É agradável caminhar pelas ruas de Capão da Canoa

7 de fevereiro de 2024

Vou aproveitar que é verão, estação em que milhões de pessoas saem de férias, de suas casas rumo às praias do litoral brasileiro para falar de mais uma específica. Dessa vez, não tão famosa quanto a badalada e “criticada” Balneário Camboriú e, talvez, não tão conhecida para boa parte dos brasileiros. Todavia, para nós, gaúchos, é bastante conhecida, pois se trata da atual mais populosa cidade praiana de nosso litoral. 

Friso esse “atual”, porque muitos devem pensar que Tramandaí ou Torres como as maiores, mas não. Pelo resultado do último censo, Capão da Canoa disparou na frente da segunda colocada, Tramandaí, nos últimos doze anos.

E sobre ela, levantarei uma polêmica.

Durante anos de arquiteto, vivendo o dia-a-dia da profissão, escutei críticas em relação aos edifícios de Capão da Canoa: 

“Nossa, os prédios de Capão são muito feios!”

“Nossa, o que são aquelas bases de garagem?! Uns paredões de 2 ou 3 andares!”

“Nossa, quando melhoram aqueles embasamentos, colocam vidro espelhado!”

“Nossa, os prédios de Capão são muito próximos uns dos outros!”

De fato, todas essas críticas são verdadeiras e ocorre isso lá. A arquitetura produzida nos edifícios dos últimos 20 anos não é nada boa. Por exemplo, a arquitetura dos edifícios de Torres, ao meu ver, é altamente superior. 

Os edifícios construídos hoje em Capão são genéricos. A não ser pelo revestimento de pastilha, mal parecem edificações de praia. São prismas retangulares sem sacadas. Aliás, o que poderiam chamar de “sacada” é a área da sala toda envidraçada. 

Antigamente, sim, as edificações construídas tinham um “ar de praia”. A volumetria do edifício bordeava a quadra. Havia apartamentos térreos com varanda para rua e os demais, sacadas. As circulações de acesso às habitações ficavam pro miolo da quadra e nesse miolo, um pátio interno. Já os edifícios de hoje poderiam estar construídos em qualquer cidade.

E nesse último ponto, a polêmica: a morfologia de edifícios permitida em Capão da Canoa proporciona uma caminhabilidade agradável aos pedestres e, por consequência, agrega mais para vitalidade urbana do que as volumetrias permitidas em Porto Alegre.

Vamos lá, a morfologia permitida em ambas cidades possuem estrutura semelhante: base e torre. 

Em Capão, os edifícios são limitados pelo número de andares, até 12 pavimentos. A configuração deles é térreo, mais um embasamento de 2 pavimentos e os demais andares do edifício na “torre”. O afastamento frontal é fixo em 4 metros e, a partir 2º andar, o volume da edificação pode balançar 2 metros sobre o recuo de 4 metros, formando um pequeno beiral. O embasamento pode chegar até 10 metros nas divisas do terreno, e os recuos laterais do edifício em si, na altura máxima, ficará em torno de 7 metros entre edifícios. 

Já em Porto Alegre, o limite da altura é de 52 metros, podendo, agora, ser ultrapassado, desde que atendendo-se os critérios do Decreto de Sustentabilidade criado pela prefeitura. Em maior parte da cidade, a altura do embasamento é 4 metros, afastada da calçada em 4 metros por recuo de jardim. Os afastamentos frontais, laterais e fundo, para um edifício de 12 andares em Porto Alegre, seria em torno de 7 metros da divisa do terreno. Ou seja, entre edifícios, seriam 14 metros os separando, além de estar 7 metros afastado da calçada.

Os enormes recuos exigidos em Porto Alegre afastam os edifícios da rua e os afastam entre si. Consequentemente, afastam as pessoas, que caminham pelo local, deles. Os recuos frontais, não sendo fixos, causam um desalinhamento total das frentes dos edifícios, no espaço entre a calçada e a edificação. Ora a base está pra frente, ora recuada, ora não tem embasamento. Uma desordem total.

Em Capão da Canoa, não. A morfologia fixa na frente, permite um alinhamento constante entre os térreos, embasamentos e torres. E os poucos recuos entre edifícios permitem, também, esse contínuo visual nas ruas. Há, digamos, certa ordem. 

Salvo pouquíssimas exceções, em Porto Alegre, qualquer recuo de jardim é fechado com grades. De outro lado, em Capão, até há pequenos jardins no nível do pedestre, mas, em razão do ordenamento criado, acabam não precisando serem fechados, o que contribui para o comércio de lojas, passando uma sensação de calçadas mais largas.

Claro que há a problemática dos embasamentos serem destinados a garagens, assim como em Balneário Camboriú. Essa questão é fruto da enorme demanda de estacionamento, por não se tratar de uma cidade moradia e, sim, temporada, e também das exigências da legislação. No entanto, já há novos empreendimentos que estão colocando apartamentos nesses primeiros andares da base. Isso poderia virar tendência por lá. 

Portanto, apresentada a polêmica, convido a todos passearem por Capão da Canoa com o olhar que acabei de descrever e imaginarem Porto Alegre com essa morfologia. Sim, Capão é extremamente plana e POA, não. Ainda assim, a capital tem seus bairros planos, então, imaginem caminhando por eles com a morfologia dos edifícios de Capão da Canoa. 

Pode ser exatamente como eles são: com aquele embasamento feio para garagens. E, depois, imaginem com a pitada de lojas e vida (escritórios ou moradia) nos primeiros andares, o quanto agregaria para a vitalidade urbana de POA. Afinal, é uma morfologia genérica que poderia estar em qualquer cidade.

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