Dia desses, me mandaram uma reportagem na qual exibia uma família que há mais de 100 anos residia em uma casa que atualmente está espremida por prédios, na Vila Mariana, em São Paulo. A matéria cita o conflito e a truculência do mercado, na insistência de fazer com que a família venda a casa, para assim, serem construídos mais prédios no local.
O mercado imobiliário, impulsionado pelo crescimento das cidades e das demandas habitacionais, desempenha certo papel no desenvolvimento urbano. No entanto, essa atividade econômica nem sempre é benéfica para toda a população, especialmente para aqueles com recursos financeiros limitados. À medida que o mercado imobiliário se expande, muitas vezes ocorre a expulsão de pessoas de baixa renda dos espaços urbanos, resultando em uma série de impactos negativos para a sociedade como um todo.
Uma das principais razões para essa exclusão é a gentrificação. Quando áreas urbanas são revitalizadas e valorizadas por meio de investimentos em infraestrutura e serviços, as propriedades imobiliárias nesses locais tendem a se valorizar. Essa valorização pode levar a um aumento acentuado nos preços dos imóveis e aluguéis, tornando-os inacessíveis para famílias de baixa renda que já habitam essas regiões há anos. Como resultado, essas pessoas são forçadas a deixar suas casas e comunidades, muitas vezes deslocando-se para áreas mais afastadas e com menos infraestrutura, acesso a serviços públicos e oportunidades de emprego.
Esse processo de expulsão pode gerar uma série de consequências sociais negativas. Primeiramente, a coesão social da comunidade é rompida, pois famílias e vizinhos são separados, e relações de longa data são desfeitas. Isso pode levar a um sentimento de deslocamento e isolamento, afetando o bem-estar emocional e psicológico das pessoas afetadas.
Além disso, a expulsão de pessoas de baixa renda pode intensificar a segregação socioeconômica nas cidades. As áreas urbanas que antes eram culturalmente diversificadas e inclusivas podem se tornar homogêneas em termos de classe social, dificultando a convivência harmoniosa entre diferentes grupos. Essa segregação também pode acentuar a falta de acesso a oportunidades educacionais, de saúde e de emprego para as famílias deslocadas, perpetuando o ciclo de pobreza.
Outro aspecto preocupante é o deslocamento forçado de comunidades tradicionais e históricas. Muitas vezes, bairros com rica história cultural e patrimônio são alvo da especulação imobiliária, resultando na destruição de construções e na perda de identidade cultural desses locais. A gentrificação pode dar lugar a empreendimentos modernos e elitizados, em detrimento do valor histórico e cultural da região, impactando negativamente a memória coletiva da sociedade.
Em Porto Alegre, o projeto de revitalização do 4.º Distrito, que é considerado inovador por muitos e pela gestão municipal atual, ignora a existência das comunidades que ali residem / resistem. O mercado enxerga inovação, as pessoas enxergam abandono do Estado, pois enquanto se pensa na construção de uma torre de 117 metros de altura, considerada a mais alta da cidade e elaborada de acordo com os novos parâmetros urbanísticos, quem está ao lado, dividindo a mesma porção da cidade, vive diariamente com a falta de saneamento básico, falta de coleta de lixo e inúmeros outros problemas causados pela ausência de políticas públicas eficientes.
É fundamental promover o diálogo e a participação das comunidades afetadas nas decisões sobre o futuro de seus bairros. Ouvir as vozes daqueles que serão impactados pelas mudanças urbanas é essencial para garantir que as políticas implementadas sejam mais justas e inclusivas.
É crucial reconhecer e abordar os impactos negativos que o mercado imobiliário pode gerar ao expulsar pessoas de baixa renda dos espaços urbanos. Somente por meio de políticas equitativas e da consideração dos aspectos sociais podemos construir cidades mais justas, inclusivas e sustentáveis para todos os seus habitantes.
E concluindo: não adianta ouvir o povo, mas não fazer nada de efetivo com o que ouviu.
*Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Caos Planejado.