A ironia do imposto sobre apartamentos vazios
Imagem: Aditya Chinchure/Unsplash.

A ironia do imposto sobre apartamentos vazios

Acredita-se que os imóveis vazios subaproveitados limitariam a oferta imobiliária. Um imposto viria então para incentivar a ocupação. Seria essa a solução?

28 de março de 2019

Diz matéria recente da revista The Economist que a cidade de Nova York está considerando taxar apartamentos que ficam vazios na maior parte do ano, normalmente como segundo imóvel do proprietário, assim como outras cidades como Londres e Vancouver já fizeram. O CityLab reporta que a cidade de Barcelona está fazendo o mesmo, taxando apartamentos vazios em uma luta por moradia acessível. Outra matéria da Fast Company reporta que estas medidas poderiam mitigar a crise da moradia e adiciona à lista cidades como Paris, Melbourne, na Austrália, e Berkeley, na Califórnia. O racional por trás destas medidas é que as unidades, tidas ora como uma residência ocasional ora como puro patrimônio financeiro, estariam sendo subaproveitadas e, desta forma, “tirando” unidades que poderiam ser usadas no mercado habitacional. Um imposto viria como um incentivo para ocupar estas unidades, seja com aluguéis ou eventualmente para serem vendidas para moradores locais, aumentando a oferta imobiliária. Críticas muito semelhantes são direcionadas ao uso de unidades para aluguel de curta duração como através do site AirBnB: ao invés dos imóveis estarem servindo como moradia estão hospedando turistas e outras formas de ocupar o espaço menos nobres que moradores locais, que teriam mais direitos dado que, em muitos casos, inclusive pagam mais impostos no próprio município.

A sugestão de taxação pela prefeitura é, de certa forma, irônica. Está inerente às críticas aos imóveis vazios ou ao uso de unidades para AirBnB ao invés de moradia a ideia de que ao retirarmos unidades do mercado o preço tende a subir, ou seja, elas sinalizam que entendem o processo de oferta e demanda. A ironia é que, de forma geral, esse tipo de reação negativa ocorre nas cidades que mais restringem o desenvolvimento imobiliário e o consequente aumento da oferta de unidades no mercado, que contribuiria da mesma forma para balancear oferta e demanda se o problema em questão é déficit habitacional.


A ironia é que, de forma geral, esse tipo de reação negativa ocorre nas cidades que mais restringem o desenvolvimento imobiliário e o consequente aumento da oferta de unidades no mercado, que contribuiria da mesma forma para balancear oferta e demanda se o problema em questão é déficit habitacional.


O caso de Vancouver, citado pela matéria da The Economist, é talvez uma exceção, pois a cidade está em um ponto muito peculiar do seu ciclo imobiliário, além da sua posição geográfica aliada à política migratória do país. Na última década Vancouver teve um boom imobiliário dirigido principalmente por investimentos imobiliários de estrangeiros, na sua maioria chineses, que buscaram um porto seguro fora de um país ditatorial com poucas opções de investimento. A pressão momentânea aumentou preços imobiliários na cidade, mas a evidente vacância já levou os preços a atingirem padrões históricos, mostrando queda de vendas de quase 50% comparado com o mesmo período no ano passado. Ou seja, o equilíbrio da oferta e demanda em ação.

Muitos poderiam contra-argumentar que a construção de novas unidades exigiria mais transformação da cidade, e que isto seria intrinsecamente ruim por motivos estéticos e ligados à percepção urbana individual de um cidadão de sua cidade. Esta posição, além de ter um alto grau de subjetividade, acaba tendo conflitos inerentes ao objetivo de resolver o déficit habitacional em cidades com demanda crescente: ao ocupar alguns imóveis ociosos, o “problema” de transformação urbana seria apenas minimamente mitigado, já que atenderia uma parcela pequena da demanda por novas unidades e exigiria a transformação de qualquer forma no futuro próximo. É exatamente isto que ocorre, por exemplo, em Copenhagen, na Dinamarca, que apresenta uma qualidade urbana excelente, mas preços imobiliários altíssimos, em uma situação onde não há mais espaço para acomodar novos habitantes.

Aqueles que desejam atacar o cerne do déficit habitacional estão certos de olhar para o equilíbrio entre oferta e demanda. No entanto, devem lembrar que a oferta não é apenas a que existe, mas também a que podemos construir.

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  • Oi, Ling, não entendi muito bem essa parte do texto: ” A pressão momentânea aumentou preços imobiliários na cidade, mas a evidente vacância já levou os preços a atingirem padrões históricos, mostrando queda de vendas de quase 50% comparado com o mesmo período no ano passado. Ou seja, o equilíbrio da oferta e demanda em ação.”
    Será que poderia discorrer um pouco mais sobre isso?

    • Oi Leticia, obrigado pelo comentário, posso comentar sim, peço desculpas se não fui claro. Quando me refiro à pressão momentânea da demanda estou falando do crescimento dos compradores estrangeiros, principalmente chineses, que aumentaram talvez momentaneamente a demanda por imóveis. O mercado imobiliário respondeu com aumento da oferta construindo mais unidades e, no caso, como é comum em ciclos imobiliários, construiu em demasia para atender aquela demanda, gerando vacância. A vacância, por sua vez, leva à queda de preços e, assim, a diminuição da vacância com o tempo. Como ele é um mercado relativamente inelástico esses processos levam algum tempo, e não me parece razoável olhar para uma fotografia durante um momento do ciclo e acreditar que aquele estado é o resultado permanente do mercado.

      Espero que tenha ficado mais claro, e fico a disposição. Abs!

  • Na verdade, tudo o mais constante, o preço tende a subir para os interessados em apartamentos para estadia transitória, e diminuir para aqueles que se interessam por moradia permanente. O subentendido aqui é que o morador permanente é mais valioso para um bairro e uma cidade que alguém que esteja somente de passagem, pois contribui com aquelas “externalidades” de que tanto fala a Jacobs: dá vida, segurança, cria redes (capital social), tudo o que um apartamento vazio não faz.

  • A ironia certamente é presente, afinal o entendimento das forças de mercado é limitado por filtros ideológicos e o marketing politico. Mas fiquei curioso é sobre a efetividade dessas taxas, que me lembra o imposto progressivo em imóveis sub utilizados em São Paulo, pois até hoje não vi estudos que atestem ou desproveem o efeito dessas taxas, e efeitos colaterais possíveis.

    • Caio a prefeitura de São Paulo avançou até que bem na notificação de imóveis edificados ociosos (550 mil m2 de área construída)entre 2014 e 2016 mas pouco na progressividade no tempo do IPTU. Não há, a meu ver, escala para aferir os resultados, mm pq a