Goiânia não ataca o cerne do problema na revisão do Plano Diretor

8 de março de 2023

Semanas atrás, ao escutar o podcast do Caos Planejado sobre o urbanismo de Goiânia, os entrevistados comentaram sobre o novo Plano Diretor possuir a volta da inclusão dos coeficientes de aproveitamento no intuito de controlar as densidades que vinham sendo aplicadas pelo seu plano regulador. Não vou entrar no mérito dessas decisões, mas na importância de que o cerne do problema mais uma vez não foi atacado: a dispersão das edificações em altura.

Estive em setembro de 2022 em Goiânia. O motivo da viagem foi ver de perto como é a cidade que vem se destacando no cenário nacional no quesito verticalização e mercado imobiliário. Meu interesse em conhecer a capital goiana começou quando, ao estudar os edifícios mais altos do Brasil, me deparei com o que em breve seria o arranha-céu mais alto do país, o Órion Business & Health Complex

Isso, em meados de 2018, me levantou o interesse em pesquisar o que vinha acontecendo na capital do Goiás, pois era um arranha-céu que ultrapassava os mais altos construídos em São Paulo e Balneário Camboriú, por exemplo. Ademais, a volumetria dessa edificação é de tal impacto que é praticamente a quadra em que ela está situada extrudada em 190 m de altura. 

Esse resultado volumétrico me fez questionar como era o C.A. (coeficiente de aproveitamento) e os afastamentos frontais/laterais/fundos da cidade, porque não era uma edificação repleta de recuos como estamos acostumados ver em São Paulo e nem os finos arranha-céus de Balneário Camboriú. Era, certamente, um edifício com um C.A. altíssimo e com mínimas exigências de recuos de altura.

Pois bem, de fato o Plano Diretor de Goiânia em regiões de adensamento não trabalhava com coeficientes de aproveitamento e os edifícios altos que vinham sendo construídos possuíam seus limites de construção em parâmetros volumétricos ou, até mesmo, demanda de mercado. Características tão discutidas em novas revisões de planos diretores cidades brasileiras afora.

Inclusive, essas menores restrições construtivas, analisadas em estudos, poderiam ser uma das hipóteses sobre o efeito positivo ao déficit habitacional de Goiânia. 

Minha percepção foi que mesmo a cidade conhecida por suas poucas restrições urbanísticas possui o mal da verticalização brasileira: uma verticalização que não é capaz de concentrar as edificações em altura de maneira que gere demanda para possuir comércio no térreo, uma maior caminhabilidade nas ruas e que faça com que a população deixe seu carro em casa.

Um dos motivos para essa dispersão de edifícios altos pode ser o fato de Goiânia não possuir barreiras naturais em sua área e a cidade é praticamente plana. O que induz para uma imensa quantidade de áreas e lotes vazios no seu território. Tais motivos reforçam ainda mais que a solução não é a tentativa de controle da densidade através de coeficientes de aproveitamento e, sim, o desenho urbano da cidade. 

O professor e pesquisador da UFRGS, Benamy Turkienicz comenta em “O Diálogo Desenhado: Planos Diretores e a Nova Agenda Urbana” que os planos diretores precisam deixar de olhar exclusivamente para Regras de Conformidade, ou seja, deixar de pensar o que se pode ser construído no lote privado e, sim, que modelo se quer para aquela quadra ou área da cidade. É, por exemplo, não ter exigências máxima e ter exigências mínimas para o local.

Uma inversão da lógica de como vêm sendo aplicadas as leis que ditam o que é possível construir. O resultado dessa transformação é deixarmos de ter modelos genéricos de cidades e buscarmos formas mais adaptadas ao clima, relevo, contexto para a tão almejada urbanidade que permita uma caminhabilidade agradável e menos deslocamentos de carro, para aí, sim, se usufruir da potencialidade de possuir edifícios em altura como morfologia urbana.

*Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Caos Planejado.

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