Bicicletas sem estações fixas em São Paulo e o futuro do bike sharing no Brasil
Imagem: MasaneMiyaPA/Wikimedia.

Bicicletas sem estações fixas em São Paulo e o futuro do bike sharing no Brasil

A regulação dos sistemas de aluguel de bicicletas sem estações fixas na cidade de São Paulo abre as portas para a implementação do novo modal.

9 de janeiro de 2018

Seguindo uma tendência internacional, São Paulo aprovou legislação para receber sistemas de aluguel de bicicletas sem estações fixas, os dockless bike sharing. As bicicletas ficam espalhadas pela cidade, presas a postes e árvores, por exemplo, e são localizadas pelos usuários através de um aplicativo de smartphone que informa a localização da bicicleta mais próxima. Todas as bicicletas vêm com um localizador GPS e um bom cadeado. De resto, elas são exatamente iguais às demais bicicletas de bike sharing, e os valores e formas de uso também são semelhantes.

A grande vantagem desses sistemas é que eles permitem a concorrência e uma participação maior da iniciativa privada no mercado de bike sharing. Antes, em Paris, Londres, Rio de Janeiro e Nova York, só existia um sistema de bike sharing, geralmente uma parceira público-privada em que as estações eram estrategicamente implantadas em espaço público, ocupando tipicamente parte das calçadas ou vagas de estacionamento. O novo sistema, sem estações, muda completamente esse cenário: agora qualquer empresa pode espalhar uma frota de bicicletas e oferecer serviços à população.

Suas desvantagens podem ser divididas em questões relacionadas à dinâmica dos sistemas de compartilhamento, presente também nos sistemas de car sharing; questões relacionadas com o próprio sistema e como ele é visto em outros países; e questões relacionadas com a insegurança e a falta de infraestrutura cicloviária das cidades brasileiras.

O principal problema dos sistemas de bike sharing é a má distribuição das bicicletas. As estações esvaziam rápido de manhã na periferia e enchem rápido de manhã no centro, que fica sem lugar para colocar as bicicletas. À noite, acontece o contrário — elas esvaziam rápido no centro, acabando com as bicicletas para aqueles que saem atrasados. Nessas horas entra uma van para transportar e redistribuir as bicicletas (afinal quem diria, o automóvel salvando a bicicleta). No caso das bicicletas sem estação fixa, provavelmente ficaria inviável para uma van fazer este serviço, pois elas estariam mais espalhadas pela cidade. No entanto, algumas pseudo-estações devem surgir: grandes pólos geradores de viagem terão mais bicicletas nas proximidades. A partir desses pólos, as vans podem fazer a redistribuição.

Van que faz a redistribuição de bicicletas em Boston.
 

A China tem, atualmente, as maiores empresas deste ramo, a ponto já ter quase dobrado o número de usuários de sistemas de bike sharing no país. No entanto, algumas cidades estão sofrendo por excesso de bicicletas espalhadas de forma desordenada. Recentemente, a cidade de Hangzhou confiscou milhares dessas bicicletas. Esse problema é mais grave no centro e pode ser evitado com alguma regulação que discipline minimamente onde e como se deve deixar essas bicicletas para o próximo usuário.

Quanto à insegurança das cidades brasileiras, esse pode ser um problema. Se a empresa dona das bicicletas não as recolher no fim do dia e voltar a distribuí-las pela cidade no dia seguinte, as bicicletas estarão mais sujeitas a roubos e vandalismo, como no caso do sistema de aluguel do Rio de Janeiro. Como não acredito que nenhuma empresa vá fazer isso, essas bicicletas terão de ser muito robustas (já é assim hoje em dia), com bons cadeados e com o GPS muito bem guardado, de preferência dentro do quadro.

Atualmente, há poucos sistemas bike sharing  tradicionais no Brasil, muitos deles com pouca cobertura espacial. É o caso do Rio de Janeiro, onde o sistema deixa boa parte da cidade sem serviço. Outras cidades tentam implantar seus sistemas, mas sem muito sucesso.

Estação perto do MIT, em Boston: quase vazia às 7 da noite, lotada antes das 9 manhã.

Já outras cidades nem sequer consideram a ideia, pois a acham completamente inviável. A fraca infraestrutura cicloviária e comportamento agressivo dos motoristas é o principal motivo para tal, fazendo com que muitos gestores públicos acreditem que a cidade deles não é própria para bicicletas. Somado a isso, os sistemas tradicionais de bike sharing geralmente são projetados para não darem lucro, por isso recebem muitos patrocínios e são mantidos por grandes multinacionais.

Apesar de todas as desvantagens, se as cidades brasileiras seguirem o exemplo de São Paulo e legislarem a favor desses sistemas sem estações, a entrada deles pode finalmente colocar nosso país no mapa mundial do bike sharing e, também, convencer as pessoas a andarem mais de bicicleta em detrimento do carro particular.

O próximo passo será um sistema semelhante, mas P2P, onde um ciclista aluga sua bicicleta a outro, através de um aplicativo, no estilo AirBnB.

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  • Não é por nada, não, mas no meu mundo ideal todos os pontos de “bike sharing” da cidade se transformariam em bicicletários, ou paraciclos – principalmente na periferia. É vital ter lugares para PARAR a bike, mais do que ciclofaixas – e isso, mesmo nas regiões mais abastadas de S. Paulo, praticamente não existe.