Cerveja, calçada e coragem: a nova cena de economia criativa em BH

12 de junho de 2025

Planejar vitalidade urbana é o sonho de qualquer prefeitura. Tem plano diretor, plano de bairro, plano de mobilidade, plano disso, plano daquilo. Mas em Belo Horizonte, quem fez a cidade vibrar foi… um copo de cerveja. E três empreendedores atentos.

Em conversa com Rafael Quick, um dos sócios do grupo Viela, ouvi a história do bar Juramento 202, aberto no coração da Pompeia. Era só um boteco novo? Não. Era uma marcenaria. Ou melhor, uma marcenaria disfarçada de bar — ou um bar que se fez marcenaria, com pesquisa, afeto e sem pastiches. Em poucas semanas, calçadas antes silenciosas se encheram de vida. Gente na rua, mesa na calçada, papo solto. E ali, sem decreto ou edital, nasceu um microcosmo urbano: o restaurante vizinho, antes só de almoço, passou a abrir todos os dias. Um quarteirão ressuscitado.

E como toda boa história de bar, essa também tem reviravolta. As compras do Juramento 202 eram feitas no Mercado Novo — aquele que por décadas carregou a fama de “mercado que não deu certo”. Mas ali, entre bancas vazias e poeira acumulada, Rafael e os sócios enxergaram o invisível: oportunidade.

Com pesquisa profunda sobre o passado do lugar, práticas de economia circular e valorização da autenticidade mineira, nasceu a Cervejaria Viela. E com ela, a fagulha que transformou um prédio decadente no ponto turístico mais descolado da cidade de Belo Horizonte.

Hoje, o Mercado Novo é um case espontâneo de regeneração urbana. Enquanto prefeituras seguem tropeçando em burocracias para criar vitalidade nas cidades, esse trio de empreendedores fez mais por uma região do que muitos planos plurianuais. Mostraram que a iniciativa privada — quando guiada por respeito ao contexto e desejo genuíno de criar lugar — pode ser motor de transformação urbana.

Do ponto de vista econômico, o impacto é gritante. Boxes antes vendidos a R$ 10 mil, hoje passam dos R$ 250 mil — e não é só especulação, é valor construído com contexto, desejo e vida pulsando. De um prédio quase esquecido, surgiu uma rede de empregos, experiências e pertencimento. A mais recente empreitada do grupo é o Forno da Saudade, localizado em um esquecido belo horizonte — digo, mirante — na cidade, e vem mais por aí.

BH descobriu que cerveja e urbanismo podem ter mais em comum do que parece. Um brinde à cidade feita de coragem, calçada e bons encontros.

*Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Caos Planejado.

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Arquiteta e urbanista, especialista em Gestão de Projetos e mestre em arquitetura pela UFRN. Atualmente é sócia da PSA Arquitetura em São Paulo e da PYPA Urbanismo & Desenvolvimento Urbano em Natal-RN. ([email protected])
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