Podcast #93 | Arq.Futuro e prioridades para as cidades brasileiras
Confira nossa conversa com Tomas Alvim sobre o Laboratório Arq.Futuro de Cidades e as prioridades para as cidades brasileiras.
Edifícios de uso misto (agregando atividades comerciais e residenciais no mesmo terreno) são uma tendência mundial para tornar cidades mais acessíveis e cidadãos menos dependentes do automóvel, encurtando distâncias ao aproximar as atividades.
1 de fevereiro de 2013Esse blog já comentou sobre zoneamento de atividades de bairros em outras postagens: a proibição de existir edifícios comerciais e residenciais no mesmo bairro, aumentando distâncias entre as atividades, gerando mais trânsito e prejudicando ainda mais quem anda a pé pela falta de atividade nas calçadas. No entanto, também é difícil vermos edifícios de uso misto sendo construídos nos últimos anos.
Só recentemente o mercado imobiliário tem experienciado uma “moda” para construir mais desta tipologia, seguindo uma tendência mundial em urbanismo para tornar os cidadãos menos dependentes de automóveis. Os benefícios são claros: a possibilidade de morar e trabalhar sem sair do prédio, diminuindo gastos em tempo, energia, trânsito e emissão de poluentes. Além disso, se mais prédios forem de uso misto a tendência é, com o tempo, os bairros também se tornarem mistos.
Entretanto, minha recente experiência como arquiteto me ensinou que o motivo para os poucos edifícios deste tipo vai além da falta de atração imobiliária. Em São Paulo, por exemplo, a legislação que disciplina o uso do solo diz o seguinte:
“Art. 189. São consideradas áreas não computáveis para efeito do cálculo do coeficiente de aproveitamento: (Ver LM 14.044/05)
III. Área do pavimento térreo em pilotis, quando desembaraçado de qualquer vedação a não ser a das caixas de escadas, elevadores e controle de acesso, limitada a 30% (trinta por cento) da área do pavimento;”
Ou seja, se apenas acessos de elevadores, escadarias e portaria forem construídos no pavimento térreo (nível menos atraente para unidades residenciais), a área do térreo não será contabilizada no limite de área que um incorporador pode construir no terreno. Apesar de comércio no térreo ser uma possibilidade, estes edifícios (principalmente os altos) devem obedecer recuos laterais e frontais, que desvalorizam muitos dos benefícios de uma loja térrea — o fácil acesso e visibilidade da calçada e por pedestres.
Como todo terreno possui um limite de área construída determinado pela prefeitura, construtores decidem optar pela alternativa mais valorizada pelos seus consumidores, livrando o térreo e, como resultado, desperdiçando na soma centenas de milhares de metros quadrados de área térrea comercial em pontos nobres.
Apesar de apenas tangenciar a questão do comércio no térreo, outra legislação que dificulta muito a existência de edifícios que compartilham uso é a obrigatoriedade de ter acessos, portarias e circulações (inclusive escadas e elevadores) independentes para cada uso. Em São Paulo uma lei de 1999 diz o seguinte:
“1- Para a implantação de diversos usos em uma mesma edificação caracterizando o uso misto, cada atividade deverá ser projetada de forma a permitir o seu funcionamento de modo independente dos demais usos a serem instalados;
2- O acesso à parte da edificação destinada a uma atividade não poderá ser efetuado pelo interior dos compartimentos destinados a um outro uso;”
Fica claro que a lei determina uma uma duplicidade de infraestrutural predial desnecessária e totalmente antieconômica, desincentivando muitos construtores a tomarem este caminho com o projeto, já que para um cobrar preço competitivo por unidades de um edifício misto seria muito mais difícil de obter um resultado financeiro positivo. Em 2011 este tema foi matéria de reportagem no Estadão, que com o título “Empreendimentos mistos são nova tendência em SP“, termina com o seguinte parágrafo:
“Apesar do sucesso de vendas, este não é um empreendimento fácil de viabilizar. Para especialistas, ele demanda terrenos grandes, e o plano diretor é demasiadamente restritivo. “É uma legislação anacrônica que deve ser mudada”, reclama Crestana [presidente do Sindicato da Habitação de São Paulo (Secovi-SP)]”
Em maioria das metrópoles brasileiras, o que normalmente resta são imóveis antigos, nas áreas centrais, quando estas regras ainda não tinham sido escritas ou então tinham objetivos diferentes. Segundo matéria da Gazeta do Povo, em Curitiba:
“A região central é ideal para receber esse tipo de empreendimento, pois, por natureza, oferece comércio, restaurantes e opções de lazer. “Não como fugir dessa região, até por causa do código de zoneamento da cidade. Isso acaba inviabilizando imóveis comerciais em outras áreas”, comenta Gustavo Selig, presidente da Associação de Dirigentes das Empresas do Mercado Imobiliário no Paraná (Ademi-PR).”
Ou seja, apesar de um recente aumento de demanda de imóveis deste tipo, incorporadores sofrem com a sua aprovação nas prefeituras que seguem códigos de zoneamento e computação de áreas totalmente atrasado.
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