Tipos de atividades e qualidade do espaço público | Parte 2

20 de junho de 2025

O gráfico do Jan Gehl e as atividades opcionais e sociais

Na última coluna falei deste gráfico que Jan Gehl apresenta na página 11 do “Life between buildings” (Vida entre edifícios, 1971) e discorri sobre as atividades necessárias. Agora vou falar das outras atividades que, segundo ele, podemos desempenhar ao ar livre, relacionando-as à qualidade do espaço público que as acolhe.

Começando pelas atividades opcionais (aquelas que a gente escolhe fazer), veremos que, no gráfico, a circunferência que representa a relação entre elas e um espaço público de má qualidade é praticamente um ponto. Faz sentido. Se você se encontrar por alguma razão num lugar caído, esquisito, sem sombra, sem acessibilidade, sem ter onde sentar, sem nada para fazer, delimitado por muros, dominado por carros etc., a sua tendência é escolher não estar lá, não o usar além do estritamente necessário, sair correndo. Portanto, é natural que, num espaço assim, a quantidade/duração de atividades opcionais esteja perto de zero.

(Não raro, é nesses lugares caídos, onde não costuma ficar ninguém, que indivíduos ou grupos que desejam desenvolver atividades as quais não querem que sejam vistas, ou durante as quais não desejam ser incomodados, começam a se instalar. Esse fator pode nos fazer evitar o lugar ainda mais, num círculo vicioso. Nessa situação, é comum ouvir a afirmação de que não usamos o espaço por causa da presença dessas pessoas, mas isso quase nunca corresponde à verdade: já não usávamos o lugar antes).

Mas e se o espaço público for bonito, confortável, interessante, acessível? Pode ser que, mesmo na correria do cotidiano, tenhamos um tempo para nos demorar lá mais do que o necessário. E pode ser até que, ao passar por ele, pensemos que ele seria um bom destino para o fim de semana, voltemos num sábado ou domingo para desfrutá-lo e convidemos outras pessoas para ir conosco.

O que acontece, então, com o pontinho das atividades opcionais num espaço público de boa qualidade? Aumenta muitíssimo e vira a maior circunferência de todas. As atividades opcionais são desempenhadas em profusão por várias pessoas e podem ser até mais diversas e numerosas que o desenho do lugar poderia prever. Elas também duram mais, ampliando a copresença.

Passando agora às atividades sociais, vemos que, no gráfico, a relação entre elas e um ambiente pobre também é representada por um ponto pequeno. Isso porque, logicamente, quanto menos gente no espaço público, menos gente tem para interagir: menos copresença, menos urbanidade. Além disso, quanto mais mal qualificado e estranho o lugar em que estivermos, menos disposição teremos para conversar, menos abertos ao outro estaremos. Nossas defesas estarão em alta.

No entanto, se estamos num lugar porque queremos, a coisa muda de figura. Aliás, a coisa muda de figura mesmo que estejamos nele por força de alguma atividade necessária, quando vemos que ele nos oferece um ambiente saudável e digno. Mais relaxados e tranquilos nesse bom ambiente, somos até mais propensos a continuar uma conversa, a fazer contatos de diferentes ordens, até a sorrir. A circunferência que resulta da relação entre atividades sociais e boa qualidade do espaço público se amplia muito.

No fim das contas, a simplicidade constrangedora desse gráfico ajuda a mostrar como o desenho e o estado de conservação dos lugares influem no nosso comportamento. Eles não nos impedem de fazer as coisas (se eu quiser levar meu livro para ler no meio de uma passagem subterrânea deteriorada e fedida, isso será um problema meu, nada vai me deter), mas que eles podem dificultar ou facilitar, ah… isso eles podem. 

*Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Caos Planejado.

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Arquiteta, professora da área de urbanismo da FAU/UnB. Adora levantamento de campo, espaços públicos e ver gente na rua. Mora em Brasília. ([email protected])
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