Um dos instrumentos urbanísticos mais usados no início do século 21 no Rio de Janeiro foi a instituição de APACs. Mas o que são as APACs? Segundo o Plano Diretor de 2011, a Área de Preservação do Patrimônio Cultural (APAC) é um conjunto de edificações de significativo interesse cultural. A ocupação e renovação dessas áreas devem ser realizadas de maneira que garantam a proteção e conservação de seu ambiente e de suas características socioespaciais, reconhecidas como importantes para a memória da cidade e para a preservação da diversidade da ocupação urbana estabelecida ao longo do tempo.
Ou seja, as APACs foram criadas para preservar, em alguns bairros da cidade do Rio de Janeiro, sua ambiência. Para isso, são listados diversos imóveis a serem tombados, preservados ou tutelados. Os imóveis tombados têm limitações para sua alteração; os preservados já são passíveis de várias modificações, desde que mantenham sua volumetria e fachada. Em alguns casos, são permitidas novas edificações no mesmo lote que os imóveis preservados. Existem também os imóveis tutelados: esses podem ser demolidos, mas as novas edificações devem respeitar alturas determinadas pelo decreto que estabeleceu a APAC.
Isso fez com que vários imóveis permanecessem intactos nesses últimos anos. No entanto, com a retomada do mercado imobiliário e a pouca oferta de terrenos vazios na zona sul da cidade, os imóveis preservados pelas APACs passaram a ser transformados para novos empreendimentos. Mas que tipo de transformação é essa? Será que é válido manter as APACs nesse caminho?
É preciso refletir quanto à tão falada “cidade compacta”. Se é consenso entre os urbanistas que devemos adensar mais as áreas dotadas de infraestrutura, por que bairros como Ipanema, Leblon e Catete, que possuem APACs e estão limitados em seu adensamento, não têm parâmetros que permitam mais densidade?
No Leblon, por exemplo, sua APAC foi instituída em 2001. Desde então, o bairro está no foco das novas construções imobiliárias. Diversos imóveis preservados estão sendo objeto de transformação, conforme texto que escrevi em julho de 2023. Porém, o que ocorre nesses imóveis preservados é a total remodelagem de seus interiores, ficando somente as fachadas dos edifícios. Mesmo assim, as fachadas sofrem diversas alterações para se adaptarem às questões técnicas, como a instalação de esquadrias em alumínio e grelhas para renovação de ar dos compartimentos.
Temos uma tendência na cidade de querer preservar tudo que é antigo ou até mesmo a tal “ambiência” que nos remete a tempos que não existem mais. Reconheço que edifícios de valor histórico devem ser tombados, mas não devemos preservar tudo que é antigo. Quanto à ambiência, isso podemos garantir, como dito, com a determinação de parâmetros que assegurem isso.
Ora, se queremos preservar a ambiência do bairro, por que manter edifícios sem valor histórico algum? Por que não alteramos, então, os parâmetros das novas edificações e permitimos sua demolição? Deveríamos criar mais áreas tuteladas do que preservadas. Com isso, podemos limitar questões como afastamentos e altura da edificação, mantendo a ambiência das APACs e permitindo que as novas edificações sejam construídas com técnicas mais atuais.
*Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Caos Planejado.