10 anos da Paulista Aberta: os benefícios de ruas abertas e a urgência como estratégia em um mundo quente

15 de agosto de 2025

2024 foi o ano mais quente registrado cientificamente em 175 anos, segundo dados da Organização Meteorológica Mundial, da ONU. Chegamos ao ponto em que são urgentes ações de mitigação climática, que reduzem ou evitam a emissão de gases de efeito estufa, ao mesmo tempo de ações de adaptação das cidades para os eventos extremos já em curso. 

É nesse contexto que as Ruas Abertas, símbolo da luta por ressignificar o espaço dedicado aos carros e recuperá-lo para as pessoas, passam a ser também uma estratégia essencial para sobreviver em cidades cada vez mais quentes, sujeitas a chuvas intensas e longos períodos de seca.

Sem a presença de carros, a qualidade do ar melhora significativamente. Um exemplo positivo diante desse cenário é a Paulista Aberta, que tem atuado como uma forte aliada no combate à crise climática há 10 anos. Uma pesquisa realizada pelo Laboratório de Poluição Atmosférica Experimental da FMUSP (LPAE-USP), em parceria com a ONG Cidade Ativa, analisou dados coletados em um domingo de via aberta ao lazer e em uma sexta-feira comum na avenida.

O estudo mostrou que, aos domingos, há uma redução na concentração de poluentes em todos os pontos de medição — embora os níveis ainda permaneçam acima dos limites recomendados pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e dos padrões definidos pela CETESB.

Além de contribuir para a melhoria da qualidade do ar, as Ruas Abertas podem reduzir as ilhas de calor. Isso porque o asfalto absorve o calor e pode aumentar a temperatura em até 12 °C em comparação com áreas verdes nas proximidades durante os períodos de maior insolação. Ainda assim, a qualidade dessas ruas poderia ser muito melhor com mais arborização e solos mais permeáveis, se tornando refúgios climáticos — espaços que oferecem abrigo, descanso e bem-estar durante eventos extremos, como ondas de calor.

No Brasil, já existem mais de 180 ruas abertas, que integram 12 programas distribuídos por 7 estados: Pará, Alagoas, Distrito Federal, Minas Gerais, Santa Catarina, São Paulo e Rio de Janeiro. Foi isso que o Mapeamento de Ruas Abertas, da Semana do Caminhar 2025, revelou. Entretanto, as Ruas Abertas ainda não são incluídas como estratégia nos Planos Climáticos, apesar de atenderem a muitos dos objetivos.

O Plano Nacional de Clima, atualmente em elaboração e com estratégias de mitigação em desenvolvimento, destaca a importância de reduzir os deslocamentos motorizados e incentivar a mobilidade a pé. As ações incluem ampliar a infraestrutura segura para quem se desloca a pé, implantar soluções verdes e baseadas na natureza, destinar recursos à mobilidade ativa e transporte coletivo, garantir o acesso a pé como direito fundamental e controlar a expansão urbana, priorizando a regeneração de áreas degradadas e a preservação da vegetação.

Ruas Abertas também promovem lazer e dinamizam a economia local 

Além do seu impacto para o meio ambiente, a Avenida Paulista é palco de uma vibrante cena cultural e artística. Em um único domingo, é possível encontrar apresentações de forró, música boliviana, sapateado, rock, dança, mágica e performances independentes de diferentes estilos, todas acessíveis e abertas ao público.

Há reflexos positivos também na economia local. Estudos conduzidos pelo Instituto Caminhabilidade e outras organizações revelam que 65% dos comércios da região têm até três anos de funcionamento, o que sugere que o ambiente criado pela Paulista Aberta contribuiu para o surgimento de novos empreendimentos. Aos domingos, esses estabelecimentos registram, em média, 20% de seu faturamento semanal. Em alguns casos, esse número chega a 50%, segundo dados do LABMOB.

Inicialmente, o programa chegou a abranger cerca de 29 ruas na cidade. No entanto, foi gradualmente descontinuado. Atualmente, apenas a Avenida Paulista e o bairro da Liberdade continuam com vias liberadas para o lazer aos domingos. É chegado o momento de retomada estratégica das ruas, combinada com ações de esverdeamento de avenidas. 

Essas mudanças impactam diretamente no direito da população ao uso da cidade como espaço de permanência, acolhimento e lazer. Foi justamente por meio de ações de pressão popular, lideradas pelo então SampaPé! (hoje Instituto Caminhabilidade), que a Paulista Aberta se tornou uma política pública permanente.

A comemoração dos 10 anos da Paulista Aberta, portanto, é também um chamado à retomada e à ampliação das políticas de ruas abertas em São Paulo e no Brasil. Garantir o uso democrático do espaço urbano é essencial para cidades mais caminháveis, diversas, acolhedoras e preparadas para um mundo quente!

*Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Caos Planejado.

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Organização liderada por mulheres, movida pela urgência de alcançar a equidade de gênero e enfrentar a crise climática, desenvolve cidades caminháveis com o protagonismo da cidadania. ([email protected])
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