Desafios na habitação popular em meio à tragédia das chuvas no Litoral Norte Paulista

18 de março de 2023

Passado um mês das chuvas que deixaram 65 mortos no litoral norte paulista, permanece a acentuada contraposição de anseios entre a proteção do meio-ambiente, os regramentos urbanísticos, a população de baixa e média-renda e a demanda de quem frequenta a região de veraneio.

O último grupo é frequentemente um dos maiores destinatários da pequena produção habitacional formal na região. Assim, a baixa oferta de residências atende o público de alta renda do interior e da capital do estado e, em relação à parte dos moradores da região, a ocupação de áreas de risco em moradias precárias é a alternativa encontrada, entre o que está disponível, para se ter uma casa. 

Para atenuar esse problema, a produção de habitação popular diretamente ou em parceria com o poder público é medida crucial para assegurar o direito à moradia da população de baixa renda, permanentemente desafiada a encontrar acomodações acessíveis em zonas urbanas.

Na última semana, a Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano (CDHU) começou a transferência das vítimas dos deslizamentos da Vila Sahy para 300 apartamentos do conjunto habitacional Caminho das Árvores, em Bertioga. 

O conjunto habitacional, viabilizado por meio do programa Minha Casa, Minha Vida — Entidades, teve as primeiras unidades entregues no início do mês de março e, por enquanto, não será ocupado por parte dos moradores de Bertioga a quem seria destinado. Inclusive, alguns que igualmente residem em áreas de risco e aguardam há anos o provimento habitacional definitivo.

Segundo a Secretaria de Desenvolvimento Urbano e Habitação, é uma medida temporária e de emergência, implementada enquanto trabalha para viabilizar a construção de moradias permanentes em São Sebastião.

A “medida temporária” não é mera retórica. O acordo firmado pela CDHU junto à entidade Frente Paulista de Habitação Popular do Estado de São Paulo prevê a cessão das unidades habitacionais às vítimas das chuvas pelo período de apenas oito meses, ou seja, findará no início do próximo período de chuvas.

Além disso, considerando que a maioria dos moradores desabrigados da Vila Sahy trabalha em bairros e praias próximos à antiga residência, ser realojado a cerca de 50 quilômetros, em um contexto preexistente de má qualidade da mobilidade urbana, demandará uma maior atenção regional ao transporte de trabalhadores. O tempo e gastos despendidos em excesso com deslocamentos podem resultar em novas ocupações irregulares.

Também nos últimos dias, o governador de São Paulo anunciou a construção de mais de 500 apartamentos no bairro da Baleia Verde, em São Sebastião, para atender famílias que perderam suas casas durante as fortes chuvas e deslizamentos. As unidades habitacionais serão construídas com tecnologia modular para acelerar o processo de construção e a previsão é que possam ser entregues em até 150 dias após o início das obras. O projeto ainda prevê a doação de eletrodomésticos pela iniciativa privada para as famílias que receberem as novas moradias.

Além disso, o governo de São Paulo publicou decretos para desapropriar três terrenos para a construção de moradias populares.Após a tragédia recente, a prefeitura de São Sebastião logo disponibilizou áreas para o mesmo fim, que espero ter desfecho oposto ao ocorrido em 2020, quando associações de moradores se mobilizaram em oposição à construção de conjuntos de moradia popular à população de áreas de risco. Com sucesso.

*Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Caos Planejado.

Compartilhar:

VER MAIS COLUNAS