Enquanto arquitetura popular e urbanismo social forem considerados inovadores, o óbvio ainda precisará ser dito

28 de maio de 2023

Algumas pessoas não concordam com os nomes compostos dados para arquitetura e urbanismo: “Por que falar popular e social, se a profissão é para atender a todos?”, “Direcionar não segrega a profissão?”, “Não inventa moda, é arquitetura e urbanismo, e ponto.”

Primeiro de tudo, precisamos estar a par da realidade. As cidades não foram construídas de forma colaborativa em conjunto com o povo, muito embora saibamos que as demandas da elite nortearam e ainda norteiam muita coisa no que diz respeito à divisão das cidades, seja ela divisão espacial ou de recursos, vide especulação imobiliária. 

Sabemos também que, à medida que os lugares foram sendo planejados, as periferias cada vez mais longe e sem muita estrutura, ficaram historicamente às margens da profissão. 

Ainda, dentro da academia, graduandos vislumbram através das aulas, uma cidade ideal e projetos que elaboram sozinhos e afagam seu ego desde cedo e por no mínimo cinco anos. O que provavelmente na vida real nunca aconteceria, afinal de contas, quem faz um museu completamente sozinho?

Ou seja, a cada semestre formam-se arquitetos e urbanistas com uma visão de mundo completamente descolada da realidade.

Logo, aqui na vida real, ainda existe um abismo entre projetar para as pessoas e projetar com as pessoas, mesmo que haja a tentativa de uma construção popular dos planos diretores das cidades, por exemplo. 

Agora vamos aos conceitos: 

Arquitetura: construção concebida com a intenção de ordenar e organizar plasticamente o espaço, em função de uma determinada época, de um determinado meio, de uma determinada técnica e de um determinado programa. (Fonte: IAB)

Urbanismo: área do conhecimento que estuda as relações entre a sociedade e o espaço em que ela está inserida. Seu papel é planejar espaços urbanos para facilitar a vida das pessoas. (Fonte: PUC)

Arquitetura social: Criar espaços ajustados à realidade humana, que promovam a interação entre a vida e a forma e que estimulem relações saudáveis entre pessoas e cidades. A tendência arquitetônica tira dos projetos o foco em questões estéticas para desenvolver espaços responsáveis, comprometidos com a vida humana e que renovam a conexão com a realidade. (Fonte: CAU)

Urbanismo Social: capacitar, acolher e empoderar cidadãos que buscam transformar territórios vulneráveis, conectar a cidade informal e formal, criar pontes e articulações com a gestão pública e privada, ampliar a escuta ativa nos processos participativos, incentivar o morador a construir, participar, colaborar e principalmente a serem protagonistas dessas ações. (Fonte: Archdaily)

Os dois últimos conceitos (nem tão novos assim), visam a participação popular e horizontal na construção e melhorias das cidades e das moradias, onde as pessoas são peças centrais das discussões e decisões, sobretudo em territórios historicamente desassistidos.

Temos alguns casos muito bons de arquitetura e urbanismo sociais e pasme, que não são exclusivamente feitos só por arquitetos e urbanistas. Alguns exemplos importantes e bem sucedidos de fora do país são:

Alejandro Aravena, arquiteto e urbanista do Chile, autor reconhecido por vários projetos de Habitação de Interesse Social e questões urbanas e vencedor do prêmio Pritzker 2016.

Alejandro Echeverri, urbanista que, junto de Jorge Melguizo, na época Secretário de Desenvolvimento Social e de Cultura Cidadã, e do Gestor público Sergio Fajardo, transformaram a cidade de Medellín na Colômbia, destacando-a como bom exemplo no mundo inteiro.

No Brasil, posso destacar muitas iniciativas que trabalham com essa vertente, e não teria caracteres suficientes para citar todas, então te convido a conhecer a Articulação Colabora Habitação, a qual inclusive faço parte, e a Rede Brasileira de Urbanismo Social, dois grandes grupos com pessoas de todo Brasil, que estão jogando a lanterna para esses temas de forma integrada, colaborativa, interdisciplinar e incansável. 

Hoje esses conceitos são considerados inovadores pelo simples fato de irem na contramão de tudo que foi ensinado, mostrado e feito. Ainda é exceção à regra.

Quem sabe um dia, quando não precisarmos mais usar os nomes compostos da Arquitetura e Urbanismo, saberemos que todos estão tendo acesso a cidades mais justas, dignas, seguras e menos desiguais.

*Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Caos Planejado.

Compartilhar:

VER MAIS COLUNAS