O conteúdo de uma aula magna de urbanismo, de uma forma geral, tem quase sempre o mesmo roteiro: a história das cidades e o impacto do urbanismo na vida das pessoas. Emocionante. De verdade.
Mas condensar a evolução das cidades em 20 ou 30 minutos é um desafio maior do que explicar, com clareza, sintética e objetivamente, o que realmente importa no desenvolvimento das cidades. Yuval Harari precisou de 472 páginas (em “Sapiens”) e Ben Wilson de 496 (em “Metrópole: A história das cidades, a maior invenção humana”).
Por outro lado, pode-se explicar que o urbanismo se resume a 3 pontos: densidade, presença da institucionalidade e uso misto. Se possível, fazer a explicação sem muitos floreios e sem abusar daquela terminologia técnica que apenas os “iniciados” e os “ungidos” dominam.
É explicar que a densidade é o que permite cidades compactas, e que cidades compactas têm um custo de infraestrutura menor por habitante. Que cidades densas e compactas viabilizam, pela redução do território necessário e pelo volume de consumidores, transporte público de alta capacidade, comércio e serviços amplos e, ao mesmo tempo, especializados, que promovem uma maior circulação de ideias, um maior intercâmbio de conhecimentos, exatamente as duas componentes da força motriz que provoca a inovação.
Que cidades densas e compactas podem oferecer mais segurança e mais serviços públicos de educação, saúde e lazer, dado que o volume da população concentrado viabiliza qualquer investimento público. E a intensidade de uso, somada aos “olhos da rua”, oferece a segurança, o uso real das bicicletas e o caminhar como meios de transporte “normais”.
Que uma cidade densa e compacta, quando bem dirigida, com seu desenvolvimento orientado por regras simples, claras e favoráveis à densidade, pode estar entremeada pela institucionalidade necessária, seja por eixos importantes, seja pelos edifícios públicos bem distribuídos e conectados à “vazios” para o lazer público, próximos a equipamentos culturais, criando uma sensação de bem estar, de qualidade do espaço urbano, de que a cidade é, verdadeiramente, para todos.
Que uma cidade densa, compacta e com a institucionalidade presente nos locais certos e com os “vazios” necessários, quando gerida com baixa restrição de usos, se propensa a um certo grau de espontaneidade. Quando orientada ao uso misto, produz e liberta o melhor do espírito humano, estimulando o empreendedorismo e em constante regeneração, sem vácuo, sem espaços degradados.
Nada é tão eficiente para o orçamento municipal quanto a cidade densa, compacta, com a institucionalidade presente e plena de uso misto, equação capaz de proteger a cidade até mesmo contra a mentalidade de gafanhoto (uma espécie de mentalidade de manada, com igual falta de criatividade, mas com mais poder destrutivo), que se move de bairro em bairro, esgotando cada um deles.
A verdade é que poucas áreas de conhecimento são tão acessíveis, tão simples e tão fáceis de serem compreendidas, compartilhadas e praticadas (no exercício profissional, nas gestões públicas municipais, como hobby que seja) quanto o urbanismo e suas diretrizes (densidade, presença da institucionalidade e uso misto), largamente testadas e amplamente provadas, para além de qualquer opinião ou debate.
É conhecimento com uma curva de aprendizado extremamente curta (e rápida), altamente intuitiva e disponível para arquitetos, administradores e quaisquer interessados que tenham um mínimo de curiosidade, atenção e disposição para ler (não confundir a legislação – gigante, hiperbólica, focada nas filigranas – com o conhecimento real).
Só não combina, no final do dia, com quem não é muito afeito a casos reais e teses comprovadas, e por quem combate a lógica e o bom senso. O urbanismo é território fértil para os sonhadores, mas jamais para os tolos, ou para quem enxerga o mundo pelas lentes da política e da doutrinação ideológica.
É simples, realmente simples.
*Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Caos Planejado.