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A urbanização crescente e o envelhecimento populacional têm colocado as cidades no centro das discussões sobre qualidade de vida, saúde pública e acessibilidade. Nesse contexto, o conceito de Design Ativo, desenvolvido inicialmente nos Estados Unidos em 2010, surge como uma estratégia para reconfigurar o ambiente urbano de forma a incentivar a prática de atividades físicas e, consequentemente, combater os desafios relacionados ao sedentarismo e às doenças crônicas não transmissíveis.
No Brasil, a necessidade de aplicar esses princípios é evidente, considerando o crescimento da população idosa, a alta taxa de urbanização e os índices alarmantes de inatividade física. Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) revelam que 15,8% dos brasileiros têm 60 anos ou mais, proporção que ultrapassará o número de crianças e adolescentes de 0 a 14 anos até 2030. Além disso, 87,4% da população reside em áreas urbanas, onde seis em cada dez brasileiros não atingem os níveis mínimos de atividade física recomendados pela Organização Mundial da Saúde (OMS), entre 150 a 300 minutos de atividade aeróbica moderada a vigorosa por semana. Tal cenário acentua os riscos de mortalidade precoce e a incidência de doenças como diabetes, obesidade e depressão, gerando impactos significativos na saúde pública e na produtividade.
O Design Ativo propõe facilitar o movimento humano no cotidiano, promovendo saúde física, mental e social. Para isso, diretrizes como as elaboradas no documento Active Design Guidelines: Promoting Physical Activity and Health in Design, da cidade de Nova York, servem de referência na criação de ruas, edificações e espaços urbanos acessíveis e inclusivos. Além disso, o documento converge com as diretrizes da Política Nacional de Mobilidade Urbana e do Ministério das Cidades, que enfatizam tanto os transportes públicos quanto os deslocamentos ativos.
Os principais pilares dessa abordagem incluem:
1. Organização espacial e transporte vertical
A configuração do espaço urbano e dos edifícios desempenha papel crucial na promoção de deslocamentos dinâmicos. O posicionamento central e atraente de escadas e rampas incentiva seu uso, enquanto elevadores e escadas rolantes são relegados a posições secundárias, preservando a acessibilidade para aqueles com necessidades específicas. Esses elementos devem incorporar rampas suaves, pisos antiderrapantes e sinalização tátil, garantindo segurança e equidade.
No contexto brasileiro, Fortaleza se destaca como referência em iniciativas de mobilidade urbana alinhadas aos princípios do Design Ativo. Entre 2012 e 2024, a infraestrutura cicloviária da cidade apresentou um crescimento expressivo de 529%, totalizando 427,9 km de ciclovias, ciclofaixas, ciclorrotas ou passeios compartilhados distribuídos pelas diversas regionais da capital. Segundo o Instituto de Políticas de Transporte e Desenvolvimento (ITDP Brasil), Fortaleza lidera entre as capitais brasileiras no índice de proximidade da população às infraestruturas cicloviárias, com 51% dos habitantes residindo a menos de 300 metros de alguma via ciclável.
Ciclovia em Fortaleza. Foto: Mariana Gil/WRI Cidades Sustentáveis
A redução de limites de velocidade nas vias e o fortalecimento de espaços exclusivos para pedestres também tornam o ambiente urbano mais seguro e convidativo, levando em consideração que os sinistros de trânsitos no país foram de 29.435 mil, resultando em 85.549 mil pessoas envolvidas e 2.906 mil mortes nas rodovias federais de janeiro a junho de 2024.
2. Iluminação e qualidade sensorial
A iluminação desempenha um papel crucial na funcionalidade e na qualidade dos espaços urbanos. A luz natural, frequentemente integrada a elementos biofílicos – como áreas verdes e jardins –, não apenas orienta o deslocamento, mas também contribui significativamente para o bem-estar psicológico dos usuários. Em ambientes internos, como metrôs, a presença de iluminação adequada em corredores e escadas os torna mais atrativos e seguros, incentivando sua utilização.
Infraestruturas complementares, como bicicletários e bebedouros estrategicamente posicionados, desempenham um papel importante na promoção de hábitos ativos. Essas intervenções, quando incorporadas ao planejamento urbano, qualificam a experiência dos pedestres e ciclistas, incentivando um número maior de pessoas a adotar práticas saudáveis, como caminhar ou pedalar. Além disso, o conforto acústico e visual são essenciais para aprimorar a experiência urbana e promover uma utilização contínua dos espaços.
3. Mobiliário e espaços de convivência
O mobiliário urbano, além de sua função básica, atua como ferramenta de incentivo ao movimento e à interação social. Bancos dispostos em parques e praças, por exemplo, promovem encontros e fortalecem a coesão comunitária. Áreas de descanso distribuídas em longos percursos favorecem a circulação ativa e ampliam a acessibilidade.
Calçada com bancos em uma rua de Fortaleza. Foto: Mariana Gil/WRI Cidades Sustentáveis
4. Conforto térmico e qualidade do ar
O controle do microclima urbano também é necessário para criar condições adequadas ao movimento. Em ambientes externos, soluções como arborização e fachadas verdes ajudam a mitigar o calor e melhorar a qualidade do ar. Estudos indicam que um aumento de 30% na cobertura arbórea pode reduzir a temperatura local em até 0,4°C.
Pesquisas realizadas por Paulo Saldiva indicam que apenas 1h de exposição ao trânsito em São Paulo equivale à inalação de poluentes comparável ao consumo de cinco cigarros. Essa realidade expõe a necessidade de priorizar estratégias que reduzam as emissões de veículos motorizados, como o fortalecimento do transporte público e a promoção de modais ativos.
5. Aprendizagem e desenvolvimento cognitivo
A conexão entre atividade física e funções cognitivas destaca a relevância do Design Ativo na construção de uma urbanidade que fomenta tanto o movimento quanto o aprendizado contínuo. Evidências científicas demonstram que exercícios espontâneos aprimoram processos atencionais, memorização e retenção de informações, especialmente em ambientes arborizados ao ar livre. Pesquisas reiteram esses achados, indicando que a prática regular de atividades físicas ao longo da vida está associada ao fortalecimento da reserva cognitiva e à redução do risco de demências, como a Doença de Alzheimer, em idades avançadas. Assim, os ambientes urbanos transformam-se em catalisadores de estímulos cognitivos e interações sociais, capazes de promover criatividade, exploração e qualidade de vida em todas as idades.
O Design Ativo redefine as cidades ao transcender a funcionalidade tradicional, integrando movimento, saúde e inclusão de maneira articulada e sustentável. Ao combinar estética, acessibilidade e estratégias ambientalmente responsáveis, essa abordagem posiciona o espaço urbano como um catalisador de transformação social e melhoria da qualidade de vida. No contexto brasileiro, onde o envelhecimento populacional e o sedentarismo se apresentam como desafios críticos, a adoção desses princípios promove não apenas o bem-estar físico e mental, mas também a construção de um futuro urbano mais inclusivo, dinâmico e equitativo.
É fundamental reconhecer, entretanto, que cada cidade possui demandas específicas, contextos estruturais distintos e escalas variadas. Nesse sentido, atualizações das diretrizes urbanísticas, aprimoramentos nos processos de concepção, execução e manutenção de infraestruturas, além da ampliação de intervenções de Design Ativo adaptadas às necessidades locais, são imprescindíveis para garantir a efetividade e a resiliência dessas iniciativas.
Ciro Férrer Herbster Albuquerque é arquiteto e urbanista, pós-graduado em Neurociência, Gerontologia e Neuroarquitetura. É mestrando no Programa de Arquitetura, Urbanismo e Design, Linha de Pesquisa de Planejamento Urbano e Direito à Cidade, do PPGAU+D, na Universidade Federal do Ceará (UFC).
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