A estética da favela: como a arte transforma territórios e narrativas

31 de janeiro de 2025

A arte nas favelas vai muito além de meros grafismos em paredes. Ela é uma forma de resiliência, um grito silencioso que manifesta o desejo de pertencimento, de reconhecimento e de transformação. Em territórios historicamente negligenciados, a arte nasce como um instrumento de resistência e reinvenção. Cada mural, cada traço de grafite ou pintura de fachada colore o ambiente, carrega histórias, sentimentos e sonhos dos moradores que o habitam. Mais do que embelezar, a arte humaniza e constrói um diálogo visual entre as pessoas e o espaço que as cerca, criando um ambiente mais acolhedor e respeitoso.  

No Instituto Fazendinhando, as intervenções artísticas, além de serem um elemento decorativo, fazem parte de um esforço maior de valorização da identidade local. Priorizamos os artistas das próprias comunidades, principalmente os grafiteiros, reconhecendo e amplificando suas vozes, o que incentiva a economia criativa do território e cria uma conexão emocional entre os moradores e o espaço público. Quando uma obra de arte nasce das mãos de alguém que compartilha das mesmas vivências, ela se torna um espelho da coletividade, algo que a comunidade se orgulha em proteger e preservar.  

Um muro antes deteriorado, repleto de marcas do abandono, torna-se uma tela viva de possibilidades, um símbolo de que a mudança é possível. Esse processo cria um ciclo de cuidado e pertencimento. Os espaços que antes incomodavam, como becos, vielas e escadarias, ganham nova função com cenários de convivência e segurança, ressignificados pela força da expressão artística.

A arte, dentro do processo participativo, é também uma poderosa ferramenta de emancipação e diálogo, capaz de construir coletivamente espaços, significados e identidades. Paulo Freire enfatiza que a verdadeira transformação acontece quando os sujeitos se tornam protagonistas de suas próprias histórias, e a arte, nesse contexto, opera como um meio de expressão e conscientização. Quando a comunidade é incluída na criação artística, seja na escolha das cores, nos desenhos ou nas temáticas abordadas, abre-se um espaço de troca que valoriza o saber popular. Assim, o processo criativo deixa de ser algo imposto e passa a ser construído com aqueles que vivenciam o território, transformando a arte em uma prática libertadora, que conecta os moradores ao espaço e à sua capacidade de transformação coletiva.

*Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Caos Planejado.

Compartilhar:

Arquiteta e ativista urbana, pós graduada em urbanismo social e habitação e cidade, mestre em Projeto, Produção e Gestão do Espaço Urbano, Doutoranda em Arquitetura e Urbanismo, atua com a gestão de projetos e ações sociais em territórios periféricos no Instituto Fazendinhando.
VER MAIS COLUNAS