As cidades têm pressa

5 de novembro de 2024

Passadas as eleições, nas quais, como é de praxe, o protagonismo foi para a escolha daqueles que comandarão o Poder Executivo municipal, uma realidade se impõe: as cidades têm pressa.

Não é difícil entender o porquê. Há pressa para solucionar as questões de segurança, de mobilidade, de mudanças climáticas, de saúde, de habitação, de uso de dados e de inclusão digital – para citar apenas alguns dos problemas que, em maior ou menor grau, no todo ou em parte, atingem os 5.570 municípios brasileiros.

Essa pressa é inimiga das diferentes colorações partidárias e das vaidades – para usar um termo ameno – que transformaram a campanha em muitas cidades em uma espécie de vale-tudo que passou longe da discussão de planos de governo. Apurados os votos, divulgados os resultados, a hora é de uma grande concertação para fazer o que importa: tornar as cidades do país mais desenvolvidas, justas, inclusivas e sustentáveis. Afinal, cerca de 85% da população brasileira vive nelas; os 100 maiores municípios do país contribuem com 52% do PIB nacional e, embora o nível crescente e alarmante de queimadas decorrentes do desmatamento tenha um enorme peso nas emissões de gases do efeito estufa, é sabido que o setor de transporte urbano também contribui consideravelmente para o aumento dos níveis de GEE – gerando um trânsito que, aliás, só no primeiro semestre de 2024 tirou a vida de 522 pessoas na capital paulista (no mesmo período de 2023 foram 398 mortes).

Embora haja diferenças abissais, sublinhe-se, entre os desafios a serem superados por uma metrópole em escala mundial como São Paulo e um município com até 20 mil habitantes (no Brasil, 70,6% da totalidade), é fundamental ter o entendimento de que as questões urbanas, em alguma medida, se entrelaçam no presente ou irão se entrelaçar no futuro.

O problema do aquecimento global exemplifica com perfeição o fato de que a repercussão de eventos climáticos extremos não respeita fronteiras geográficas. Mais do que isso: suas consequências alcançam desde a saúde até a habitação, reclamam providências imediatas na mobilidade e tornam urgente o incremento do uso de novas tecnologias para mitigar os seus danos.

Ao tempo da disputa, o horizonte é de vencedores e perdedores. Encerrada essa etapa, torna-se evidente de que manter o embate entre uns e outros agora concretamente definidos trará uma consequência incontornável: só haverá derrotados.

Essas reflexões, que não por acaso embasam o ciclo de webinários “Cidades em Perspectiva”, que o Centro de Estudos das Cidades – Laboratório Arq.Futuro do Insper promove ao longo do mês de novembro de 2024, desembocam em uma pergunta-chave: como imaginar vencer os desafios que se apresentam para o planeta, sob todos os aspectos, não apenas os climáticos, sem atentar para a transformação da vida nas urbes?

“Todas as sociedades tendem a um bem e, principalmente, ao bem supremo. O bem supremo, o que abrange todos os outros, é a chamada cidade, a sociedade política”, escreveu Aristóteles (384 a.C.-322 a.C.), monumento da filosofia grega. É imperioso que eleitos e reeleitos em 2024 tomem essa máxima como um mantra – afinal, o bem comum, ensina a lição aristotélica, está na essência da política. 

Mauricio Bouskela é coordenador do núcleo Economia Urbana, Cidades Inteligentes e Big Data do Centro de Estudos das Cidades – Laboratório Arq.Futuro do Insper

*Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Caos Planejado.

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