Contra o EIV, pelo EIP

7 de abril de 2023

A legislação brasileira prevê o estudo de impacto ambiental (EIA) e o estudo de impacto de vizinhança (EIV). Eles são abraçados entusiasmadamente pelas elites urbanas como forma de oposição a construções que possam desvalorizar seu patrimônio. Legitimam seus interesses e ampliam suas vozes. Dão protagonismo no debate urbano para o corte de árvores ou aumento do congestionamento em bairros abastados.

São instrumentos que ajudam a pautar os interesses organizados dos mais ricos em detrimento dos interesses difusos dos mais pobres. O ônus da papelada e, por que não, do convencimento, recai sobre quem quer mudança, não sobre quem quer manter o status quo.

Veja que podem ser exigidos estudos de impacto de vizinhança (EIV) e de impacto ambiental (EIA) para quem quer construir, mas não estudo de impacto sobre os aluguéis e preços de imóveis na decisão de não-construir. Ainda no sentido de provocar, veja que a vizinhança imediata de um empreendimento pode ter seus interesses protegidos pela legislação, mas a periferia não. 

E se criássemos a exigência de um EIP — estudo de impacto sobre a periferia — a ser apresentado por associações de moradores ou pela burocracia que é contrária às construções em áreas centrais? É preciso inverter a lógica atual, que parece exigir demonstração de ausência de prejuízo para as elites quando há possibilidade de transformação, enquanto os que defendem o status quo não precisam justificar que mantê-lo é o melhor para a coletividade. 

O site já mostrou algumas vezes como “preservação do meio ambiente” é por vezes apenas um escudo para o interesse dos mais ricos, e não um pleito verde bem embasado e informado. Cidades densas são mais amigáveis à mudança climática, e nas últimas colunas vimos também que mais construções atenuam preço de imóveis e aluguéis e aproximam os mais pobres de vários tipos de oportunidades dos centros econômicos das metrópoles.

No trabalho de Ciro Biderman, pesquisador da Fundação Getúlio Vargas, foi identificado que a falta de uma regulação adequada no mercado imobiliário brasileiro contribui para o aumento dos preços no setor formal e para o crescimento da informalidade na ocupação de terrenos. De acordo com Biderman, essas regras restritivas são frequentemente criadas pela elite com o intuito de excluir os mais pobres da cidade e negar-lhes o acesso a instalações públicas.

Por sua vez, o modelo desenvolvido pelos pesquisadores Tiago Cavalcanti, Daniel Da Mata e Marcelo Santos evidencia os efeitos significativos das restrições à construção na formação de favelas. Esse resultado é consistente com outros estudos realizados em países em desenvolvimento, nos quais a rigidez no mercado formal de construção tem sido associada ao aumento das favelas e à redução da geração de renda (produtividade).

Peguemos o exemplo de Brasília, que teve recentemente uma região sua considerada a maior favela do Brasil. O “aglomerado subnormal”, chamado Sol Nascente, dificilmente será mencionado em um EIV ou EIA em uma próxima tentativa de adensar o centro do DF. Mas é lugares como lá que sofrerão o impacto das discussões interditadas por simpáticos defensores da natureza e carristas diversos.

Estamos falando da cidade em que moradores se mobilizam contra a construção de creche pública por ocupar a grama usada em um tai chi chuan de vizinhos, ou contra a construção de moradias porque diminui a área para passeio de cachorros que já habitam em terrenos de mansões. Por que damos tanta voz a vizinhos? Como dar mais voz a quem mais precisa na economia urbana?

*Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Caos Planejado.

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