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Os famosos edifícios Burj Khalifa (Dubai, Emirados Árabes), Merdeka 118 (Kuala Lumpur, Malásia) e Shanghai Tower (Xangai, China) são exemplos de que a escassez de terrenos urbanos pode ser superada a partir da verticalização. Nesses casos, as limitações geográficas foram superadas com a tecnologia. Assim, é evidente que a disponibilidade de terrenos edificáveis na cidade não restringe a oferta de unidades habitacionais, desde que as moradias possam ser construídas com a densidade necessária para atender a demanda. A regulação do uso do solo impacta diretamente nisso.
Shanghai Tower (edifício mais alto), na China. Foto: ronghualu/Flickr
A crescente discussão sobre o tema está associada à restrição da oferta, que implica em elevação de custos e inflação de preços das moradias. Envolve também questões associadas ao deslocamento casa-trabalho, expansão da cidade e custos da máquina pública para provisão de bens públicos. Por outro lado, a regulação desenha limites e direciona o desenvolvimento com fins de planejamento sustentável (ambiental, social e econômico), controle do crescimento urbano, preservação do patrimônio cultural etc.
Do ponto de vista econômico, a regulação é uma solução às falhas de mercado. Os instrumentos que emanam do legislativo e agências reguladoras visam corrigir externalidades negativas, ou seja, proteger terceiros dos possíveis efeitos colaterais negativos da produção. Esse é o racional na Ciência Econômica. Porém, ao descer os andares da torre de marfim que habitam os economistas e sair para o mundo da rua, as coisas ganham outros contornos e distorções, e capturas são a regra, não a exceção.
No caso da regulação do uso do solo e da construção imobiliária, sobram instrumentos reguladores. Os objetivos nem sempre são corrigir externalidades, muitas vezes visam a arrecadação e/ou a contenção do crescimento dos gastos fruto da expansão das cidades. A cesta de instrumentos reguladores encarece o desenvolvimento imobiliário e da infraestrutura, drena a competitividade dos municípios e pouco coopera com o combate do déficit habitacional.
Algumas regulações também são capazes de ampliar a riqueza de quem possui ativos imobiliários, em virtude da escassez de terrenos e alta demanda. Elas também excluem pobres e minorias de determinados locais. Em São Paulo, o zoneamento dos Jardins é um dos exemplos de exclusão, pois impede que mais pessoas morem na área privilegiada. Não é privilégio apenas de bairros da capital paulista, há vasta evidência na literatura especializada que expõe o caráter homogeneizador e excludente da regulação do uso do solo.
Bairro dos Jardins à frente com edifícios altos atrás. Foto: Wikimedia Commons
Em geral, economistas urbanos interessados no tema encontram evidências de maior restrição ao mercado imobiliário em comunidades mais ricas, com preços dos imóveis mais elevados e população mais educada. Considerando que o código de obras está associado à qualidade do desenvolvimento, a literatura aponta o instrumento como desestímulo às famílias de baixa renda. Cumprir as regras depende da classe social a que a família pertence. No caso da regulação da qualidade, trata-se de um conjunto de regras factíveis aos mais ricos.
Também há um componente político associado à regulação. Residentes desses territórios detêm capital político, capital social e poder de barganha. As agremiações e o suporte ao vereador por meio do voto e financiamento de campanha são alguns canais utilizados por grupos que compõem o NIMBY – acrônimo para Not In My Back Yard (em português, “não no meu quintal”) que rotula moradores contra o desenvolvimento do mercado imobiliário e infraestrutura em suas vizinhanças. O termo é popular também no Brasil e agrega moradores com o mesmo objetivo.
Na contramão, é preciso falar sobre a expressão política dos YIMBYs (yes in my backyards), termo também cunhado nos Estados Unidos e que tem ganhado força entre os americanos, mas não no Brasil (não estaria na hora?). Tanto a administração Trump quanto Biden tiveram focos em eliminar barreiras regulatórias ao desenvolvimento imobiliário. No campo federal, o estado do Oregon, por exemplo, aprovou legislação para eliminar o zoneamento exclusivo de habitação horizontal. O State bill (SB 827) na Califórnia limitou o poder das localidades para paralisar empreendimento residenciais verticais.
Portanto, é preciso revisitar a cesta de parâmetros regulatórios e peneirar os excessos que causam distorções no mercado. A regulação que, de fato, não é traduzida em redução de externalidades negativas e promoção do desenvolvimento urbano, gerando bem-estar social aos moradores de todas as classes, apenas contribui para o aprofundamento da desigualdade, dificuldade em ampliação da oferta de moradia, inflação dos preços dos imóveis residenciais e expansão do mercado informal de habitação.
Rodger Campos é economista e doutor em Economia pela FEA/USP, fundador e consultor da RBA Consultoria Econômica, pesquisador líder do Núcleo de Habitação, Real Estate e Regulação do Laboratório de Cidades do Insper e pesquisador associado do Núcleo de Economia Regional e Urbana da FEA/USP (NEREUS-USP).
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