Arquiteta e urbanista, especialista em Gestão de Projetos e mestre em arquitetura pela UFRN. Atualmente é sócia da PSA Arquitetura em São Paulo e da PYPA Urbanismo & Desenvolvimento Urbano em Natal-RN. ([email protected])
O Fuori Salone, evento paralelo ao Salone del Mobile que ocupa as ruas de Milão com design, arte e arquitetura, transforma a cidade italiana em um campo fértil de experimentações urbanas. Em 2025, como em edições anteriores, o evento extrapola os limites das feiras comerciais e ressignifica o espaço público por meio de instalações temporárias que dialogam diretamente com os princípios do urbanismo tático.
O urbanismo tático — entendido como um conjunto de intervenções temporárias, de baixo custo e alto impacto que visam reconfigurar o uso do espaço urbano — encontra no Fuori Salone um terreno privilegiado. Nas ruas de Brera, Tortona, Isola ou Porta Venezia, os visitantes não apenas observam o design, mas o vivenciam, caminhando por calçadas redesenhadas, mobiliários lúdicos e ambientes inesperadamente transformados.
Um exemplo de 2025 foi a instalação Chiquita House 25, uma ocupação vibrante e sensorial da Via Borgonuovo. Em tons intensos de amarelo e azul, a intervenção propôs uma releitura tropical da rua milanesa, com áreas de convivência, mobiliários coloridos e sombreamento leve, criando um ambiente acolhedor e instigante. Por meio do uso de materiais modulares e linguagem gráfica pop, a instalação ativou o espaço como ponto de encontro e contemplação, promovendo a convivência urbana em meio ao fluxo do evento.
Outro destaque foi a instalação Prismatique, projetada por Laufen em colaboração com o estúdio Snøhetta e a Marsotto, na Via Della Spiga. A intervenção utilizou prismas de mármore travertino cortados com precisão e organizados como um pequeno pavilhão escultórico, que interagia com a luz solar ao longo do dia. A estrutura, ao mesmo tempo minimalista e monumental, conferia à rua uma atmosfera de contemplação, desacelerando o caminhar e criando uma pausa silenciosa no ritmo urbano.
Iguais a essas, centenas de intervenções acontecem em Milão na Semana de Design, e embora efêmeras, oferecem um vislumbre do potencial transformador da cidade quando se coloca o pedestre e o uso coletivo no centro do projeto urbano. A lógica do urbanismo tático, muitas vezes aplicada como ferramenta de prototipagem urbana, aqui se entrelaça com o design e a arte pública, revelando o espaço urbano como palco de experimentação sensorial e social.
O Fuori Salone também escancara uma dualidade importante: ao mesmo tempo em que democratiza o uso da cidade e convida à apropriação espontânea, corre o risco de se tornar apenas uma vitrine temporária. No entanto, quando bem articulado, o urbanismo tático — mesmo inserido num contexto comercial — revela o potencial da cidade como organismo vivo, capaz de mudar de forma para testar novas relações entre pessoas, objetos e espaços.
Em 2025, Milão mais uma vez provou que o design urbano pode (e deve) ser experimentado. E que mesmo ações transitórias, se bem pensadas, podem deixar rastros duradouros na imaginação coletiva da cidade. Eu não vejo a hora de voltar e viver tudo diferente de novo.
*Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Caos Planejado.
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