Como a Holanda se tornou o país das bicicletas
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Marcos explica como um mau sistema de transporte segrega as oportunidades a certas regiões de uma cidade e/ou certas classes sociais.
13 de agosto de 2014Aqui vou tentar explicar como um mau sistema de transporte segrega as oportunidades (de emprego, educação, saúde, lazer, etc.) a certas regiões de uma cidade e/ou certas classes sociais. Vou discorrer sobre dois conceitos técnicos, Mobilidade e Acessibilidade, que não são os mesmos usados correntemente: Mobilidade é atualmente usado como uma palavra que engloba toda a “questão dos deslocamentos urbanos” e, muitas vezes, vem associada com as palavras Urbana e Sustentável. E Acessibilidade — essa já com alguma proximidade ao conceito que vou aqui explicar — diz respeito à acessibilidade universal em edifícios, calçadas, etc.
As cidades ainda têm alguma importância? Vale mesmo a pena gastarmos milhares de reais com essas tecnologias atrasadas, tais como ciclovias, faixas de ônibus e calçadas, visto que num futuro próximo os carros vão voar, serão elétricos, “não poluentes” e serão guiados por computadores? Além disso, com a internet uma pessoa pode viver num belo sítio com seus porcos e galinhas e trabalhar de casa, não é verdade?
Num sistema político democrático todos devem ser tratados iguais. Tanto o estado quanto qualquer cidadão não podem barrar ou privilegiar o acesso às oportunidades a outro cidadão: teoricamente o cidadão pode, com suas capacidades, acessar educação, saúde, trabalho, lazer, etc. Ninguém o pode privar disso a não ser ele mesmo.
Acesso, ou acessibilidade, é o oposto de mobilidade. Enquanto mobilidade consiste na habilidade de se mover, acessibilidade consiste na habilidade de acessar. E os dois são (quase) incompatíveis: é impossível colocar uma floricultura de bairro numa rodovia com velocidade de 120km/h, assim como é impossível permitir tal velocidade numa rua de bairro. A rodovia serve para dar mobilidade, e não acessibilidade, a rua de bairro serve para dar acessibilidade, e não mobilidade.
Na prática (e na teoria também) isso não é assim tão “tudo ou nada”. O gráfico abaixo explica a relação desses dois conceitos que norteiam o desenho das redes viárias.
Depois de mais de 100 anos da invenção do automóvel, da separação das oportunidades causadas por ele, do espraiamento urbano, ainda assim as pessoas buscam estar próximas umas das outras. As cidades que, não importa o que aconteça, ainda prosperam são as “máquinas de acesso”, como Londres, Nova Iorque, Paris, Berlim, Munique, Tóquio, Hong Kong. Essas cidades, que conseguem atender a várias demandas e necessidades da população, têm algo em comum: um sistema de transporte que promove a igualdade de acesso às oportunidades, não privando ninguém de acessar emprego, lazer, educação. Você não precisa ter um carro, não precisa ser rico, não precisa viver no “Morumbi” ou no “Leblon”.
Essas cidades sim são verdadeiras democracias de transporte, pois não impedem ninguém de acessar as oportunidades. Cabe a nós, brasileiros, decidirmos que caminho tomar: prover acesso através do carro a uma meia-dúzia ou prover um nível básico de acesso a todos — inclusive pra quem vai de carro — através de um sistema de transporte robusto e inclusivo, que não prive ninguém, pobre ou rico, morador da favela ou do condomínio, de acesso às oportunidades.
Só assim estaremos provendo a tão aclamada igualdade de oportunidades, através da igualdade de acesso às oportunidades.
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