar exponencialmente a capacidade, há mais gente usando a bicicleta em um território cujo adensamento construtivo limita radicalmente a estratégia de ampliação de vias. Ainda que não se tenha feito a opção impopular pelo pedágio urbano, é evidente que a cidade está atenta à necessidade de se limitar o emprego do automóvel individual como meio de transporte.
Nesse quadro urbano geral, a UFBA começa a destoar, perfilando-se como uma incentivadora do uso do transporte individual, ao oferecer gratuitamente uma área de 5,5 ha destinada pura e simplesmente a estacionamentos. Essas áreas praticamente não têm outros usos durante todo o ano e consomem verbas em forma de manutenção (jardins e iluminação) e pessoal (limpeza, portaria e segurança). Será que ainda faz sentido destinar uma parte do solo e dos escassos recursos da universidade para o estacionamento de automóveis?
Como instituição de produção de conhecimento, compromissada criticamente com os valores da coletividade, ela não deveria servir de exemplo e apresentar à cidade uma proposta de uso do solo que avance na perspectiva da melhoria da qualidade de vida, ao menos como exemplo ao minimizar os impactos sobre sua vizinhança?
A partir de um levantamento no Google Earth, somadas as áreas hoje destinadas a estacionamento no campus do Canela — da Escola de Belas Artes à Faculdade de Direito — e no campus de Ondina — da Faculdade de Ciências Humanas até a de Arquitetura —, chega-se a um valor aproximado de 55.500 m² ou 2.200 vagas de veículos. E isso sem considerar o efetivo uso da faixa ao longo das calçadas, em toda a extensão das ruas internas ao campus, também como área de estacionamento.
Se estipularmos, bem realisticamente, que cada uma destas vagas é usada por dois ou três veículos por dia, por um período de 9 ou 10 meses por ano, e considerando que a universidade poderia cobrar pelo uso da vaga o valor exato de uma passagem de ônibus, ou seja, R$ 3,40, garantindo assim a escolha do meio de transporte ao seu estudante, funcionário ou professor sem qualquer prejuízo financeiro, uma vez que esse seria o valor de custo básico para o estudante ir e vir à universidade usufruindo da meia passagem, a universidade teria à disposição um montante anual entre R$ 4 e 5 milhões.
Esses valores, feito obviamente um detalhado estudo de viabilidade, deveriam ter condição não somente de cobrir a manutenção dessas áreas de estacionamento, senão deveriam financiar a médio e longo prazo um plano alternativo de mobilidade, que viesse a ter como meta a minimização do impacto do tráfego de veículo automotor, tornando cada vez menos atrativo o deslocamento até a universidade através de automóveis: por exemplo, medidas como planos inclinados, bicicletários, qualificação contínua da malha para pedestres, levariam a universidade a dar continuidade a ações como a que transformou em praça uma grande área do campus de Ondina, diante da Biblioteca Central, que antes era usada para estacionamento. Trata-se, portanto, de avaliar e dar continuidade a aspectos dessa intervenção tão bem sucedida. Ao final, mais espaço de convívio e recuperação de áreas verdes são exatamente o tipo de resultado com o qual a universidade pode demonstrar à sociedade sua função social.
Da mesma forma que outros serviços que hoje já são regulamentados através de processo de licitação, como é o caso das cantinas ou da segurança, a administração das áreas de estacionamento pode muito bem seguir este modelo de contratação. Mesmo o RU, o restaurante universitário, é administrado nessa modalidade. O RU aliás deveria ser a medida exata da discussão sobre as vagas de estacionamento: se o estudante, em alimentação subsidiada pela universidade, paga R$ 2,50 por uma refeição, porque a universidade deveria subsidiar integralmente, como faz hoje, em uma cidade muito densa e com sérios problemas de tráfego, o serviço de disponibilizar estacionamento de veículos individuais automotores para seus estudantes, funcionários e professores?
Texto publicado originalmente no Teatro Nu em 30 de novembro de 2017.
Somos um projeto sem fins lucrativos com o objetivo de trazer o debate qualificado sobre urbanismo e cidades para um público abrangente. Assim, acreditamos que todo conteúdo que produzimos deve ser gratuito e acessível para todos.
Em um momento de crise para publicações que priorizam a qualidade da informação, contamos com a sua ajuda para continuar produzindo conteúdos independentes, livres de vieses políticos ou interesses comerciais.
Gosta do nosso trabalho? Seja um apoiador do Caos Planejado e nos ajude a levar este debate a um número ainda maior de pessoas e a promover cidades mais acessíveis, humanas, diversas e dinâmicas.
Quero apoiarConfira nossa conversa com Alexandre Cardeman, responsável pela implantação do Centro de Operações do Rio de Janeiro.
Na gestão urbana, é imprescindível entender as implicações econômicas da regulação do uso do solo e como elas afetam a vida de milhares de pessoas.
Os caminhos para melhorar custo, governança e qualidade nas políticas de mobilidade urbana, tanto em municípios maiores quanto nos menores, via integração de diferentes meios de transporte públicos e privados.
Existem alguns equívocos comuns nas escolhas que vêm sendo feitas em políticas de mobilidade urbana, especialmente em relação à eletrificação da frota e à adoção da tarifa zero.
A métrica de "custo de construção por passageiro" é utilizada para avaliar o custo-benefício de sistemas de transporte em relação ao número de passageiros atendidos, mas ela deve ser analisada com cautela.
Confira nossa conversa com a engenheira florestal Isabela Guardia sobre arborização urbana.
Na perspectiva do desenvolvimento econômico, vemos que alguns aspectos da configuração urbana de São Paulo são excludentes.
Banheiros públicos são investimentos essenciais para garantir a qualidade dos espaços públicos nas cidades.
A pesquisa em Belo Horizonte mostra que muitas resistências comuns às ciclovias são, na verdade, equivocadas e sem fundamento.
Você vive num mundo de ilusão, a universidade não consegue fazer nada com os recursos que tem imagina se cobrar pelo estacionamento. Além de que, não tem regulação boara tal ideia.
Uso carro porque é mais barato que ônibus. Se o ônibus fosse de qualidade e mais barato, não iria pra Unicamp de carro. Cobrar uma taxa dessas, como ele propõe pra ufba, só aumentaria o custo de vida dos que poderiam pagar esse estacionamento e pioraria ainda mais a lotação dos ônibus. Esse artigo na verdade me parece atender aos interesses daqueles mesmos que desejam privatizar a Universidade Pública. Só tenho a lamentar por esse desserviço.
Erro é querer que a população de baixa renda pague pra que você faça um caro curso superior, e pague ainda o estacionamento pro teu carro. Quer sombra também? Em tempo: considerando todos os custos do automóvel – combustível, manutenção, seguro, lavagens, documentação – de fato é mais caro que o ônibus, ou uber, independente do trajeto que faça.
Boa análise.
Só uma correção, o custo do estacionamento deveria considerar ainda o valor do terreno que ficou fora de sua conta.
Realmente não faz sentido que recursos da universidade sejam usados para subsidiar estacionamento em detrimento de investimentos na educação e pesquisa.