Qual a relação entre mercado e academia

19 de novembro de 2025

No mês de setembro, durante as comemorações dos oitenta anos da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da UFRJ, participei de uma mesa intitulada “Como é esse tal de mercado?”. O objetivo era promover um debate dentro da universidade, especialmente para os alunos, sobre o que significa “mercado”. A palavra é ampla, mas entendi que a proposta era discutir a aproximação entre universidade e mercado de trabalho. É sobre isso que gostaria de refletir nesta coluna.

Uma das questões levantadas pelo professor da casa, Eduardo Horta, foi a de que, no passado, havia docentes que, além de dar aula, também comandavam grandes escritórios. Para nós, alunos, essa era a primeira aproximação prática com o “mercado”. Com as exigências atuais de dedicação exclusiva, essa realidade se distanciou das universidades públicas — e, acredito, também das privadas. De modo geral, houve um afastamento entre a academia e o setor privado, como o mercado imobiliário, por exemplo. Mas será que esse é, de fato, o modelo desejado pelas novas gerações que estão ingressando nas universidades?

Vivemos hoje um tempo em que a velocidade da produção de informações, somada ao impacto das redes sociais e da inteligência artificial, faz com que essa geração queira respostas mais rápidas. Estando eu dos dois lados — como professor e como profissional do mercado —, percebo que os jovens não se veem dispostos a esperar no mínimo cinco anos até concluir a graduação para então começar a produzir e, sobretudo, a ganhar seu próprio dinheiro.

Tenho observado também uma mudança de mentalidade: para muitos, o trabalho aparece como um meio para, em pouco tempo, fazer uma reserva financeira, parar de trabalhar e dedicar-se a experiências de vida, viajar, conhecer o mundo e desfrutar enquanto se tem vigor físico e disposição. Em certa medida, eles têm razão. A vida deve ser aproveitada enquanto temos energia. Dificilmente conseguiremos manter esses futuros profissionais por longos períodos em uma mesma empresa, desempenhando a mesma função.

Esse cenário nos impõe um desafio: como criar um ambiente acadêmico que dialogue com o mercado sem perder sua função crítica e formadora? Talvez o caminho esteja em promover experiências práticas ainda durante a graduação, por meio de estágios, projetos de extensão, incubadoras, parcerias com diferentes setores da sociedade e também pelo uso da inteligência artificial. Dessa forma, os estudantes poderiam vivenciar desde cedo a realidade profissional, sem que a universidade abdique de seu papel de reflexão e pesquisa. Além disso, é fundamental que o currículo inclua disciplinas essenciais para a prática profissional — como legislação urbanística, que infelizmente não é oferecida em nenhuma universidade do país.

Ao mesmo tempo, é preciso reconhecer que o conceito de carreira mudou. O sonho da estabilidade em um único emprego por décadas já não seduz a maioria dos jovens. Eles buscam flexibilidade, diversidade de experiências e, sobretudo, sentido no que fazem. Isso exige das empresas e instituições uma nova postura, mais aberta à inovação e a formatos de trabalho menos engessados.

Talvez a principal lição dessa nova geração seja a de nos lembrar que o trabalho é apenas uma parte da vida — importante, mas não única. A universidade e o mercado, cada um a seu modo, precisam aprender a lidar com essa realidade, oferecendo caminhos que unam formação sólida, inserção profissional e qualidade de vida. Se conseguirmos avançar nessa direção, todos sairemos ganhando: estudantes, empresas e a própria sociedade.

E para nós, que pensamos e projetamos cidades, cabe a responsabilidade de criar ambientes urbanos cada vez mais inclusivos, sustentáveis e estimulantes, capazes de acolher as novas formas de viver, trabalhar e aprender. Afinal, ao construirmos cidades melhores para os jovens de hoje, estaremos também garantindo uma vida mais rica e significativa para nós — os nem tão jovens assim.

*Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Caos Planejado.

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Arquiteto pela Universidade Federal do Rio de Janeiro-UFRJ (1991), é Mestre em Arquitetura (2010) e Doutor em Arquitetura (2014) pelo PROARQ da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da UFRJ. É professor da Universidade Veiga de Almeida e do Mestrado Profissional no Programa de Pós-graduação em Projeto e Patrimônio da UFRJ. Sócio do escritório DCArquitetura e consultor de Planejamento Urbano. Autor de quatro livros sobre as transformações urbanas da cidade do Rio de Janeiro.
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