A oportunidade no caso do prédio da SMOV

13 de dezembro de 2023

No início do ano de 2022, a prefeitura de Porto Alegre enviou à Câmara Municipal um pedido de autorização para venda de mais de cem edificações do município, no intuito de enxugar os gastos públicos em imóveis subutilizados. Dentre eles, o prédio da Secretaria Municipal de Obras e Viação, cujo repasse da possível venda seria destinado para construção de conjuntos habitacionais para moradia social.

Entidades de arquitetura se manifestaram contrárias à venda com iminente “medo” de demolição do edifício dos anos 70 por não estar listado como bem patrimonial da cidade.  

Um ano e meio se passou e com a notícia que, sim, o prédio da SMOV seria leiloado, inclusive com datas estabelecidas, novas mobilizações de arquitetos e historiadores ocorreram até que a justiça determinou a paralisação da transação de venda. No momento atual, não há mais perspectiva de um novo leilão e será aguardado o estudo de possível tombamento da edificação.

O edifício da SMOV, construído em 1970 para ser o palco do planejamento urbanístico de Porto Alegre, foi projetado por um dos grandes nomes da arquitetura do Rio Grande do Sul: Moacyr Moojen Marques com os arquitetos João José Vallandro e Léo Ferreira da Silva. Sem dúvidas, um ícone da arquitetura moderna produzida no estado por sua composição formal de planta livre. Porém, para a população em geral, ele é emblemático para a capital?

Acredito que, fora os profissionais da área, 90% dos leigos não conhecem e, muito menos, sabem o valor do edifício. Infelizmente, para as pessoas, em geral, o edifício da SMOV é mais um dos prédios públicos sucateados da cidade. Dificilmente, a população leiga enxergará valor histórico além da arquitetura eclética do início do século XX.

Os arquitetos de Porto Alegre das décadas de 1970 e 80 podem ter boas lembranças do edifício da SMOV, porém, a geração atual e atuante na profissão o vê como símbolo do “atraso” devido às conturbadas aprovações de projeto que poderiam levar, no mínimo, um ano e meio de espera. 

O prédio nos últimos 20 anos, na verdade, era um local de encontro das lamentações de arquitetos para arquitetos por causa dos morosos processos que afetam o ritmo da construção civil na capital gaúcha. 

Provavelmente, se o leilão ocorresse e o edifício fosse vendido, seria demolido. Não imagino que seja somente pelo estado de deterioração que se encontra, a condição seria apenas mais um ingrediente para o colocar a baixo. Aliás, nos últimos anos virou um grande depósito de arquivos, agravando sua situação de conservação que já era ruim. Consideraria a possível demolição, aos velhos e conhecidos regramentos urbanísticos que tangem Porto Alegre. 

O edifício da SMOV está localizado em um lote, mais ou menos, de 75m de testada norte/sul por 65m de testada leste/oeste e ocupa, perto de, 40% do terreno. Por incrível que pareça, os 60% remanescentes para construir, com as regras atuais de 50m de limite de altura, recuos em torno de 13m e a taxa de ocupação, praticamente inviabilizam um novo empreendimento no local.

Portanto, o custo de revitalizar todo edifício da SMOV e ainda não conseguir alcançar os potenciais máximos de construção impossibilitariam o retorno financeiro esperado do desenvolvedor.

Agora, se os regramentos fossem flexíveis? Não precisando seguir regras rígidas de afastamentos laterais e nem limites de altura? Se o novo empreendimento pudesse ser moldado no terreno e compatibilizado com o prédio da SMOV, se esgotando todo índice de aproveitamento e sem as velhas regras?

Está aí uma oportunidade para a prefeitura colocar em prática toda sua intenção que vem sendo exposta nas conferências para o novo Plano Diretor: a implementação de edifícios por desempenho e não mais por cálculos matemáticos. Seria como um projeto piloto para esta nova visão. 

Penso que, com essa estratégia, se viabilizaria o negócio sem a necessidade de derrubar o ícone modernista. Um retrofit para o prédio da SMOV, com a adaptabilidade de novos usos, somado a compatibilidade, uma nova construção no local obedecendo às diretrizes ambientais e contextuais seria o caminho. O projetar por desempenho serve justamente para compatibilizar o novo com o antigo.

*Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Caos Planejado.

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