Os acordos de cooperação e a longevidade das ações de requalificação urbana

5 de abril de 2024

A Lei Federal 13.019, de 2014, alterada pela Lei 13.204, de 2015, estabelece o regime jurídico das parcerias entre a administração pública e as organizações da sociedade civil, em regime de mútua cooperação, para a consecução de finalidades de interesse público e recíproco, mediante a execução de atividades ou de projetos previamente estabelecidos em planos de trabalho inseridos em distintas modalidades de contrato, denominadas termos de colaboração, termos de fomento e acordos de cooperação.

Nos termos de colaboração, as parcerias estabelecidas pela administração pública com organizações da sociedade civil  são propostas pela administração pública e envolvem a transferência de recursos financeiros. Nos termos de fomento, as parcerias são propostas pelas organizações da sociedade civil e também envolvem a transferência de recursos financeiros. Já nos acordos de cooperação, as parcerias estabelecidas pela administração pública com organizações da sociedade civil não envolvem a  transferência de recursos financeiros. Vale considerar que a inauguração de tais parcerias pode-se dar por meio de propostas de manifestação de interesse social – PMIS, que terão seu interesse público previamente avaliado pela Administração Pública para poderem ou não prosseguir. 

Coube e cabe aos municípios do território brasileiro regulamentarem a lei federal, permitindo sua aplicação no âmbito das demandas municipais. 

São Paulo, por meio de suas secretarias e demais órgãos municipais, vem celebrando parcerias com organizações civis, ou, em outras palavras, entidades do Terceiro Setor para uma série de projetos. Aqui vamos enfatizar aqueles firmados através de Acordos de Cooperação, relativos especificamente à matéria da Requalificação Urbana. A finalidade da requalificação urbana ainda é muito pouco explorada no âmbito deste tipo de parceria, e é neste sentido que vejo ser oportuna esta reflexão. 

As parcerias com entidades do terceiro setor são alternativas importantes e promissoras na implementação de políticas públicas num formato que, para além das entregas realizadas exclusivamente pelo Poder Público, trazem um outro formato que me parece oportuno e estratégico, admitindo-se que, neste caso, a população, através de suas organizações civis, passe a ocupar um papel não somente de usuária ou usufrutuária das infraestruturas públicas, mas também de partícipe e corresponsável por sua implementação e gestão. 

Acredito fortemente que este tipo de parceria, em longo prazo, pode representar um instrumento relevante na percepção da responsabilidade cívica das pessoas frente àquilo que se enquadra como bem público. E, neste sentido, o espaço urbano e suas oportunidades e necessidades de requalificação se encaixam perfeitamente!

A partir de uma experiência que realizamos na cidade de São Paulo, através do projeto Sua Rua, de requalificação urbana em área de aproximadamente 10mil m² nas imediações da Av. Paulista, com sua  implementação e gestão por 30 anos, parece-me bastante oportuno trazer para a reflexão este assunto, acreditando tratar-se de modelagem jurídico-urbanística concreta e promissora, visando a sustentabilidade de projetos de requalificação urbana ao redor do país. 

Entenda-se por “sustentabilidade” destes planos de trabalho de requalificação urbana o ciclo completo que pressupõe neste ato, desde a escuta, a elaboração do projeto urbano de requalificação, o plano de trabalho incluindo a modelagem jurídica, econômica, além da urbanística, o rito administrativo do licenciamento, a realização das obras até a operação e manutenção do espaço público e ainda a  interlocução continuada entre cooperante e poder público com base na prestação de contas e auditoria da qualidade desta operação. 

Este projeto inaugurou na cidade, com o uso desta modelagem jurídica, uma série de outros que começaram a se desenrolar visando novas oportunidades de requalificação de espaços urbanos. Isto é muito interessante! 

No momento, consta chamamento público de projetos de requalificação urbana em andamento, enquanto outros, como o SUA RUA, estão em fase de obras após terem percorrido todo rito inicial de desenvolvimento de projetos e respectivos licenciamentos junto aos órgãos públicos pertinentes. 

Que este modelo se mostre bem-sucedido e que se faça replicável! 

Para isto, caberá estarmos atentos aos mecanismos de diálogo entre as esferas pública e civil, ao longo do tempo, considerando inclusive e especialmente as mudanças de Administração Pública, bem como os mecanismos de escuta e auditoria sobre a qualidade das atuações, considerando as obras e a respectiva gestão dos espaços públicos. Ou seja, durante os períodos de gestão dos espaços públicos pelos cooperantes, há que se ter de forma estruturada e sólida a figura pública instituída através de órgão responsável pelas funções de bom interlocutor, de garantidor do cumprimento durante toda a vigência dos contratos firmados, da transparência na comunicação e da participação ativa em casos não previstos.

Vamos em frente trabalhar para que o amadurecimento das relações e o aprimoramento das responsabilidades e dos direitos entre as partes ocorram e permitam ser aprimorados ao longo do tempo com bom senso, rigor legal, transparência, zelo e visão a favor do interesse público! 

Saudações Polifônicas! 

*Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Caos Planejado.

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Arquiteta e urbanista pela FAUUSP, mestre pela FFLCH (Filosofia, Letras e Ciencias Humanas), membro do Conselho Municipal de Politica Urbana (CMPU) e do Conselho de Proteção da Paisagem Urbana (CPPU). Prêmio Top Imobiliário Estadão — Luis A. Pompeia — Pensador de Cidades — 2023–2025.
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