Utilizamos cookies para oferecer melhor experiência, melhorar o desempenho, analisar como você interage em nosso site e personalizar o conteúdo. Saiba mais em Política de privacidade e conduta.
As 3 melhores iniciativas públicas para caminhabilidade no Brasil
A primeira edição do Prêmio Cidade Caminhável, realizado pelo SampaPé! com apoio do ITDP Brasil e Walk 21, reconhece as melhores iniciativas públicas para caminhabilidade nas cidades brasileiras.
Planejar e implementar projetos para priorizar a caminhabilidade deve ser prioridade nas cidades brasileiras, desde 2012, de acordo com a Política Nacional de Mobilidade Urbana (Lei Federal 12587). O deslocamento a pé é o transporte mais expressivo na vida urbana, representando 39% dos deslocamentos diários nas cidades brasileiras (SIMOB, 2019). Além disso, cidades mais caminháveis são mais sustentáveis, resilientes, saudáveis, sociáveis e democráticas.
Nesse sentido, o Prêmio Cidade Caminhável buscou conhecer e reconhecer os projetos e iniciativas que o poder público realizou nos últimos anos no caminho da priorização do caminhar. Sua primeira edição teve 28 projetos válidos inscritos, de 16 cidades diferentes, de 10 estados e do DF, com inscritos de todas as regiões do país, menos do norte.
Os projetos vencedores foram analisados por quatro mulheres especialistas em mobilidade e cidades: Jessica Lima, engenheira civil, professora da UFAL, e especialista em transportes, acessibilidade e mobilidade urbana; Kaísa Isabel Santos, arquiteta e urbanista atuante no tema da acessibilidade e conselheira fiscal do IAB SP; Meli Malatesta, arquiteta e urbanista especializada em Mobilidade Ativa, e presidente da Comissão Técnica de Mobilidade a Pé de Igualdade; e Sonia Lavadinho, geógrafa, antropóloga e socióloga urbana portuguesa, que atua pela mobilidade ativa com métodos de participação cidadã, e é fundadora da Bfluid. Elas avaliaram os projetos nas três categorias: cidades pequenas (até 100 mil habitantes), médias (100.001 a 800.000 habitantes) e cidades grandes (mais de 800.001 habitantes). Por meio de seis critérios de análise: caminhabilidade, impacto, participação social, colaboração e inovação.
Para Meli Malatesta, jurada do prêmio, há grande diversidade de projetos e diz ter ficado feliz e surpresa em ver as iniciativas das cidades grandes. Segundo ela, “por muito tempo as grandes cidades negaram a importância e sua responsabilidade com a mobilidade a pé, pensavam apenas em deslocamentos motorizados. É importante ver esse movimento por planos e projetos propostos pelo poder público nestas cidades”. As vencedoras mostram alguns caminhos possíveis em diferentes escalas de cidade.
Conde mostra como inovar em cidades pequenas
A iniciativa vencedora na categoria de cidades pequenas foi a Reurbanização do Centro de Conde, município de cerca de 25 mil habitantes na Paraíba, que revolucionou a forma de planejar e executar a cidade garantindo participação da população e criando uma experiência de caminhar muito mais agradável para as pessoas.
Para realizar o projeto, uma carta de diretrizes foi co-construída com a população para contemplar seus desejos e necessidades. Com base nela, foi feito um concurso nacional para projetos de urbanismo para requalificação do núcleo central da cidade, onde estão concentrados os mais importantes espaços e equipamentos públicos, contemplando as diretrizes apontadas na carta. O projeto a ser implantado foi escolhido por júri participativo com a cidadania que além de avaliar se os projetos promoviam os princípios da carta também considerou a viabilidade e aplicabilidade das propostas.
O projeto promoveu o redesenho dos espaços públicos, proporcionando mais segurança viária por meio de ruas compartilhadas, diminuição de velocidades, e priorização do caminhar. Um dos resultados foi a criação de uma nova dinâmica de uso dos espaços públicos para lazer no período noturno, com presença de crianças e jovens pedalando.
Sonia Lavadinho, jurada, destacou como pontos fortes do projeto a originalidade de promover um concurso nacional, o envolvimento da cidadania no processo e a mudança de hábitos no uso dos espaços em novos horários como resultado. Para ela, “foi muito interessante ver todas as etapas do projeto com envolvimento da população de forma ativa e não apenas consultiva, mas realmente decidindo sobre o projeto”. Ela espera que sirva de inspiração para outras cidades, mas acredita que, para isso, é necessário ter uma boa análise de resultados do projeto em frentes diversas como impactos nas mudanças climáticas e na criação de convivência intergeracional.
Caruaru mostra como a ressignificação de antigas estruturas de transporte podem ser oportunidades para criar espaços de qualidade, conexão e convivência
O projeto vencedor na categoria de cidades médias foi o Via Parque Caruaru, um parque linear de 8 km no eixo da antiga linha férrea, que atravessa a cidade de leste a oeste, conectando mais de 16 bairros. Como a malha ferroviária tinha seus trilhos com bastante área no entorno, foi possível desenvolver um parque com área para pedalar, caminhar e ainda ter mobiliários para atividades lúdicas e exercícios físicos. Para isso, também reduziu-se a velocidade dos veículos motorizados e do tráfego adjacente, valorizando as pessoas e a cidade.
O projeto retirou estruturas provisórias e estacionamentos existentes no pátio ferroviário, transformando as áreas públicas que estavam degradadas em espaços públicos qualificados e acessíveis para o uso cotidiano da população. Os equipamentos destinados à permanência e encontro das pessoas abrangem diversidade de usos, sendo quiosques, quadras poliesportivas, academias ao ar livre, parques infantis, pistas de skate, quadras de basquete e fonte interativa. Além disso, foram plantadas mais de 600 árvores, instaladas mais de 200 novas luminárias de LED e 80 ecopontos.
Para Jessica Lima, jurada do Prêmio, o projeto é de grande impacto pela sua extensão, qualidade e abrangência das estruturas, e ainda pela continuidade apontada em conectar rotas escolares. Segundo ela, “o projeto é muito importante para garantir conexões e lazer na cidade e priorizar o caminhar sobre a velocidade e os motores”. Ela complementa que “o ponto a melhorar nesse projeto é o envolvimento da população, e um dos pontos fortes é servir de inspiração para outros municípios que têm linhas férreas desativadas nos seus territórios em poderem ver como oportunidade de promoção do caminhar e da criação de espaços públicos de qualidade”.
As juradas lembram que as cidades pequenas e médias são as localidades em que o deslocamento a pé é parte cultural da população e integra boa parte das dinâmicas urbanas. Estas cidades têm uma vantagem de escala que as coloca em uma janela de oportunidade promissora para orientar o seu desenvolvimento urbano a partir da caminhabilidade. Neste sentido, o Prêmio desempenha um papel importante em destacar essas iniciativas para que sirvam de referência para mais projetos e cidades.
Fortaleza mostra como criar estratégias municipais de caminhabilidade e ter instrumentos para garantir sua implantação mesmo com mudanças de gestão
Na categoria de cidades grandes, o projeto vencedor foi o Plano Municipal de Caminhabilidade de Fortaleza, desenvolvido de 2017 a 2020, disponibilizando 8 cadernos, desde cartilha e manual técnico até metodologias e registro da participação social. É o primeiro desse tipo no país e apresentado de forma tão detalhada que apoia a ação estratégica para a caminhabilidade na cidade no médio prazo. O plano tem papel estratégico no desenvolvimento urbano da cidade, pois, segundo os dados da Pesquisa Origem-Destino (2020), cerca de 37,7% dos deslocamentos na capital cearense são realizados a pé.
Os cadernos são de: Estratégias, que apresenta a contextualização, justificativa, estruturação e objetivos do Plano; de Diagnóstico, apresentando o panorama histórico e atual da infraestrutura voltado à caminhabilidade em Fortaleza; o Manual Técnico para Calçadas, que expõe conceitos e parâmetros técnicos de acessibilidade e desenho universal, estabelecidos por legislações e normas; a Cartilha “As Calçadas que Queremos”, que busca conscientizar o cidadão de forma didática os pontos relevantes para construção e adequação de calçadas; o Caderno de Boas Práticas e Proposições, com as 97 ações estratégicas para caminhabilidade de Fortaleza; o Caderno de Financiamento, que agrega possibilidades para viabilizar financeiramente ações estratégicas de incentivo a política de caminhabilidade; o Caderno de Participação Social, que apresenta metodologias e etapas de participação social utilizadas na construção do plano; e, por fim, o Caderno de Memórias, que apresenta o histórico da construção e desenvolvimento do plano.
O material, que foi produzido simultaneamente a uma sequência de intervenções locais pela caminhabilidade (acalmamento de tráfego, rotas escolares, ações de urbanismo tático), tem linguagem didática para se comunicar diretamente com os moradores e tem como objetivo não só executar projetos no tema, mas mudar a cultura da população. Para Kaisa Santos, jurada da premiação, é importante que o PMCFor coloca em destaque e de forma pedagógica as questões de acessibilidade, e ressalta a importância de entender e pensar a inclusão por meio da caminhabilidade.
A Analista de Desenvolvimento Institucional do SampaPé!, Louise Uchôa, observa que a realização do plano parte da Secretaria do Urbanismo e Meio Ambiente e conta com participação social estruturada e documentada, o que para ela “implica em uma visão de cidade mais humana e que busca reverter a lógica do pensar a cidade a partir do tráfego de veículos automotores”.
Segundo Meli Malatesta, jurada da premiação, pensar a mobilidade a pé em grandes cidades, que já tem um urbanismo consolidado, é um grande desafio e muitas vezes resulta em ações locais e descontínuas. Um Plano dedicado à mobilidade a pé é um passo inovador e um marco nacional importante para mudar a forma de se fazer cidades.
Publicado originalmente em SampaPé em 6 de agosto de 2021.
Sua ajuda é importante para nossas cidades. Seja um apoiador do Caos Planejado.
Somos um projeto sem fins lucrativos com o objetivo de trazer o debate qualificado sobre urbanismo e cidades para um público abrangente. Assim, acreditamos que todo conteúdo que produzimos deve ser gratuito e acessível para todos.
Em um momento de crise para publicações que priorizam a qualidade da informação, contamos com a sua ajuda para continuar produzindo conteúdos independentes, livres de vieses políticos ou interesses comerciais.
Gosta do nosso trabalho? Seja um apoiador do Caos Planejado e nos ajude a levar este debate a um número ainda maior de pessoas e a promover cidades mais acessíveis, humanas, diversas e dinâmicas.
O Plano de Preservação do Conjunto Urbanístico de Brasília (PPCUB) propõe a flexibilização de algumas limitações impostas no tombamento da cidade. Afinal, isso é positivo ou negativo para Brasília?
Dados mostram que o uso em massa do automóvel prejudica as pessoas e o meio ambiente de diversas formas. A gestão urbana precisa levar isso em consideração.
Dificuldade de conciliação entre interesses públicos e privados gera gasto desnecessário de energia dos envolvidos e cobra da cidade de São Paulo um preço altíssimo em termos de desenvolvimento urbano.
A maioria das 20 cidades de crescimento mais rápido na América Latina e no Caribe entre os anos 2000 e 2020 são cidades pequenas. Mas, usando outra métrica, do maior aumento anual em sua população, as 20 principais são principalmente cidades grandes - 9 delas são capitais nacionais.
O urbanismo segregacionista do apartheid sul-africano evidencia o impacto duradouro do planejamento urbano, destacando a importância de considerar cuidadosamente o design urbano para evitar efeitos prejudiciais a longo prazo.
Medellín passou de uma cidade marcada pela violência e pelo tráfico de drogas para um exemplo global de transformação urbana e social, destacando-se com projetos inovadores que combinam intervenções físicas, sociais e institucionais para melhorar a qualidade de vida.
COMENTÁRIOS