Planejamento e gestão da cidade integrativa: inter-relacionado e proativo
30 de agosto de 2024Tal como foi apresentado em artigo precedente, a Cidade Integrativa toma emprestado esse nome da medicina, destacando a ênfase que se pretende dar à prevenção e cuidado antecipado, além de resolver de modo integrado e proativo os desafios do crescimento (quantidade) e do desenvolvimento (qualidade) urbano.
Uma vez discutido e aprovado o Plano Diretor e seus componentes setoriais obrigatórios, o “fazer acontecer” pressupõe uma ação por meio da qual qualquer iniciativa setorial alcance também, dentro do possível, vantagens e benefícios para outras dimensões setoriais, abarcando a cidade como um todo e promovendo o bem-estar e o bem viver de seus residentes e usuários. Em Curitiba, o exemplo mais emblemático são os parques lineares ao longo dos rios que, basicamente, tratam de desacelerar o efeito enxurrada do acúmulo de águas da chuva, reduzindo ou evitando a inundação de áreas urbanizadas a jusante e no entorno desses rios, mas também criam uma expressiva rede de áreas verdes equipadas para o lazer cotidiano da população quando não chove.
Outra estratégia integrativa é a preparação das partes da cidade nas quais se pretende estimular maior densidade, de modo a viabilizar o transporte público intenso e frequente – no nosso caso, as canaletas dos ônibus expressos. No seu início, há 50 anos, algumas pessoas criticaram o investimento, que parecia exagerado para a passagem de alguns ônibus, segregando-os do tráfego geral e permitindo maior velocidade, favorecendo uma economia de tempo para quem os utilizava. Com o tempo, essa estratégia se revelou altamente custo-eficiente, porque evitou as cirurgias urbanas que teriam sido necessárias para a abertura de corredores dentro de áreas já adensadas e congestionadas. A proatividade continuou agindo na forma de uma complementação dessa infraestrutura com outras soluções do serviço de mobilidade, sempre integradas.
As duas iniciativas mencionadas acima ainda geraram mais uma proatividade dentro do conceito geral de Cidade Integrativa: a identificação territorial da cidade e o crescimento da autoestima de seus moradores, assim como a admiração de seus usuários e visitantes.
Está claro que é o ritmo do crescimento demográfico que determina a velocidade de atingimento da imagem-objetivo que ilustra o Plano Diretor e acompanha a estratégia de ocupação do solo. O alto crescimento nos anos 1970 e 1980 facilitou essa evolução, apesar dos desafios quantitativos, mas esse ritmo vem decrescendo ao longo das décadas até chegar à pífia taxa de apenas 0,1% em 12 anos no período de 2010 a 2022. Essa taxa representa quase uma estagnação da população geral, só aumentando seu envelhecimento médio, o que provoca novos desafios. Assim, ainda hoje se veem áreas vazias ou pouco adensadas ao longo daqueles eixos estruturantes da cidade, incluindo o eixo da Linha Verde, que compõe essa estruturação básica. Por mais que se estimule essa ocupação por meio de incentivos físicos que a legislação municipal propõe, se não houver crescimento demográfico adequado não há demanda, e o foco na qualidade dos serviços existentes é um desafio adicional aos gestores públicos para que a cidade integrativa continue enfatizando esse bem-estar e bem viver.
Um critério ilustrativo desse bom resultado até agora é a quantidade de famílias que se mudaram de outras capitais para Curitiba, escapando de alguns problemas urbanos alhures e reconhecendo essas qualidades, incluindo a progressiva participação de Curitiba em agendas internacionais de arte e cultura, o que deixa atrás aquele comentário precipitado de “provincianismo”.
Alberto M. R. Paranhos é economista formado pela UFPR, com estudos de doutoramento de demografia urbana na Universidade de Paris (Sorbonne) e especialização em gestão urbana no Instituto de Desenvolvimento Econômico do Banco Mundial. Trabalhou 13 anos na Diretoria do IPPUC, 5 no Banco Mundial e 17 como funcionário da ONU, na posição de Oficial Principal do ONU-Habitat para a América Latina e o Caribe até se aposentar em 2010. É consultor do Instituto Jaime Lerner.
*Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Caos Planejado.