A regulamentação da reforma tributária define uma taxação extra para bens e serviços prejudiciais à saúde e ao meio ambiente, chamada de Imposto Seletivo.
Estão na lista de itens sujeitos ao novo imposto veículos, cigarros, apostas, bebidas alcoólicas e açucaradas, entre outros.
Por mais extensa que pareça a lista, não é difícil apontar itens que ficaram de fora, como armas e munições.
Em algumas das minhas provocações, cheguei a argumentar que também poderiam entrar na lista os pecados arquitetônicos e os muros dos condomínios. No caso dos muros, a justificativa estaria associada ao seu impacto negativo na segurança e vitalidade das calçadas.
É claro que se trata de uma brincadeira – até porque não há base legal para a inclusão desses itens na lista.
Antes também que me acusem de querer aumentar a carga tributária, lembro que o objetivo do Imposto Seletivo não é elevar a arrecadação, mas desestimular o consumo de bens e serviços prejudiciais.
No final do século 17, foi criado no Reino Unido um imposto sobre janelas. Como o governo não tinha acesso à renda das famílias, especialmente das mais ricas, a ideia foi criar uma alternativa para tributá-las – supondo que os mais ricos tivessem casas maiores e, portanto, mais janelas.
Os contribuintes, é claro, logo começaram a fechar as suas janelas com tijolos para pagarem menos impostos. No caso da minha provocativa proposta, a intenção é que o resultado fosse semelhante e levasse à derrubada dos muros.
Brincadeiras à parte, essa discussão não deixa de ser uma oportunidade para refletirmos sobre a importância da política tributária para as estratégias de desenvolvimento urbano.
O IPTU progressivo, por exemplo, é um instrumento com potencial para combater a ociosidade de imóveis, particularmente nas áreas da cidade mais ricas em infraestrutura, empregos e serviços.
O IPTU Verde, por sua vez, prevê descontos para quem adotar medidas sustentáveis como captação e reuso da água da chuva.
Ainda em relação ao IPTU, aplicar alíquotas diferentes de acordo com a localização e o uso do imóvel pode ser uma estratégia para estimular o desenvolvimento imobiliário e incentivar determinados tipos de ocupação em detrimento de outros.
Para estimular o retrofit – e com isso modernizar e dar novos usos a edifícios antigos ou abandonados –, prefeituras têm concedido isenção de IPTU, de ITBI e redução da alíquota de ISS para os serviços relativos à obra de requalificação. Afinal, “o edifício mais sustentável é aquele que já está construído” (Carl Elefante).
Também já há iniciativas em que créditos tributários, modelos de cashback ou transferências de recursos são utilizados para estimular ações de zeladoria e reciclagem.
Por fim, as contribuições de melhoria podem ser cobradas quando ocorre uma valorização de imóveis decorrente de obras públicas.
Nem sempre esses instrumentos são devidamente aplicados ou colaboram para o atingimento dos objetivos desejados. Ainda assim, isso não deve ser obstáculo para que pensemos em outros usos da política tributária para a promoção do desenvolvimento urbano.
Tenho destacado em meus artigos uma perceptível melhora na qualidade da produção imobiliária de São Paulo decorrente, em grande medida, dos incentivos a fachadas ativas, permeabilidade visual e fruição pública.
Contudo, não podemos ignorar o fato de que a maioria dos prédios da cidade são anteriores aos anos 2010, grande parte deles construídos a partir da década de 1970 e com características problemáticas em termos urbanos, como os muros altos aos quais já me referi.
Nesses casos, poderiam ser pensados incentivos tributários para que os muros dessem lugar a fachadas ativas, permeabilidade visual e áreas de fruição pública, o que geraria para a vizinhança externalidades positivas relacionadas à segurança e à valorização da paisagem urbana.
*Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Caos Planejado.