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Muitos atribuíram os trágicos alagamentos de Houston à “falta de planejamento urbano”, e alguns leitores pediram um posicionamento do Caos Planejado sobre o assunto.
O Furacão Harvey atingiu o estado do Texas, nos Estados Unidos, deixando um rastro de destruição por onde passou — algumas regiões receberam mais de 1.000mm de chuva em um período de quatro dias. Como efeito comparativo, isso é quase o dobro da quantidade de chuva que o estado da Califórnia recebe o ano inteiro. Em São Paulo, o mês de maior precipitação foi março de 2006, com cerca de 600mm registrados.
Nesse cenário crítico, muitos atribuíram os alagamentos em Houston, a maior cidade atingida, à “falta de planejamento urbano”, e alguns leitores pediram um posicionamento do Caos Planejado.
É preciso esclarecer que Houston é uma cidade que possui planejamento urbano e estabelece uma série de regramentos, sobre os quais já falamos em nosso site. Grande parte desses regramentos induzem o espraiamento urbano, como tamanhos mínimos (generosos) para quadras e para lotes, vagas mínimas de estacionamento, grandes perfis viários e um subsídio público significativo ao rodoviarismo focado no automóvel. Tais políticas contribuem marginalmente para a impermeabilização do solo que, neste caso, poderia prejudicar a absorção da água e intensificar desastres como este.
Não achamos adequada, no entanto, a atribuição do problema de impermeabilização do solo à falta de zoneamento de atividades, ou aos limites generosos de uso do solo em lotes privados — ambas políticas implementadas em Houston e confundidas com a lenda da “falta de planejamento”. Pelo contrário: ambas políticas agem no sentido contrário ao espraiamento e à impermeabilização do solo, pois permitem a aproximação de usos e menor ocupação urbana de área de solo para o mesmo número de pessoas.
Imagens da histórica Grande Enchente de Houston, de 1935 — indícios de que desastres como o de agora ocorreram mesmo em momentos de urbanização completamente diferentes.
Apesar disso, é preciso lembrar que Harvey deixou um rastro de destruição e de alagamentos não apenas em Houston, a maior cidade afetada, mas também em municípios rurais vizinhos repletos de áreas permeáveis, como Brookshire, Angleton, Rosenberg e Wharton, como mostram as imagens publicadas pela Mashable. Houston também possui a maior área de parques, que ajudariam na permeabilização da água, entre as 10 maiores cidades americanas. Estes talvez sejam indicadores de que, independente do tipo planejamento, a área permeável teria pouca contribuição na mitigação de um desastre dessas proporções.
Mike Talbott, ex-diretor do Distrito de Controle de Enchentes do Condado de Harris, que cobre a região metropolitana de Houston, afirma que mesmo se não houvesse impermeabilização do solo, e se pântanos que poderiam absorver a água tivessem sido totalmente preservados, a região teria praticamente o mesmo resultado de alagamentos, dado que a própria geografia plana leva ao acúmulo de águas. O historiador Phil Magness também nos lembra da grande enchente de Houston de 1935, que inclusive levou à criação do Distrito de Enchentes do Condado de Harris, mostrando que tais desastres ocorreram mesmo em um momento de urbanização completamente diferente.
Isso não significa, é claro, que cidades não devem investir em infraestruturas de mitigação destes desastres, como sistemas de drenagem e bacias de contenção — em texto para o Houston Cronicles, Jim Blackburn descreveu doze passos para a cidade e seus residentes lidarem o problema das enchentes na cidade. Como comentamos em nosso Guia de Gestão Urbana, gestores deveriam ter justamente o papel de investir em espaços e infraestruturas públicas adequadas para permitir o desenvolvimento sustentável das cidades de forma a convivermos com o ambiente natural, e não de impedir o próprio desenvolvimento das cidades.
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