Quais são as cidades brasileiras com moradia mais acessível?
Imagem: Jaime Spaniol/Unsplash.

Quais são as cidades brasileiras com moradia mais acessível?

A partir de pesquisas, observamos que as cidades brasileiras apresentam um cenário preocupante na sua acessibilidade à moradia. Saiba mais no artigo.

15 de abril de 2019

No livro “Order Without Design”, Alain Bertaud menciona que indicadores são importantes na gestão urbana para que a cidade tenha uma visualização em tempo real do que está acontecendo com a cidade. Um indicador interessante relacionado à acessibilidade da moradia é o chamado “Price/Income Ratio”, ou “Razão Preço/Renda”.

É, basicamente, a divisão entre o preço médio de um imóvel na cidade e a renda média de um morador. Ele é um indicador bastante genérico, não levando em consideração as diferenças entre imóveis, como a sua localização, nem aborda imóveis de aluguel (ainda uma minoria no Brasil), mas dá uma noção geral sobre a acessibilidade à moradia em uma cidade.

A acessibilidade à moradia no Brasil normalmente é medida pelo déficit habitacional, índice publicado normalmente pela Fundação João Pinheiro. No entanto, os números divulgados medem somente a quantidade de moradias que são precárias, que possuem coabitação, que enfrentam ônus excessivo de aluguel ou onde há adensamento excessivo.

É difícil saber, olhando apenas para os números do déficit habitacional, o quanto uma cidade é mais ou menos cara para se morar em relação à outras, e a Razão Preço/Renda pode nos dar uma direção em relação a isso.

No livro, Bertaud cita a pesquisa da Demographia, que analisa a Razão Preço/Renda em 92 mercados habitacionais diferentes. Neste estudo podemos ver que este indicador pode mudar significativamente entre diferentes cidades. No gráfico abaixo, por exemplo, vemos dados de áreas metropolitanas com mais de 5 milhões de habitantes.

Uma série de fatores podem influenciar neste indicador. Cidades em crescimento populacional que possuem ora restrições geográficas, ora restrições artificiais à oferta de moradia em seu planejamento urbano tendem a ter uma Razão Preço/Renda mais elevada. No entanto, cidades em crises econômicas, que apresentam uma demanda inferior por espaço, tenderão a ter indicadores mais baixos. Infelizmente, o Demographia não cobre países em desenvolvimento dado que ainda possuem uma grande quantidade de imóveis (e de empregos) informais, onde as transações não são adequadamente registradas.

Mesmo assim, é interessante ter uma ideia da Razão Preço/Renda para as transações conhecidas em grandes cidades brasileiras, utilizando, ao menos, os dados existentes de renda e de preços médios de imóveis. A metodologia que utilizei aqui é bastante simples: utilizei os dados de renda por trabalhador do IBGE e o valor médio por metro quadrado publicado pela FIPE/ZAP. Na ausência de dados sobre o tamanho médio de imóvel em cada uma dessas cidades utilizei o mesmo valor de 80 m² — certamente muito impreciso, mas algo para começar. Talvez minha abordagem seja simplista, mas achei que seria interessante escrever a respeito para, eventualmente, ver esta análise evoluindo no Brasil a partir de acadêmicos e pesquisadores profissionais.

Índice calculado através da divisão do preço médio de um imóvel na cidade pela renda média de um morador.

Os números são relevadores e, de certa forma, refletem o contexto de cada cidade, que pode indicar a validade do modelo. O Rio de Janeiro lidera a lista com uma Razão Preço/Renda de 14,89, o que talvez possa ser explicado pela severa restrição à expansão imobiliária na cidade, tanto geograficamente, como pela sua legislação: na Zona Sul, por exemplo, os limites de construção legais são inferiores aos praticados pelos prédios já construídos, tentando induzir uma oferta ainda menor que a existente. Fortaleza é a segunda colocada: a cidade teve um crescimento populacional relativamente alto e, entre as 11 cidades analisadas, tem a menor renda per capita, o que sinaliza um grande desafio de providenciar moradia a preços acessíveis na cidade.

Já Brasília, apesar de ter a região do Plano Piloto congelado para novas unidades, dependendo de cidades satélites para expansão, provavelmente teve o indicador reduzido por ter disparado a mais alta renda per capita entre as cidades analisadas. Como já mencionei em artigo anterior, Goiânia é a cidade mais acessível da lista, provavelmente por ter uma das menores restrições à construção de nova oferta de moradia do país.

Já Porto Alegre pode representar um caso à parte: apesar de ter alta renda per capita, encontra-se em uma das piores situações financeiras não apenas estaduais mas também municipais entre as capitais brasileiras e com o menor crescimento populacional entre as cidades listadas, sinalizando estagnação econômica. A capital gaúcha provavelmente fica com uma Razão Preço/Renda mais baixa devido à falta de atratividade do mercado, e não por ter ampla oferta à moradia.

Caso o indicador calculado aqui seja comparável ao estudo da Demographia, cidades brasileiras realmente apresentam um cenário preocupante na sua acessibilidade, dado que a Demographia considera acima de 5 “severamente inacessível” e “acessível” apenas abaixo de 3, valor que Atlanta, nos Estados Unidos, chega próximo de ter, com 3,1, mas que nenhuma destas grandes zonas metropolitanas analisadas possui.

Nas notícias internacionais uma série de reportagens falam sobre os altos preços de moradia de cidades como Londres ou Nova York, mas não podemos esquecer que a renda per capita nessas cidades é de cinco ou seis vezes as cidades que analisamos aqui: acessibilidade à moradia é uma condição relativa à realidade de cada cidade.

Aqueles que tiverem interesse podem acessar a planilha de dados utilizada através deste link.

Correção: A renda utilizada nesta análise não foi a renda per capita, mas a renda por trabalhador, um valor superior.

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  • Acredito que o autor do texto já saiba, mas vale a pena pontuar. Pois o tema é realmente muito importante.

    1. O Plano Piloto de Brasília não está congelado para novas unidades. Ainda existem vários terrenos vazios para serem construídos, além da flexibilização de uso que pode viabilizar mais habitações em áreas subutilizadas por conta da setorização. Já houve alguns avanços no tema da flexibilização (como a do SIG), mas outras podem vir também. A mais importante é a flexibilização das zonas centrais, em especial o Setor Comercial que já está em discussão no DF.

    2. O Plano Piloto também tem o Setor Noroeste (que provavelmente se tornará outra RA com a consolidação do bairro), que é uma das regiões que mais constroem habitação no DF. Apesar de serem habitação de alto padrão, sabemos do efeito dominó benéfico que mais imóveis isso provocam na cidade.

    3. As “cidades satélites”(termo em desuso) são na verdade Regiões Administrativas, distritos urbanos, subprefeituras ou até mesmo bairros em alguns casos. E em várias delas há boa oferta (histórica) de imóveis. Destaque para Águas Claras (região bem adensada), Taguatinga e outras próximas como Samambaia. São regiões vizinhas, e que juntas já formam uma nova centralidade no DF, mas sem as restrições do Plano Piloto. Cerca de 1,5 milhão de pessoas moram em regiões praticamente coladas a Taguatinga, que junto com Águas Claras formam um grande polo comercial, de serviços, educação e saúde.

    4. Não cabe apenas à renda de Brasília uma posição mais confortável em relação à outras metrópoles (ainda que distante do que deveria) pois sabemos que o mercado e os preços se adequam. A verdade é que Brasília construiu mais e com mais infraestrutura mesmo para pessoas mais pobres em relação à outras metrópoles, por isso a posição que está.

    Outro dado revelador é a quantidade percentual de pessoas morando em favelas nas metrópoles. Que eu lembre o índice de Brasília só não é mais baixo que o de Goiânia.

    A verdade é que o DNA modernista de Brasília não a coloca obrigatoriamente em posições piores que as demais cidade (como já vi gente tentando fazer parecer). A cidade continua viva e sendo repensada por milhões de pessoas, como qualquer outra metrópole.

    • Prezado Rafael,

      Obrigado pela leitura pelo comentário. Algumas partes do seu comentário eu realmente já tinha conhecimento, outras não.

      Quando mencionei no artigo que o Plano Piloto estava congelado para novas unidades quis retratar a quantidade ínfima de unidades permitidas a serem construídas dentro do plano, principalmente considerando a população da cidade como um todo.

      Coincidentemente, após a publicação deste artigo, iniciei uma pesquisa de quais as cidades que mais constroem moradia, que publicamos hoje no site, aqui:
      https://caosplanejado.com/quais-as-cidades-que-mais-constroem-moradia/

      Entre as cidades brasileiras estão as de maior porte que consegui dados relativamente confiáveis dos últimos anos. Confesso que não havia investigado o DF por confundir com um estado e também não encontrei dados abundantes, mas algumas informações que encontrei são relevantes.

      No setor noroeste foram construídas, em 2019, um ano de retomada, apenas 576 unidades residenciais: https://jornaldebrasilia.com.br/cidades/numero-de-lancamentos-mais-que-dobra-no-df/

      Frente à população do DF de ~3 milhões, apesar de ser um das regiões onde mais se constrói no DF é um número baixo.

      Se tentássemos um índice de unidades construídas / 1,000 habitantes considerando os últimos anos do DF chegaríamos a um valor de aproximadamente 0.7, sendo disparado o menor indicador de unidades / 1,000 habitantes da listagem de diversas cidades brasileiras e globais. Se considerássemos apenas o ano de 2019, que teve cerca de 3,500 unidades lançadas, o dobro do ano anterior e 4x o ano de 2016, esse indicador subiria para 1.1, ainda a cidade que menos se constrói unidades habitacionais comparado ao tamanho da sua população entre as cidades brasileiras do ranking.

      Os dados parecem corroborar a impressão de que área construída é um bem muito escasso em Brasília, refletindo o motivo dos altos preços nominais imobiliários da cidade (o terceiro mais alto depois de São Paulo e Rio). No entanto, conforme comentei neste artigo acima, a altíssima renda média da cidade (utilizada para compôr este índice) é o principal fator que acaba tirando Brasília da extremidade.

      O percentual da população morando em favelas no DF é realmente baixo para uma grande área urbana, mas ainda em níveis semelhantes a Florianópolis ou Curitiba e em linha com a média nacional, enquanto Goiânia realmente surpreende com menos de 1% da população morando nessas condições. Este resultado em Brasília, novamente, me parece ser não devido à qualidade da sua política habitacional, mas apesar dela, contando com a renda per capita média mais alta do país.

      Espero que estas informações adicionais tenham agregado ao nosso entendimento sobre o mercado habitacional de Brasília.

      Abraços,
      Anthony

      • Claro que agregou!! (Sempre na verdade).

        Seria muito bom que pudesse acompanhar esses dados das grandes cidades brasileiras. São importantes para que as cidades enxergarem o problema. Aqui no DF inclusive, principalmente por poder passar por uma novo período de flexibilização e expansão.

        A história do DF tem “altos e baixos” na expansão imobiliária, inclusive para a população de mais baixa renda, momentos de maior e menos oferta. Não sei se só a análise dos últimos anos é suficiente. Foi nesse sentido, o meu primeiro comentário.

        Acha que os números do ultimo ano estão completos? Não me parece pessoalmente que se construiu tão pouco no DF na última década (ainda que eu ache que esteja aquém do que deveria). Não ficou claro se você conseguiu o total do que foi construído no DF ou se o resultado dos números foi somente utilizando os novos imóveis do Noroeste.

        Sim, o Noroeste é só um bairro, jamais seria sozinho o responsável de toda a oferta, nem mesmo se consideramos apenas a oferta das classes A e B, que também se distribui por outras regiões e bairros do DF.

        Apesar das diferenças de termos (em relação a um município comum), todo o tecido urbano do DF (bem como o mercado imobiliário) funciona em conjunto, está tudo integrado, inclusive tudo sob um único governo. O que acontece no Plano Piloto afeta Águas Claras, que afeta Taguatinga, que afeta Samambaia… aliás, a real RM de Brasília ultrapassa os próprios limites do DF, chegando a quase uma dezena de municípios Goianos (o entorno imediato).

        Não querendo abusar da sua dedicação. Mas esses dados são muito valiosos para o Brasília (qualquer cidade na verdade) é importante que Brasília seja sempre considerada como um todo, (todo o DF pelo menos).

        A cidade pode passar por importantes transformações nos próximos anos (difícil dizer com essa pandemia o que vai acontecer), desde a flexibilização de setores na área tombada (possibilitando mais morarias por exemplo), venda de imóveis da União (são muitos e em áreas nobres), novos e grande empreendimentos imobiliários (dentro do tecido urbano fragmentado, conectando o já existente) e possibilidade de adensamento.

        Realmente acho que o DF deveria ser “analisado” sempre com muito mais abrangência, não é somente “a cidade moderna feita para os carros” [ponto] (Como já vi muito por aí, não tô falando deste site, em geral). A história e atual realidade é um “pouco maior” que isso, inclusive acredito que o suscetivos governos do DF foram muito mais responsáveis pelos problemas de mobilidade (e de oferta de imoveis) do que o Lúcio Costa. Muita gente quer analisar o Plano Piloto considerando apenas as características do Eixo Monumental, ou analisar todo o tecido urbano de Brasília considerando apenas o Plano Piloto, ou pior analisar Brasília com apenas o que o Lúcio Costa desenhou, ignorando as administrações da cidade ao londo das seis décadas. Isso me parece um grande problema.

        Acho (e espero) que a mentalidade de engessar tudo no DF está mudando, isso se reflete em vários documentos, diretrizes e projetos de novas urbanizações. Seria de grande ajuda poder acompanhar o DF em todos os índices.

        Você é uma enorme referência no tema (talvez a maior no país). Não to escrevendo a toa, apenas to tentando trazer novos elementos do lugar que moro (e conheço melhor) e que talvez agreguem ao seu trabalho. Sou um assíduo leitor/ ouvinte.

        Abraço.

        • Rafael,

          Concordo com você: como mencionei no artigo sobre quantidade de moradias construídas em diferentes cidades, é muito comum mercados imobiliários passarem por ciclos de expansão e retração. Por isso coloquei no índice as cidades onde consegui séries temporais mais completas, que pegam aproximadamente um ciclo inteiro, e deixei de fora as cidades com dados mais restritos.

          Os números que usei no meu último comentário são do DF como um todo. As referências podem ser encontradas nesta planilha, onde disponibilizei as referências das outras cidades pesquisadas: https://drive.google.com/file/d/17y27e7mSk-TF8reIKKNv7ZHZylVQD527/view

          Novamente, deixei o DF de fora pois não encontrei dados de uma série histórica mais abrangente. O que eu quis dizer no comentário é que, mesmo com dados limitados, comparando ano a ano (a baixa com a baixa e a alta com a alta), o DF apresenta números muito baixos de construção habitacional. Pode ser a sua impressão de que tem se construído muito, o que pode ser resultado de não ter a impressão de quanto se constroi em outras cidades (percepção relativa), ou os dados que pesquisei estão errados.

          Os dados são da CBIC e da ADEMI, que são fontes que também utilizei para analisar as outras cidades do índice. É possível não estarem completos, mas eu diria que são válidos ao comparar entre cidades brasileiras. Infelizmente em um lugar como o Brasil trabalhamos com dados esparsos, como comentei ao final do artigo sobre quantidade de moradia construída. Temos um estoque habitacional informal gigantesco que não entra em nenhum desses índices e, no meu entendimento, as prefeituras deveriam ter esses dados na “ponta da língua” e transparentes para a população. Algumas cidades (como São Paulo) consegui corroborar estes dados com o número de alvarás residenciais emitidos na cidade. Mas não consegui esse detalhamento para todas elas, dado que esses dados não estão disponíveis (ou não encontrei) para todas elas.

          Quanto à análise do DF/Brasília/Plano Piloto… me parece que a grande dificuldade (e o motivo pelo qual a análise muitas vezes se restringe aos problemas do desenho de Lúcio Costa para o Plano Piloto), é que o DF se encontra em uma situação onde o centro de empregos, que concentra tanto demanda por habitação quanto origem e destino de deslocamentos é, de fato, o Plano Piloto que, felizmente ou infelizmente, teve seu desenho considerado patrimônio histórico não apenas nacional mas mundial, dificultando ainda mais a sua transformação ao longo do tempo. Ou seja, a área do DF que mais deveria se transformar ao longo do tempo é a que hoje tem menos liberdade para se transformar. Sugiro a leitura do artigo “The costs of utopia: Brasília, Johannesburg, Moscow” do urbanista Alain Bertaud, que analisa essa distorção espacial sofrida pela cidade até hoje: https://periodicos.unb.br/index.php/paranoa/article/view/11782

          Grande abraço,
          Anthony

          • LIKE!! (Por que não temos esse botão aqui?! rs)

            A parte dos dados está muito clara aqui. Posso sugerir uma coisa?
            Existe alguns dados “chave” importantes para que se analisem das cidades? Se vocês puderem escrever sobre isso talvez fique mais fácil dos leitores colaborarem e até cobrar das administrações municipais esse tipo de transparência.

            Se eu encontrar algo nesse sentido e puder ajudar, me disponho.

            Voltando a minha “queixa” sobre as análises de Brasília. Entendo perfeitamente o papel de centralidade do Plano Piloto dentro do conjunto urbano de toda Brasília/DF e o quanto as restrições construtivas somadas à rigidez do Plano Diretor e tombamento, prejudica a cidade.

            Entendo também que Brasília e seus diversos núcleos urbanos é um conjunto de experiências urbanísticas que não se resume a isso. Cidade policêntrica, cidade jardim, cidade moderna, novo urbanismo, cidade legal/ ilegal, cidade com baixa, média e alta densidade… tudo isso pode ser encontrado por aqui.

            Minha questão é um pouco mais prática. A capital não pode esperar simplesmente que se acabe com o tombamento para que consiga superar seus problemas, ao mesmo tempo que diversas outras soluções podem ocorrer de maneira mais imediata e fácil independente do tombamento. A maior parte da cidade não é tombada, e é onde mora a maior parte das pessoas.

            Observação: você viu que o IPHAN fez o “tombamento” do “horizonte do Plano Piloto de Brasília?” Num raio que chega a 20km (ou quase) da área tombada, o IPHAN proíbe a construção a partir uma certa altura sem sua análise.

            E como esse discussão conflita muitas idéias diferentes e interesses, podemos ver absurdos como moradores que se reúnem para barrar a construção de novas moradias dentro da área tombada por mais que o plano original e o plano diretor permita, ou mesmo um juiz que há poucos anos proibiu a construção de novos prédios altos em Águas Claras por causa do trânsito alegando que o problema da cidade estava nos prédios altos.

            Acredito que as análises de toda Brasília devam ser sempre claras e oferecer elementos para que a sociedade, os urbanistas e as organizações dialoguem de maneira mais honesta. Se os números são ruins ou bons (ainda que seja em comparação à outras cidades), que sejam reconhecidos como tal, “doa a quem doer” o importante é a verdade dos dados. Por isso a minha preocupação em se considerar sempre os números totais do DF.

            No meio dessa diversidade de “bairros” construídos no DF a população tem tido dificuldades de entender quais são os pontos positivos e negativos de cada urbanização. E quando se discute a cidade, foca-se muito nas características do Eixo Monumental (onde uma minoria de fato circula) ou nas críticas ao Plano Piloto onde continua sendo um lugar de interesse, onde quem pode gosta de morar e das praticidades de morar na região.

            Pra muita gente é difícil entender que um lugar “bom de morar” é na verdade um dos maiores desafios da cidade. Ao mesmo tempo não se vê outra solução além de “destruir” as características desse lugar bom (o Plano Piloto).

            Mesmo dentro desse tombamento, pode-se flexibilizar (como já foi feito em algumas quadras e setores) o uso dos lotes permitindo maior dinamismo e que a cidade cresça sob demanda. Pessoalmente acredito que há muito o que fazer enquanto se discute se devemos ou não manter o tombamento a necessidade das pessoas que dependem da mobilidade no DF é imediata. O que fazer enquanto isso, é o que não se discute muito.

            É claro que as leituras dos textos do caosplanejado ajudam muito e nos dão ferramentas para analisar a cidade.

            Obrigado pela indicação de leitura. Um grande abraço.
            (Desculpa qualquer coisa pelo desvio do tema)

          • Obrigado, Rafael!

            Existem alguns indicadores interessantes para serem acompanhados, embora cada cidade deve ter indicadores mais ou menos pertinentes/urgentes dada a sua realidade. Publicamos alguns deles no Guia de Gestão Urbana: https://caosplanejado.com/indicadores-para-gestao-urbana-guia-de-gestao-urbana-2/

            Entendo o seu questionamento sobre Brasília, e realmente não vejo uma resposta muito clara, pois certamente dependerá da vontade dos próprios moradores de Brasília. É possível, por exemplo, fazer um paralelo com a cidade de Paris: apesar de suas imensas qualidades, a cidade sofre hoje com uma dificuldade de se transformar, com um centro histórico extremamente atraente (não apenas por empregos mas também por turismo) versus periferias que foram desenvolvidas, muitas vezes, nos mesmos moldes modernistas que orientaram Brasília. O paralelo é que raramente um parisiense gostaria de ver esse centro histórico transformado, mesmo que seja uma barreira ao desenvolvimento da cidade, que parece ser um caso parecido com Brasília. A resposta, assim, fica ainda mais difícil.

            É evidente que as restrições do IPHAN, como você comentou, tem exageros. Se é o caso que existe, além de tudo, este raio de 20km (desconheço a legislação), a própria regra seria inócua, dado que a transformação já ocorreu nesse raio. No meu entendimento a legislação deve, pelo menos minimamente, se embasar na cidade de fato (não imagino que o IPHAN sugira a demolição das construções estabelecidas neste entorno, assim como nem mesmo JK ordenou a demolição de Taguatinga nas primeiras ocupações). Esse entendimento, pelo menos, deveria ser ultrapassado pelos gestores da cidade.

            Paris conseguiu algum sucesso com o desenvolvimento da região de La Défense: sabendo que a dificuldade de transformação era uma barreira, permitiu o desenvolvimento de um novo centro com relativo fácil acesso da população. Talvez Águas Claras já seja um exemplo nesse sentido, mas em uma escala ainda muito pequena pensando no Distrito Federal como um todo.

            Enfim, acho razoável a intenção daqueles que visam este tombamento. No entanto, devem estar cientes das inúmeras consequências negativas que acarretará para a cidade no longo prazo. O que não é razoável, ao meu ver, é defender tanto o tombamento do Plano Piloto como defender, simultaneamente, um discurso pregando uma cidade mais inclusiva, com melhores opções de mobilidade, com mais eficiência na gestão de sua infraestrutura, com dinamismo. No caso de Brasília, me parece que os discursos infelizmente não coincidem.

            Grande abraço,
            Anthony

  • Estudo interessante. Sobre acessibilidade de moradia observo que os aluguéis em Porto Alegre não tiveram aumento significativo em dois anos. Meus dados são apenas de percepção pessoal, a partir de comparação entre um apartamento que aluguei há 2anos e as ofertas atuais na mesma região. Não sei se minha visão está correta, não pesquisei, apenas avaliei imóveis alugados por pessoas conhecidas.

    • Oi Angela, sua visão está correta sim. O aluguel em várias cidades brasileiras ficou estagnado em preços nominais tanto em virtude do ciclo de baixa do mercado imobiliário tanto relacionado à crise econômica no Brasil. Apenas no final do ano passado e este ano o mercado imobiliário parece mostrar sinais de aquecimento novamente, com possibilidade de aumento de preços. Abraços e obrigado pela leitura!

  • Muito interessante!
    Calculei a média de Preço e Renda para essas cidades e notei que apenas em Belo Horizonte, Curitiba e Porto Alegre não há a conjugação de Preço e Renda ou acima ou abaixo da média. Belo Horizonte apresenta situação pior, pois apresenta Preço acima da média e Renda abaixo. Já Curitiba e Porto Alegre apresentam Preço abaixo da média e Renda acima da média…

  • Legal Anthony, obrigado por compartilhar! Me pergunto se não teria como decompor essa renda para dar uma normalizada nesses outliers como Brasília.

    E ah, finalmente chegou o meu Order Without Desing, mal comecei e já estou amando. Valeu pela dica também!

    • Oi Arthur, obrigado pela leitura! Certamente poderia ser detalhado em vários níveis, coloquei uma metodologia semelhante apenas para iniciar o debate! Abs