Decifrando a LUOS: a estrutura do zoneamento urbano em São Paulo

15 de agosto de 2023

A regulação urbanística tem sido bastante discutida quanto ao seu conteúdo (maior ou menor adensamento, por exemplo), mas raramente se questiona a forma pela qual é estabelecida, que acaba sendo aceita como um dado de menor importância. O caráter hermético desse tipo de norma contribui para essa percepção. A forma, no entanto, é tão importante quanto o conteúdo, pois influencia o modo como a regulação é estabelecida, conhecida e aplicada. 

Encontra-se aberta a consulta pública do Município de São Paulo sobre a revisão parcial de sua Lei de Parcelamento, Uso e Ocupação do Solo (LUOS). Uma minuta de projeto de lei foi disponibilizada para a contribuição dos interessados. Nesse artigo, procuraremos apresentar um panorama desse complexo instrumento, mediante descrição de sua estrutura formal. 

A LUOS (também conhecida como Lei de Zoneamento) é parte do sistema de planejamento paulistano e sua atualização decorre da revisão do plano diretor, aprovada em julho de 2023. Nos municípios que separam zoneamento e plano diretor, a LUOS é o instrumento regulatório que estabelece os índices urbanísticos a serem observados na formação da cidade e no uso das edificações. Os índices e usos são diferenciados por zonas, que são porções do território delimitadas pela própria lei. 

A LUOS paulistana define 33 tipos de zona. Para cada tipo, são estabelecidos índices de ocupação e usos permitidos. Também são estabelecidas sete categorias de sistema viário e 13 tipos de perímetro de qualificação ambiental, para efeito de cálculo da quota ambiental.

O parcelamento é o processo pelo qual se converte solo rural em urbano e se define o desenho urbano. A LUOS estabelece os seguintes índices de parcelamento: 

• Áreas públicas — percentuais mínimos de destinação de terrenos para uso institucional, sistema viário, área verde e sem afetação, sistema viário, variáveis conforme a área da gleba;

Sistema viário — largura total, faixa carroçável, calçada, ciclovia, ciclofaixa, canteiro central, declividades máxima e mínima, fixados por tipo de via;

Lotes — frente e área mínima e máxima, definidos por tipo de zona.

A ocupação consiste na edificação que poderá ser construída no lote. A LUOS estabelece os seguintes índices de ocupação:

• Coeficientes de aproveitamento máximo, básico e mínimo;

• Taxas de ocupação e de permeabilidade;

• Gabarito;

• Recuos de frente, laterais e de fundo;

• Cota-parte máxima de terreno por unidade.

Uma novidade da LUOS paulistana é a quota ambiental, que permite reduzir o valor da outorga onerosa do direito de construir em função de uma pontuação dependente de vários fatores: características do lote, áreas ajardinadas, vegetação, cobertura verde, fachada e drenagem.

Além dos índices de ocupação por ela mesma definidos, a LUOS também incorpora os constantes de restrições convencionais, que são estabelecidas por loteadores. As restrições podem estabelecer dimensões do lote, recuos, taxa de ocupação, coeficiente de aproveitamento, altura e número de pavimentos. Em caso de contradição como os índices da lei, prevalecem os mais restritivos. 

O uso define as atividades que poderão ser realizadas no interior da edificação. Essa definição também tem um reflexo nas normas edilícias estabelecidas pelo Código de Obras e Edificações, que podem ser diferenciadas conforme o uso. 

A LUOS classifica os usos em três categorias, oito subcategorias e 86 grupos de atividades. A categoria residencial tem uma subcategoria e 10 grupos de atividade; a categoria não residencial tem quatro subcategorias e 46 grupos de atividade; e a categoria industrial, tem três subcategorias e 30 grupos de atividade. Para saber que atividades compõem cada grupo de atividade, um decreto regulamentador estabelece uma correspondência com a Tabela de Classificação Nacional de Atividades Econômicas (CNAE) do IBGE, que contém 21 seções, 87 divisões, 285 grupos, 673 classes e 1.301 subclasses. 

Para cada tipo de uso, são definidas “condições de instalação” por meio de índices relativos a vagas de garagem para automóveis, caminhões, utilitários, bicicletas, vestiário, área de embarque e desembarque e largura mínima de via.

A LUOS paulistana também estabelece parâmetros toleráveis para diferentes incômodos, conforme o tipo de zona: ruídos (diferenciados por horário), vibração, radiação eletromagnética, odores, gases, vapores e material particulado. 

Vale lembrar que o plano diretor, cujas normas devem ser observadas pela LUOS, estabelece duas macrozonas, duas zonas, oito macroáreas, uma área, 11 setores, cinco tipos de zona especial de interesse social (ZEIS), 14 índices de ocupação e três coeficientes de cálculo de contrapartidas e que, se a Região Metropolitana tivesse um plano de desenvolvimento urbano integrado (PDUI) em vigor, como exige o Estatuto da Metrópole, haveria também um macrozoneamento a ser observado. 

No caso de empreendimentos de grande porte, o estudo de impacto de vizinhança (EIV), de elaboração obrigatória, poderá estabelecer, ainda, medidas mitigadoras e compensatórias, além de adaptações do projeto às características urbanísticas, ambientais, culturais e socioeconômicas locais.

Para saber que regras se aplicam a determinado terreno, é preciso, nos mapas e quadro constantes dos anexos da LUOS, identificar a zona a que pertence e os índices e usos correspondentes. No portal GeoSampa, é possível obter uma visualização georreferenciada desses dados. 

Registre-se que cada tipo de zona, índice e uso é acompanhado de uma sigla e de uma definição. No caso das zonas, há também uma convenção cartográfica para sua representação.

Embora essa estrutura de zoneamento seja similar em todo o país, a falta de uma padronização nacional ou estadual leva cada município a adotar suas próprias siglas, conceitos e convenções cartográficas. Portanto, qualquer usuário interessado deve se familiarizar com essas particularidades ao consultar os planos diretores e LUOS de cada município.

Artigo de autoria de Victor Carvalho Pinto – Coordenador do Núcleo Cidade e Regulação do Laboratório Arq.Futuro de Cidades do Insper.

*Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Caos Planejado.

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