Lançado em inglês no ano passado, o livro “A cidade de 15 minutos: uma solução para salvar nosso tempo e nosso planeta” (The 15-minute city: a solution to saving our time & our planet) chega ao Brasil neste mês de maio pela BEĨ Editora (tradução de Luis Reyes Gil), com a presença de seu autor, o franco-colombiano Carlos Moreno. Embora a concepção da “cidade de 15 minutos” seja anterior, foi durante a pandemia de COVID-19 que o conceito ganhou dimensão prática, sobretudo por meio da gestão da prefeita de Paris, Anne Hidalgo, em conjunto com um grupo de especialistas – entre eles o autor.
A proposta da “cidade de 15 minutos” é simples na teoria: garantir que todas as pessoas tenham acesso a trabalho, educação, saúde, cultura e lazer a uma curta caminhada ou pedalada de casa. Na prática, como Moreno mostra ao longo da obra, essa mudança exige mais do que vontade política – requer o envolvimento de diferentes setores e um novo olhar sobre como vivemos e nos deslocamos.
Referenciando clássicos do urbanismo, como a norte-americana Jane Jacobs (1916-2006) e o dinamarquês Jan Gehl – autor do prefácio do seu livro –, Moreno sublinha com força a centralidade do cidadão na construção de cidades mais humanas e habitáveis. Estruturada em 21 capítulos, “tanto crônicos quanto críticos”, a obra passa por uma breve contextualização da problemática urbana da contemporaneidade, herdada do funcionalismo e da ênfase dada ao automóvel. Cidades desiguais e fragmentadas, uma população que enfrenta longos deslocamentos e possui pouco ou nenhum convívio social são apenas alguns dos desafios enfocados.
O livro enfatiza que a cidade de 15 minutos não é uma utopia e sim uma prática possível – que, aliás, vem sendo implantada. Em cada caso citado, foram necessários experimentos, engajamento civil, políticas públicas e pesquisa para propor mudanças que aproximassem as pessoas do que realmente importa no cotidiano. Mais do que uma proposta urbanística, trata-se de uma mudança de paradigma: colocar a vida – e não a cidade em si – no centro do planejamento.
Embora explore temas clássicos do urbanismo como uso do solo e mobilidade, o autor dá protagonismo a palavras como “proximidade”, “comunidade” e “tempo livre”, adotando uma linguagem acessível e sensível. “Nosso objetivo não é desenvolver a cidade, e sim desenvolver a vida na cidade”, afirma Moreno, em uma declaração que resume bem a tônica da obra.
Em termos de escala, o livro também trabalha com aspectos não convencionais. Se usualmente as propostas para o planejamento urbano partem de resoluções amplas, municipais ou regionais, a exposição teórica e os exemplos trazidos pelo autor apontam em outra direção: olhar para bairros e relações policêntricas. Sem ônus ao dinamismo urbano, repensar as conexões e redistribuir ritmos e tempos, permitir encontros e garantir identidade aos lugares são algumas das peças-chave para as cidades de 15 minutos.
Com otimismo e consistência, Moreno convida o leitor a repensar seu modo de vida e a se engajar na construção de cidades mais justas e habitáveis. Assim, ler “A cidade de 15 minutos” pode ser um poderoso lembrete de que nossas urbes não são um dado – são uma escolha, uma construção coletiva, política e diária. Afinal, como a obra deixa claro, juntar cidade e proximidade, parafraseando o poeta mineiro Carlos Drummond de Andrade (1902-1987)*, não é somente uma rima, é uma solução.
* “Mundo, mundo, vasto mundo / Se eu me chamasse Raimundo / Seria uma rima, não seria uma solução / Mundo, mundo, vasto mundo / Mais vasto é meu coração.” (“Poema de sete faces’’, Alguma poesia, 1930).
Heloisa Loureiro Escudeiro
Coordenadora-adjunta do Núcleo Arquitetura e Cidade do Centro de Estudos das Cidades – Laboratório Arq.Futuro do Insper.
*Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Caos Planejado.